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Crise Climática

OPINIÃO

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Intensidade das chuvas em Petrópolis causa perplexidade entre cientistas

Destroços em meio a lama de enxurrada provocada pela fortes chuvas em Petrópolis - Lucas Landau/UOL
Destroços em meio a lama de enxurrada provocada pela fortes chuvas em Petrópolis Imagem: Lucas Landau/UOL

Colaboração para o UOL, em São Paulo

17/02/2022 11h00

Esta é parte da versão online da edição desta quinta-feira (17/02) da newsletter Crise Climática, que discute questões envolvendo a emergência climática, como elas já afetam o mundo e quais são as previsões e soluções para o futuro. Para assinar o boletim e ter acesso ao conteúdo completo, clique aqui.

Os números da chuva extrema que caiu sobre Petrópolis (RJ) na terça-feira (15) estão sendo atualizados. Ao menos 94 pessoas morreram, segundo boletim da Defesa Civil divulgado na noite desta quarta (16). Há dezenas de desaparecidos e desabrigados.

O pico de intensidade média de chuva - que passou dos 99 mm por hora em alguns pontos de medição - pode ter sido recorde, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Foram 240 mm de chuva em 3 horas, entre 16h20 e 19h20, informa o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), volume que supera a média de chuvas para o mês de fevereiro inteiro. A previsão é de mais chuva na região para as próximas horas.

"O que nós testemunhamos em Petrópolis foi um evento absolutamente excepcional", afirma a cientista Regina Alvalá, coordenadora de Relações Institucionais do Cemaden e diretora substituta.

"Para se ter uma ideia, a ciência meteorológica dos dias de hoje não é capaz de prever essa quantidade de chuvas em um espaço tão curto de tempo e em uma região tão delimitada", afirma a pesquisadora, citando as precipitações extremas no verão de 2021 na Europa e no Japão e que também não foram previstas pelos órgãos de alerta.

Petrópolis é uma cidade histórica e turística da Região Serrana do Rio de Janeiro, uma zona extremamente suscetível a chuvas intensas. Uma delas ocorreu em 2011, matou mais de 900 pessoas em toda a Região Serrana e foi classificado pela ONU como um dos dez piores deslizamentos do mundo em 111 anos.

Foi por causa desta tragédia que o Cemaden foi criado. Naquela ocasião, o pico máximo de intensidade de chuvas foi de 90 mm por hora. O evento desta terça se originou de uma massa de ar frio que estava sobre o Oceano Atlântico, como em 2011, mas desta vez a distribuição da chuva ficou concentrada apenas em Petrópolis, que tem a maior densidade populacional da região.

Um estudo do Cemaden em parceria com o IBGE indica, com base nos dados de 2010, que há mais de 500 áreas de risco no município. Cerca de 24% dos quase 300 mil habitantes vivem nelas. São aglomerados residenciais - favelas - sem sistemas adequados de drenagem, abastecimento de água ou coleta de esgoto.

Uma boa parte dessas casas estão nas encostas ou em regiões alagáveis. Embora as chuvas do dia 15 tenham atingido o município todo, incluindo a região central, as áreas com menos infraestrutura têm mais mortalidade. Manter uma quantidade de pessoas em habitações precárias em uma região tão suscetível é naturalizar a morte potencial de dezenas de milhares de pessoas.

Vale a pena conferir as previsões do relatório de 2021 do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) em um aquecimento global de 2C (muito acima do atual, 1,2C) e comparar com o que já estamos observando.

Você conhece?

alemanha, chuvas - REUTERS/Rhein-Erft-Kreis  - REUTERS/Rhein-Erft-Kreis
Vista área da cidade alemã Erftstadt-Blessem; Estudo de atribuição relaciona chuvas extremas na Alemanha em 2021 com mudanças climáticas
Imagem: REUTERS/Rhein-Erft-Kreis

Há estudos que podem determinar com precisão o quanto um evento extremo foi causado pelas mudanças climáticas - os chamados estudos de atribuição. O primeiro deles foi feito em 2004, e desde então há um esforço científico para desenvolver este tipo de pesquisa em nível global, sobretudo depois da criação da rede World Weather Attribution (WWA). A maior parte das pesquisas, contudo, ainda está concentrada no Hemisfério Norte.

E o que mais você precisa saber

coala, bebê - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Coala com bebê nas costas
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Coalas em risco de extinção

Em menos de uma década, os coalas passaram da categoria de "não listados", para "vulneráveis" e agora para "em perigo de extinção". O novo status foi conferido na semana passada pelo governo da Austrália devido a destruição acelerada de seus habitat. A Austrália perdeu cerca de 30% de seus coalas nos últimos três anos, devido a uma seca prolongada e incêndios florestais seguidos, condições foram agravadas pelo desmatamento e pelas mudanças climáticas globais.

Bolsa-desmatamento

Um decreto do presidente Jair Bolsonaro criou uma política de incentivo ao garimpo - o Pró-Mape - especialmente voltado à região amazônica. A medida tenta renomear como "mineração artesanal" uma das atividades mais implicadas no aumento do desmatamento da Amazônia, além de tráfico de ouro, lavagem de dinheiro, poluição em larga escala por mercúrio e violências contra Povos Indígenas. Resta saber se aqueles que compram o ouro ilegal e emprestam dinheiro para que pessoas pobres adquiram equipamentos de mineração serão rebatizados de "milicianos artesanais" também.

Promessa vazia

As investidas cada vez menos discretas do governo e do Congresso brasileiros para legalizar crimes ambientais estão ganhando visibilidade. O senador dos Estados Unidos Ed Markey, (Democratas, Massachusetts), postou uma bronca ao governo brasileiro no Twitter nesta quarta-feira (16). Ele disse que a tentativa de legalizar a grilagem de terras deve acelerar a tendência de desmatamento na Amazônia, exatamente o contrário do que o Brasil se comprometeu a fazer na COP26, há três meses.

Conta de luz subirá mais

As chuvas que caem desde dezembro encheram os reservatórios da maior parte das hidrelétricas do país, informou o Operador Nacional do Sistema (ONS). Mas elas estão jogando energia limpa e barata fora porque a rede está cheia de energia termelétrica cara e contratada com antecedência. As distribuidoras seguem endividadas, apesar de terem recebido uma ajuda gorda do Tesouro Nacional. Para assegurar que a conta continue alta, o presidente Jair Bolsonaro também sancionou uma lei garantindo subsídios à queima de carvão até 2041. E há o projeto de Angra 3, que terá uma energia bem mais cara do que as renováveis, mas que os militares adoram. André Borges, no Estadão, fez um bom resumo do que está acontecendo no setor elétrico brasileiro.

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As praias cearenses continuam registrando manchas e óleo, e agora a Bahia também detecta contaminação em seu litoral. Diferentemente do que ocorreu em 2019, óleo encontrado agora é compatível com material explorado na costa brasileira.

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