Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Pai do aerotrem, Fidelix trilhou caminho nas porções radicais da direita
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* Odilon Caldeira Neto
Falecido na noite de sexta-feira (23), Levy Fidelix foi presidente nacional do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB) e nacionalmente conhecido pela defesa do aerotrem durante as campanhas eleitorais que disputou. Mas, além de candidato potencialmente folclórico e monotemático, Fidelix trilhou caminho na mais recente onda do conservadorismo brasileiro, especialmente nas porções mais radicais da direita.
Por isso, para além de suas características "folclóricas", é importante considerar a contribuição de Fidelix no processo que desenhou o bolsonarismo e a eleição do atual presidente.
Em 2014, quando Dilma Rousseff foi reeleita à Presidência, houve uma forte campanha baseada em discursos conservadores e, não raramente, misóginos. Esta gestão do bolsonarismo, que teve início a partir do primeiro mandato de Dilma (como indica pesquisa da professora Isabela Kalil, bem como de outros colegas), foi notada como um espaço de capitalização política.
Levy Fidelix, que além da defesa do aerotrem, transitava costumeiramente entre os mais diversos espaços políticos, aproveitou esta oportunidade. Fidelix, que em 2010 havia apoiado a eleição de Dilma, partiu para o campo oposto, assumindo o papel de disseminador dos discursos da direita radical.
Essa transformação foi intensa. Em 2014, Levy Fidelix divulgava periódicos vinculados a Olavo de Carvalho e empenhou uma campanha centrada em valores lgbtfóbicos. Foi destaque nos noticiários nacionais e internacionais quando, durante debate entre os presidenciáveis, afirmou que "órgão excretor não reproduz".
A trajetória de Fidelix precisa ser entendida a partir desse movimento, que visava a capitalização política em torno do fenômeno das novas direitas. Um candidato desguarnecido de orientação política mais definida, mas que passou a empenhar esforços para a naturalização dos discursos mais radicais das direitas.
Em 2018, esse movimento ficou mais intenso. A campanha de Fidelix para o Congresso Nacional utilizava o lema integralista ("Deus, Pátria e Família") e o próprio Fidelix se reuniu com lideranças do neointegralismo. Além da campanha com inspiração integralista, o PRTB garantiu espaço na eleição de Bolsonaro, com a eleição de seu vice, general Mourão.
Nos últimos anos, o ex-candidato à Presidência estreitou laços com outros grupos minoritários da ultradireita brasileira, como a Liga Mundial Cristã. Isso demonstra o desenvolvimento das relações de Fidelix no campo da direita radical, mas também a busca por garantir um espaço cativo ao PRTB nas novas direitas. Pois, se a eleição de Bolsonaro construiu a efetividade de um projeto político diverso e difuso (o bolsonarismo), o atual presidente poderia ser um hipotético adversário de Fidelix.
Durante anos, a ultradireita brasileira foi tratada como um objeto pitoresco da cena política. Seus mais proeminentes personagens, de Enéas Carneiro a Levy Fidelix, passando por Jair Bolsonaro, eram descritos como figuras caricaturais e distantes dos centros de decisão da arena política. Os últimos anos demonstram que essa percepção foi bastante equivocada. Por isso, além do aerotrem, é necessário olhar Fidelix como uma figura que auxiliou na nova onda das direitas.
* Odilon Caldeira Neto é professor de História Contemporânea da Universidade Federal de Juiz de Fora e coordenador do Observatório da Extrema Direita. É autor de "O fascismo em camisas verdes: do integralismo ao neointegralismo" (2020, Editora FGV) com Leandro Pereira Gonçalves
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