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Fernanda Magnotta

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

"Crise de OVNIs" reforça necessidade de rever sistema de governança do céu

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, em entrevista coletiva nesta quinta-feira - Reprodução/Twitter/@WhiteHouse
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, em entrevista coletiva nesta quinta-feira Imagem: Reprodução/Twitter/@WhiteHouse

Colunista do UOL

18/02/2023 09h08

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As especulações envolvendo OVNIs - objetos voadores não identificados - tomou conta da imprensa internacional nas últimas semanas, depois que vários países, principalmente os Estados Unidos, divulgaram informações de que artefatos misteriosos teriam sido vistos sobrevoando seu espaço aéreo. A polêmica ocorreu logo depois do governo norte-americano ter abatido um balão chinês, sob suspeita de espionagem, o que levou a um agravamento na tensão entre Washington e Pequim, conforme já falamos anteriormente nessa coluna.

Apesar de ter capturado a atenção da comunidade internacional, é importante ter claro que, nos Estados Unidos, o registro de OVNIs é muito mais comum do que se imagina. Somente nos últimos anos, centenas de avistamentos foram investigados pelo Programa Avançado de Identificação de Ameaças Aeroespaciais (AATIP), do governo norte-americano. A maior parte deles, aeronaves convencionais ou objetos de empresas privadas que invadiram o espaço aéreo por algum tipo de falha técnica.

Para além da discussão sobre "invasão extraterrestre" que inundou as redes, o episódio deveria nos guiar para outra conversa, afinal revela uma fragilidade sobre a qual a diplomacia dos países precisa voltar a falar a respeito: os mecanismos de governança do espaço aéreo e do céu.

Apesar de existirem diversos acordos e convenções internacionais, organizações e agências especializadas, além de protocolos e normas de segurança que foram pactuadas ao longo das últimas décadas e que conferem condições de coordenação internacional sobre o tema, como a Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO) e o Acordo de Chicago, por exemplo, é preciso atualizar os mecanismos existentes que versem sobre voos de observação sobre territórios uns dos outros.

Esse tema costumava ser objeto central do Tratado dos Céus Abertos, assinado em 1992, e que entrou em vigor em 2002. Com mais de 30 países membros, incluindo os Estados Unidos, a Rússia e vários países europeus, ele foi o principal responsável, no contexto do imediato pós Guerra Fria, pela construção de confiança entre esses países no que tange a sobrevoos mútuos.

Esse instrumento foi, por anos, fundamental para promover a transparência entre antigos competidores e para ajudar a fortalecer o diálogo entre seus membros. Voos de observação previamente acordados, e nos termos mutuamente aceitos, contribuem para reduzir a assimetria de informações, evitar a desconfiança e a sensação de insegurança entre países. Tudo isso contribui para prevenir conflitos e assegurar a estabilidade, sobretudo entre governos cuja relação já envolve arestas e pontos de sensibilidade.

O problema do Tratado de Céus Abertos é que, desde 2020, por decisão do então presidente Donald Trump, os Estados Unidos foram retirados dele. Na época, Trump acusou a Rússia de violar o acordo e impor restrições sobre determinadas áreas de seu território. Com isso, o pacto ficou altamente fragilizado. Além disso, a China não é signatária do tratado, o que também afeta sua relevância e eficácia no século XXI.

A mensagem é clara: não há como promover a paz e a segurança global, hoje, sem trazermos para a mesa as principais potências e trabalhar para reduzir as percepções mútuas de ameaça. Por ora, precisamos falar sobre os céus.