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Chico Alves

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Na ONU, Bolsonaro inaugura o horário eleitoral em escala planetária

20.set.22 - O presidente brasileiro Jair Bolsonaro discursa durante a 77ª Assembleia-Geral da ONU, em Nova York - Brendan McDermid/Reuters
20.set.22 - O presidente brasileiro Jair Bolsonaro discursa durante a 77ª Assembleia-Geral da ONU, em Nova York Imagem: Brendan McDermid/Reuters

Colunista do UOL

20/09/2022 12h05

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O presidente Jair Bolsonaro não pensa em outra coisa: seja no funeral da rainha Elizabeth 2ª ou na Assembleia Geral da ONU, seu único objetivo é fazer campanha pela reeleição. A família real britânica, os cidadãos do Reino Unido e os participantes do encontro nas Nações Unidas não estão nada interessados no fato de que Bolsonaro está 16 pontos percentuais atrás de seu principal opositor na corrida à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva. Mas o presidente não dá a mínima para isso.

O tema da Assembleia da ONU é "Um momento decisivo: soluções transformadoras para desafios interligados". O objetivo é tratar de "soluções conjuntas para as crises atuais, como a pandemia de covid-19, a guerra na Ucrânia, o impacto das mudanças climáticas e as crescentes ameaças à economia global".

Ou seja: Bolsonaro deveria dialogar com os problemas que hoje inquietam o mundo, apresentando propostas para questões graves. Em vez disso, preferiu fazer um grande balanço de seus quatro anos de governo, interessado apenas na audiência dos eleitores brasileiros.

O repertório foi o de sempre. Bravateou que seu governo fez o Brasil superar a corrupção sistêmica (obviamente não disse palavra sobre os ex-ministros Ricardo Salles e Milton Ribeiro, apeados de sua equipe sob acusação de tramoias, ou sobre rachadinhas e compras de imóveis em dinheiro vivo por parte de sua família). Desfiou assuntos desinteressantes aos políticos do mundo, como transposição do Rio São Francisco, uma pretensa "recuperação" da economia brasileira, alta na arrecadação fiscal, ideologia de gênero e outras platitudes.

Sobre meio ambiente, um dos assuntos que estão no escopo da Assembleia Geral, Bolsonaro repetiu dados que divulgou na ONU no ano passado, vangloriando-se de que dois terços do território nacional se mantêm cobertos de vegetação nativa. Omitiu informações trágicas nessa área, como a de que o desmatamento na Amazônia em agosto foi o maior em 15 anos.

O comentário sobre a guerra na Ucrânia também foi pouco esclarecedor ao defender cessar-fogo e ao mesmo tempo condenar sanções internacionais aplicadas à Rússia.

Assim como aconteceu no funeral de Elizabeth 2ª, não era o presidente que estava na tribuna da ONU, mas o candidato à reeleição.

Nesse papel, repetiu mentiras, como a de que tem dado especial atenção à violência contra a mulher (quando na verdade cortou 90% da verba destinada a um programa com esse fim), de que teve sucesso no combate na pandemia (enquanto na real o Brasil está entre os países com maior número de óbitos por covid-19) ou de que o país alcançou prosperidade econômica (enquanto 33 milhões de brasileiros passam fome).

É certo que na eleição do dia 2 o presidente brasileiro não terá nenhum voto dos representantes dos países que hoje estiveram nas Nações Unidas.

Mas, de olho no voto de seus compatriotas, Bolsonaro inaugurou hoje sem a menor cerimônia o horário eleitoral gratuito em escala planetária.