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Chico Alves

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Análise: Bolsonaro diz que vai vencer em 1º turno para tumultuar eleição

Presidente Jair Bolsonaro (PL) discursa a apoiadores em Londres, Inglaterra, onde será o funeral da rainha Elizabeth 2ª - Reproduão/Facebook Jair Bolsonaro
Presidente Jair Bolsonaro (PL) discursa a apoiadores em Londres, Inglaterra, onde será o funeral da rainha Elizabeth 2ª Imagem: Reproduão/Facebook Jair Bolsonaro

Colunista do UOL

19/09/2022 13h51

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Apesar de os principais institutos de pesquisa apontarem que a diferença do líder em intenção de votos para a Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, para o segundo colocado, Jair Bolsonaro, está aumentando, o discurso do presidente e seus apoiadores vai no sentido contrário. Os bolsonaristas têm repetido que sairão vitoriosos já na primeira rodada de votação. "Se nós não ganharmos no primeiro turno, algo de anormal aconteceu dentro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral)", disse ontem Bolsonaro, em entrevista ao SBT, em Londres. Para pesquisadores, essa falsa convicção é, na verdade, uma tática para tumultuar a eleição.

As pesquisas mais confiáveis mostram que é cada vez maior a possibilidade de Lula vencer no primeiro turno. Mas declarações do presidente e uma enxurrada de mensagens nas redes sociais, especialmente nos aplicativos de mensagens, tentam criar a ilusão de que acontece o contrário.

"Objetivo dessa narrativa é replicar a estratégia de Donald Trump", disse à coluna o historiador João Cezar de Castro Rocha, que pesquisa o comportamento dos bolsonaristas e acompanha grupos de WhatsApp dos seguidores do presidente. "Como se sabe, Trump tentou um golpe de Estado com a invasão do Capitólio"

Nos últimos meses, as milícias digitais bolsonaristas repetem a versão, sem base factual, de que Bolsonaro vencerá o pleito no primeiro turno. Em contraposição aos números apresentados pelos institutos de pesquisa, apresentam imagens do que chamam de 'datapovo', fotos e vídeos das concentrações de apoiadores do presidente que comparecem a seus comícios. Essa estratégia se intensificou depois do 7 de Setembro, quando Bolsonaro levou multidões em verde e amarelo a Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo.

Monitoramento do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD), ligado à Universidade Federal da Bahia, flagrou essa mobilização nas redes sociais. "Sobretudo após o 7 de Setembro, notamos que foi muito latente esse clima de 'já ganhou' nos grupos do bolsonarismo", diz Maria Paula Almada, pesquisadora do INCT.DD, que analisa dados do Facebook, Twitter e YouTube.

Na semana passada, das 61 mil menções a Jair Bolsonaro nessas plataformas, 17 mil traziam ameaças ao sistema eleitoral. "Nota-se a consolidação da narrativa de que a única possibilidade do atual presidente perder a eleição é por fraude nas urnas", diz o relatório do instituto. Em contrapartida, nos últimos dias a esquerda tem se mobilizado mais, a ponto de a hashtag #LulaNoPrimeiroTurno ter sido a segunda mais usada.

No entanto, a estratégia de desinformação de Bolsonaro continua em curso e João Cezar de Castro Rocha chama atenção para o fenômeno percebido pelo cientista político Christian Lynch, para quem o bolsonarismo está em declínio como fenômeno eleitoral, não tem nada a ver com 2018 e por isso precisa radicalizar no discurso para compensar a realidade que lhe é desfavorável.

"Com os bolsonaristas, as eleições brasileiras deixaram de ser um fenômeno apenas eleitoral, e passam a pertencer às páginas policiais, já que para tentar se reeleger o presidente comete vários crimes", avalia o professor, que organizou e está lançando o livro Tudo por um triz [Civilização ou Barbárie], pela Kotter Editorial. Trata-se de uma coletânea de textos de vários autores sobre a ameaça autoritária do bolsonarismo.

Para ele, a transgressão do presidente pode chegar a um nível ainda mais grave. "Bolsonaro quer provocar comoção em sua militância, ele quer que os bolsonaristas vão às ruas e provoquem o caos para justificar a decretação de um estado de emergência", alerta Rocha.