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Entendendo Bolsonaro

OPINIÃO

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Atos pela democracia são a maior manifestação apartidária desde as Diretas

Largo de São Francisco será palco da divulgação oficial da Carta aos Brasileiros em Defesa da Democracia - GETTY IMAGES
Largo de São Francisco será palco da divulgação oficial da Carta aos Brasileiros em Defesa da Democracia Imagem: GETTY IMAGES

Colunista do UOL

11/08/2022 07h59

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* Cesar Calejon

Desde que ascendeu ao poder, o bolsonarismo vem flertando com a possibilidade de um golpe contra a democracia brasileira. Cientes de que a sua ausência de projeto para o país não seria sustentável sequer no médio prazo, os ideólogos bolsonaristas, incluindo o próprio presidente da República, verbalizaram intenções golpistas inúmeras vezes ao longo dos últimos anos.

Nesse sentido, a Carta às brasileiras e aos brasileiros pelo Estado Democrático de Direito, que foi idealizada pela Faculdade de Direito da USP, e o documento organizado pela Fiesp caracterizam, até a presente data, a maior mobilização social e apartidária já registrada contra o golpismo bolsonarista.

Para entender na prática o que os manifestos desta quinta (11) significam e a extensão dos seus respectivos escopos no tecido social brasileiro, basta ressaltar que ambos foram capazes de unir entidades altamente antagônicas, como a própria Fiesp, que historicamente representou os interesses do grande capital transnacional atuante no Brasil, e a CUT, que, a despeito das suas eventuais contradições, sempre defendeu o interesse das classes trabalhadores, sobretudo, das parcelas mais empobrecidas e vulneráveis do proletariado nacional.

Torna-se evidente a constatação que, exceto pelos bolsonaristas, a estabilidade democrática brasileira, considerando o bom funcionamento das instituições republicanas, o sistema eleitoral com as urnas eletrônicas e todas as garantias das liberdades individuais que compõem o Estado de Direito da República Federativa do Brasil, interessa a todas e todos os brasileiros.

Em três semanas, a carta da USP já chega próximo às 900 mil assinaturas e conta com o endosso de oito presidenciáveis: Lula, Ciro Gomes, Sofia Manzano, Felipe D'Ávila, Simone Tebet, Eymael, Leonardo Péricles e Soraya Thronicke.

Jair Bolsonaro sentiu a profundidade dos atos no momento decisivo do período eleitoral e passou um recibo gigantesco, atacando os manifestos em defesa da democracia e lançando a sua própria iniciativa via Twitter, com apenas algumas palavras, as quais foram apresentadas entre aspas, apesar de terem sido proferidas, teoricamente, por ele mesmo.

Do outro lado, o documento da Fiesp reuniu entidades como a Febraban, a Fecomercio e oito entidades ligadas ao agronegócio. Ou seja, até o grande capital, que tem apoiado e se beneficiado do bolsonarismo irrestritamente, abandonou o barco, tendo em vista as últimas investidas golpistas, em especial a reunião de Bolsonaro com embaixadores.

Ao que tudo indica, Bolsonaro deverá agravar ainda mais a própria situação com o ato marcado para o dia 7 de Setembro, quando o bolsonarismo apelará para a narrativa de que a liberdade, em alguns casos, vale mais do que a vida. O que o atual presidente não pretende explicar para o seu secto de lunáticos é que, no caso, ele se refere a sua própria liberdade em detrimento da vida dos seus seguidores.

Nesse sentido, ao estabelecer a comparação fácil e óbvia do bolsonarismo com o regime militar brasileiro, também fica claro que os atos desta quinta podem ser comparados ao início do que foram as Diretas Já: uma robusta demonstração de soberania popular, incluindo diversos partidos e classes muitas vezes antagônicas, para pôr fim ao golpismo bolsonarista.

* Cesar Calejon é jornalista, com especialização em Relações Internacionais pela FGV e mestrando em Mudança Social e Participação Política pela USP (EACH). É escritor, autor dos livros A Ascensão do Bolsonarismo no Brasil do Século XXI (Kotter), Tempestade Perfeita: o bolsonarismo e a sindemia covid-19 no Brasil (Contracorrente) e Sobre Perdas e Danos: negacionismo, lawfare e neofascismo no Brasil (Kotter).