'Situação é surreal, inimaginável', diz estudante brasileiro em Kiev

Vivendo há três anos em Kiev, capital ucraniana, o estudante de Medicina brasileiro Rony de Moura foi dormir ontem dizendo aos parentes no Brasil que a situação no país estava tranquila e acordou com a Ucrânia sob ataque das forças russas. Além dos comentários de amigos sobre ataques na área militar de Kiev, o alarme soou na Praça da Liberdade.

"Eu não estava acreditando que isso estava acontecendo, porque estamos em pleno século 21 e resolver as coisas de maneira militar é um pouco arcaico, né?", comentou Rony à coluna.

Na entrevista, (que pode ser vista em vídeo aqui), ele conta como a cidade de Kiev amanheceu caótica, com farmácias lotadas, filas nas portas dos supermercados por medo de desabastecimento e o Metrô cheio de pessoas carregando malas em direção ao Oeste do país, fugindo para outros países europeus.

O próprio Rony se prepara para deixar a Ucrânia com outros brasileiros.

"É. Nós precisamos sair, infelizmente. Porque a situação aqui está inviável", lamenta o rapaz.

UOL - Como você soube do ataque russo?

Rony de Moura - Ontem mesmo, às onze da noite aqui, eu tinha feito uma entrevista na Band, já que o pessoal está procurando bastante informação de brasileiros e eu tento ajudar o máximo possível. Eu falei que a situação estava tranquila, com apenas um pouco de tensão. Aí eu acordei às 8h 30 com meu celular cheio de mensagens, gente querendo saber notícias e tudo mais. E assim eu acordei assustado.

Eu não estava acreditando que isso estava acontecendo, porque estamos em pleno século 21 e resolver as coisas de maneira militar é um pouco arcaico, né? Eu demorei quatro horas pra chegar aqui no trabalho, porque tentei pegar o ônibus, as rua estão um caos agora mesmo, as farmácias estão todas lotadas, infelizmente os bancos estão cheios de fila fora, os supermercados estão cheios de gente na porta pra poder entrar pra fazer abastecimento e eu demorei duas horas na parada de ônibus. Isso no frio que está fazendo, ainda estamos em pleno fevereiro. A situação está um pouco caótica. Na hora que eu entrei no metrô foi um pouco mais assustador, cheio de gente com malas. Eu não estava esperando. É um choque de realidade. Parece que é surreal isso.

Escutei relato de três pessoas de que na zona militares dentro de Kiev houve explosões. Inclusive o alarme da Praça da Liberdade soou hoje de manhã cedo. Essas informações sobre as explosões tenho ainda que procurar saber, não posso confirmar com exatidão.

As pessoas que estão saindo vão para outras cidades da Ucrânia ou estão indo para o aeroporto?

Não, os aeroportos está fechados. Eu vivo perto do aeroporto e não escutei nenhum avião hoje. Eles estão indo para o lado oeste, que é a Europa. O metrô o e as rodovias que ligam, essa parte aqui da cidade com o lado Oeste do país estão congestionados, está um caos, um caos.

Os brasileiros na Ucrânia estão recebendo orientação da embaixada?

Eu liguei agora cedo para a embaixada brasileira e eles falaram que eu deveria fazer o cadastro de brasileiros aqui. Até agora não houve um posicionamento. Se houve, eu não sei ainda porque eu estou ocupado tentando digerir toda essa informação ainda, esse caos que está acontecendo. Então não tive oportunidade de olhar algum posicionamento da embaixada.

A comunicação estava escassa, porém bem objetiva. A última informação que nós tivemos foi que poderíamos ficar tranquilos, que nada ia acontecer. A gente acreditou realmente, todo mundo estava acreditando. Infelizmente isso está acontecendo e parece surreal e inimaginável, sabe?

A justificativa de Putin para uma ação militar é de que pretendia desmilitarizar e "desnazificar" a Ucrânia. Você vê sinais de influência nazista no país?

Não, não vejo. De maneira alguma. Eu vivi na Rússia antes e lá era muito desenvolvido a cultura do nacionalismo. As pessoas lá acreditavam muito que a Rússia era o melhor país do mundo e eu sofri um pouco de xenofobia por parte de algum pessoal lá. Inclusive foi essa uma das razões pela qual eu saí da Rússia, falta de adaptação.

Aqui é um ambiente mais europeizado. Obviamente que eles têm muita característica russa porque as culturas são muito similares. Porém houve um pouco de influência da Europa e as pessoas aqui absorveram isso. Então temos aqui essa situação, que o povo aqui é meio que russo e meio europeizado.

Você está inserido no grupo grande brasileiros, tem contato com a comunidade de brasileiros?

Conheço poucos brasileiros porque minha rotina aqui é bastante puxada. Aí eu não tenho muito tempo pra lazer, eu saio pouco. Os poucos eu conheço no máximo são uns seis. Inclusive a gente está se comunicando , está planejando realmente ir embora mesmo.

Então já está decido a sair da Ucrânia?

É. Nós precisamos sair, infelizmente. Porque a situação aqui está inviável.