Ao agir como líder de gangue, Bolsonaro acusou o golpe
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A política surgiu na Grécia antiga tanto para organizar o funcionamento da sociedade quanto para evitar os confrontos sangrentos. Fazer política é negociar permanentemente, ceder, avançar, buscar acordos. É tarefa nobre, que mantém o equilíbrio das nações, algo bem diferente do fisiologismo que muitos associam a essa atividade.
O político que está no poder é sempre alvo, em especial da imprensa, que tem como uma das funções principais cavar todas as informações comprometedoras sobre os governantes. Só assim a sociedade estará segura de que aquele que detém o mandato realmente é o que diz ser.
Como em outros regimes democráticos, a imprensa cumpre esse papel no Brasil. Nem sempre acerta, como é normal em toda atividade humana. Mas desde o fim da ditadura militar o brasileiro é prova de que o jornalismo fustigou Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso (este com menos intensidade), Lula, Dilma Rousseff (estes dois com mais intensidade) e Michel Temer.
Todos os presidentes reclamaram da imprensa, o que é legítimo, mas sempre dentro da semântica da política, da polidez que o cargo exige.
Não haveria motivo para que os jornalistas agissem diferente e aliviassem Jair Bolsonaro. Ele é o político mais poderoso do país, o principal alvo da imprensa, portanto.
Acostumado ao ostracismo em sua trajetória sofrível de quase 30 anos como deputado, Bolsonaro vê agora a escabrosa sequência de rachadinhas que envolve sua família exposta em praça pública. Talvez imaginasse que tudo seria logo esquecido, mas a dedicação da imprensa faz com que, dia após dia, o escândalo cresça cada vez mais.
Fã da ditadura militar, cultuador de torturadores, o presidente tenta domar a si mesmo para não falar bobagens a cada contato com os jornalistas. Nas últimas semanas, inclusive, foi elogiado por ficar calado, permitindo que o índice de sandices presidenciais fosse bastante reduzido.
Neste domingo, porém, Bolsonaro voltou a ser Bolsonaro quando um jornalista perguntou sobre os depósitos do sr. e da sra. Queiroz na conta da primeira-dama. Como um líder de gangue, o presidente disse que tinha vontade de encher de porrada a boca do repórter que fez a pergunta.
Para usar metáfora do universo dos lutadores, pode-se dizer que o presidente acusou o golpe.
Se não estivesse muito preocupado com as investigações sobre o caso Queiroz, bastava Bolsonaro dar uma resposta qualquer e seguir em frente. A reação violenta, incompatível com um presidente da República, mostra que a pergunta do repórter de O Globo atingiu o fígado do presidente.
Bolsonaro é usuário contumaz de retórica violenta, seu comportamento é o contrário da boa política. Exibiu essa característica por mais de um ano, toda vez que parava para conversar com a imprensa no cercadinho do Alvorada. Hoje foi ao auge e comportou-se como líder de gangue.
A troca de sopapos não faz parte da prática jornalística. Não é necessário: a história recente do país mostra que boa apuração e textos precisos podem doer muito mais nos poderosos que golpes de mão.
Ao menos enquanto o Brasil ainda for identificado como uma democracia.
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