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Entendendo Bolsonaro

OPINIÃO

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Ato fúnebre é o evento ideal para a campanha de Bolsonaro

Presidente Jair Bolsonaro assina livro de condolências em Londres pela morte da rainha Elizabeth - Jonathan Hordle/Pool via Reuters
Presidente Jair Bolsonaro assina livro de condolências em Londres pela morte da rainha Elizabeth Imagem: Jonathan Hordle/Pool via Reuters

Colunista do UOL

18/09/2022 13h17

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* Cesar Calejon

Desde que assumiu a Presidência da República, Jair Bolsonaro e a sua administração conduziram um processo sem precedente de morte e destruição no Brasil em todas as searas da vida nacional, conforme demonstram indexadores sólidos de todas as ordens.

Após mais de três anos e meio no poder e a exatamente duas semanas para a votação do primeiro turno das eleições presidenciais, Bolsonaro é o primeiro mandatário desde a redemocratização que chega em severa desvantagem considerando a disputa pela sua reeleição, segundo a última sondagem do Datafolha.

Neste contexto, a viagem que o presidente realiza neste domingo à Inglaterra vai absolutamente ao encontro do que foi a sua gestão entre 2019 e 2022: o ato fúnebre do qual ele participa e que sela o enterro da rainha Elizabeth II é o evento ideal para a campanha de Bolsonaro.

Não por acaso, a primeira viagem de Bolsonaro a Londres como presidente da República não será para negociar acordos ou defender os interesses do Brasil, mas para assinar o livro de condolências da rainha britânica — condolências que Bolsonaro jamais foi capaz de demonstrar com nenhuma das mais de 685 mil vítimas brasileiras da covid-19 até a presente data.

Muito pelo contrário: com os seus próprios conterrâneos, o presidente brasileiro fez galhofa, imitou pessoas sufocadas sem ar, disse que não era "coveiro", que o Brasil deveria deixar de ser um "país de maricas", associou a vacina contra a covid-19 ao vírus da Aids e verbalizou outros absurdos que fariam inveja ao mais delirante dos líderes internacionais.

Evidentemente, o presidente brasileiro, por uma questão de identificação pessoal, solidarizou-se muito mais com o falecimento de uma figura autoritária, estrangeira e que avançou dimensões colonialistas durante o seu tempo de vida do que com o sofrimento e a morte de centenas de milhares de brasileiras e brasileiros, porque, ainda segundo o próprio Bolsonaro, o nosso povo estaria "acostumado com o esgoto".

Após regressar da sua viagem internacional, contudo, Bolsonaro tentará as suas últimas investidas no sentido de convencer este mesmo povo que ele vem massacrando por anos a lhe dar a opção de continuar no poder por mais um mandato presidencial. Por fim, restará saber se a população brasileira aceitará as afrontas bolsonaristas de forma passiva ou se o país demonstrará que é o próprio bolsonarismo que deve retornar ao esgoto do qual jamais deveria ter sequer saído.

* Cesar Calejon é jornalista, com especialização em Relações Internacionais pela FGV e mestrando em Mudança Social e Participação Política pela USP (EACH). É escritor, autor dos livros A Ascensão do Bolsonarismo no Brasil do Século XXI (Kotter), Tempestade Perfeita: o bolsonarismo e a sindemia covid-19 no Brasil (Contracorrente) e Sobre Perdas e Danos: negacionismo, lawfare e neofascismo no Brasil (Kotter).