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Carolina Brígido

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Votação acirrada de Mendonça mostra desgaste entre Congresso e Planalto

Colunista do UOL

01/12/2021 19h17

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O placar acirrado da votação do nome de André Mendonça no plenário do Senado é um espelho da relação conturbada entre o Congresso Nacional e o Palácio do Planalto. O fato de ter sido aprovado por poucos votos não significa necessariamente que Mendonça sofra restrições por parte dos parlamentares, mas sim que a base de apoio do governo no Senado anda enfraquecida. Entre os atuais integrantes do STF, Mendonça foi quem teve o pior desempenho no plenário do Senado, com 47 votos a 32.

Isso foi demonstrado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), que referendou o nome de Mendonça por 18 votos a nove. Caso o candidato à cadeira no Supremo fosse derrotado, significaria muito mais um revés para o governo Bolsonaro do que para o Judiciário. Afinal, veio do presidente a indicação. E não há nada concreto que ameace a reputação ilibada ou o saber jurídico de Mendonça - que são, afinal, os critérios objetivos da Constituição Federal para alguém ser ministro do Supremo.

Na avaliação de um ministro do STF, se o Senado tivesse reprovado a indicação de Mendonça, seria aberto um precedente preocupante para a relação entre os Poderes - independentemente de quem chefia o Palácio do Planalto. Outro prejuízo seria para a carreira jurídica do próprio Mendonça, que entraria para a história como o único candidato ao Supremo barrado pelo Senado na atual democracia. Outros já foram reprovados, mas durante o governo de Floriano Peixoto.

Mendonça não inaugurou a dificuldade em ter o nome aprovado pelo Senado. Dos atuais integrantes do STF, quem teve o placar mais acirrado no plenário da Casa foi Edson Fachin, indicado pela presidente Dilma Rousseff. Em maio de 2015, o nome dele foi aprovado pelos senadores por 52 votos a 27. Na época, a presidente ja amargava uma relação conturbada com o Congresso.

Outro percalço de Dilma foi emplacar Rosa Weber no STF. A ministra foi aprovada pelo plenário do Senado por 57 votos a 14 em dezembro de 2011. Outro placar acirrado foi o da indicação de Alexandre de Moraes, escolhido por Michel Temer. Em fevereiro de 2017, a votação terminou em 55 votos a 13.

A era recente de votações difíceis para candidatos ao Supremo começou com Dias Toffoli. Indicado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a oposição emplacou o discurso de que o candidato era muito fiel ao mandatário e, uma vez ocupando uma cadeira no STF, defenderia com unhas e dentes as ideias do petista. Parênteses: a história provou justamente o contrário.

Outro impeditivo era o fato de Toffoli ser jovem (tinha 42 anos na época) e que não tinha currículo acadêmico suficiente. Nenhum dos dois fatos são impeditivos para alguém ocupar uma cadeira no STF. Em setembro de 2009, Toffoli foi aprovado pelo Senado por 58 votos a nove.

Antes de Toffoli, passaram com folga no Senado Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski, também escolhidos por Lula. Ela teve placar de 55 a um e ele, de 63 a quatro.

O ministro mais antigo da formação atual do STF, Gilmar Mendes, foi aprovado pelo Senado com um placar difícil: 57 a 15. A situação era parecida com a de Toffoli. Mendes era muito ligado ao então presidente Fernando Henrique Cardoso e a oposição temia que ele se tornasse porta-voz do governante no Supremo. Durante anos o ministro foi apontado como integrante da bancada de FH no Supremo.

Mendonça também caminha rumo ao Supremo com a pecha de proximidade extrema do presidente da República. Somado-se a isso está o fato de ser "terrivelmente evangélico". O tempo dirá se ele vai conseguir se desvincular dos dois rótulos e andar com as próprias pernas.