CV 'toma' Acre do PCC, se firma líder do crime na região e recruta peruanos
O CV (Comando Vermelho) está no controle do crime organizado no Acre. Nos últimos anos, após perder espaço para o PCC na chamada rota caipira (que liga Paraguai e Sudeste brasileiro), a facção carioca concentrou forças na Amazônia para ter acesso à fronteira e hoje é predominante no estado de origem dos dois fugitivos que escaparam do presídio federal de Mossoró (RN).
O Acre é estratégico para o crime organizado porque faz fronteira com dois dos maiores produtores de cocaína do mundo: Peru e Bolívia. Estar perto do estado oferece vantagem logística para operar na outra rota da droga, a rota Solimões.
Com ataques contra territórios do PCC, o CV tomou áreas da facção paulistana nos últimos anos e controla —com força e violência— o crime no estado, expandindo agora seus negócios para países vizinhos, em especial, o Peru.
Facções chegaram ao Acre há 13 anos
As investigações apontam que as facções chegaram ao estado em 2011, visando expandir o mercado da droga. Primeiro, veio o PCC, depois, o CV. Eles fizeram um acordo de não se atacarem, até 2016.
O racha ocorreu após a morte, em junho de 2016, do traficante Jorge Rafaat Toumani, conhecido como rei do tráfico e que controlava a rota caipira. Ele foi assassinado no Paraguai, em uma emboscada do PCC e de criminosos paraguaios. Com isso, a facção paulistana passou a comandar a área e impôs a necessidade de negociação do CV, que não gostou.
CV precisava da Amazônia
Com a situação, o CV precisava dominar a Amazônia para ter acesso à fronteira, segundo Bernardo Albano, coordenador do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do MP-AC (Ministério Público do Acre).
O PCC obteve um certo monopólio da chamada rota caipira, que é a mais curta ligando o Paraguai aos centros consumidores do Sudeste. E o CV teve de investir, até por sobrevivência, para expandir para a região Norte.
Bernardo Albano
Só que, na época, PCC e CV dividiam o negócio do crime no estado, e a facção carioca partiu para cima da paulistana.
O resultado dessa guerra por território é que, entre 2015 e 2017, o Acre viu o número de crimes violentos letais dobrar, o que levou o estado à segunda colocação no ranking de taxa média entre os estados, com 63,9 homicídios para cada 100 mil habitantes.
No estado, o CV venceu —ao menos por ora. A "tomada" do Acre, por sinal, é comemorada pela facção e virou até tema de funk que está postado no YouTube: "vacilou, levou; o Acre é vermelho".
A música diz que a facção "expulsou os alemão", referência ao PCC, e cita os territórios que foram tomados ao longo dos anos.
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Quero receberA partir de 2016, o CV passou a investir maciçamente na região Norte, levando à consolidação da cadeia logística da rota Solimões. Hoje o CV predomina no estado. Ainda temos bolsões do PCC e da facção local Bonde dos 13, mas o CV é predominante.
Bernardo Albano
A maior parte da droga que chega ao Brasil pelo Acre tem como destino a região Nordeste. "Isso ajuda a abastecer áreas que são comandadas pelo CV nesses estados."
Cooptação de peruanos
Com o crescimento no Acre, o CV passou a mirar o Peru, hoje com forte atuação da facção. O grupo passou a usar mão de obra peruana para o cometimento de crimes nos dois países.
O Acre faz fronteiras com duas províncias: Madre de Dios e Ucayali. Temos verificado a ação dessa organização criminosa principalmente em Ucayali, com cooptação de peruanos. É bem visível.
Bernardo Albano
No caso da Bolívia, diz Albano, o movimento é menor, já que lá, o CV disputa espaço com o PCC, que tem predominância na região de fronteira do Brasil com Santa Cruz de la Sierra.
Autoridades do Acre e de Bolívia e Peru fizeram, em 2023, duas reuniões para cooperação internacional.
O delegado José Adonias, coordenador da Delegacia de Repressões às Ações Criminosas Organizadas, diz que a cooptação de peruanos e estrangeiros já é percebida pela polícia no Acre.
Isso é decorrente das extensas fronteiras terrestres e da complexidade em monitorar e controlar essas áreas. O Acre se tornou uma rota estratégica para o tráfico de drogas, que contribui significativamente para o aumento da violência e da criminalidade organizada na região.
José Adonias, delegado
Fugitivos perigosos
Depois do caso, o promotor explica que foi pedida a transferência de 14 presos, que operam em dois núcleos: gerencial, que detinha poder de mando; e executor de crimes. Nesse último, com a intensa participação de Deibson Cabral Nascimento e Rogério da Silva Mendonça, os fugitivos do presídio federal em Mossoró, nessa semana.
Esse grupo é formado por pessoas de alta periculosidade e com grau de liderança intermediário. Estavam ligadas à prática efetiva de crimes. Na rebelião, os dois tiveram ação diretamente para a tomada de reféns, o que serviu de pivô para toda a ação.
Bernardo Albano
No momento, diz, as autoridades do Acre acreditam que os fugitivos não conseguiriam voltar ao estado. "Monitoramos continuamente, mas acreditamos que, como foi montada uma força-tarefa para recaptura, eles serão presos novamente em breve."
Violência sobe e desce
Além de crime de tráfico, vieram crimes que orbitam o negócio: roubos, extorsão, execuções seja pela tomada de território ou disciplina.
Nos últimos anos, os índices de criminalidade caíram no Acre, resultado de ações de inteligência das autoridades.
Segundo o delegado José Adonias, o estado realizou, nos últimos anos, ações e operações policiais que impactaram o crime organizado e reduziram a prática de crimes.
Um dos casos principais é a Operação Reduto, que teve duas fases, realizadas em 2023 e este ano.
São ações que não apenas visam as lideranças dessas facções, mas também buscam desmantelar as redes de apoio que permitem a continuidade de suas atividades ilícitas, como o tráfico de drogas, armas e lavagem de dinheiro.
José Adonias
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