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Fernanda Magnotta

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

'Escalar para desescalar' na Ucrânia traz mais perigos do que certezas

Membros do grupo de mercenários Wagner em Bakhmut, em meio à guerra entre Rússia e Ucrânia - Handout/AFP
Membros do grupo de mercenários Wagner em Bakhmut, em meio à guerra entre Rússia e Ucrânia Imagem: Handout/AFP

Colunista do UOL

11/06/2023 06h45

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Não faltam voluntários para negociar a paz no leste europeu. China, Turquia, Brasil, uma missão africana e até mesmo o papa já apareceram como potenciais mediadores do conflito entre Rússia e Ucrânia.

Ao mesmo tempo em que se multiplicam propostas de negociação mundo afora, temos acompanhado, entre os principais players da guerra, contínuas investidas em vez de distensão.

No capítulo mais recente, o presidente Vladimir Putin afirmou que a Ucrânia iniciou uma contraofensiva contra forças russas e, em resposta, disse que o Kremlin teria ordenado a instalação de armas nucleares táticas em Belarus. Como já alertamos desde o princípio, se utilizadas, esses tipos de armas poderiam demarcar um agravamento significativo do conflito.

Mesmo diante desse movimento, entre os que racionalizam o processo decisório, ainda prevalece forte a tese de que um aumento de tensão não necessariamente significa um distanciamento das saídas diplomáticas para esse caso. Para muitos, estaríamos diante do clássico "escalar para desescalar", uma estratégia militar que envolve um aumento temporário da intensidade ou das ações em campo com o objetivo de forçar uma negociação ou uma resolução pacífica do confronto.

Na prática, "escalar para desescalar" implica aumentar o nível de hostilidades, na esperança de que a elevação da pressão e do custo do enfrentamento façam com que as partes envolvidas percebam a necessidade de encontrar uma saída diplomática a fim de evitar danos maiores.

Se, por um lado, isso parece fazer sentido tanto do ponto de vista do "teatro de operações" quanto do ponto de vista analítico, é importante ter claro que "escalar para desescalar" não é uma estratégia livre de riscos. Ao contrário: aumentar a intensidade do conflito pode levar a uma espiral de violência e ao agravamento da situação, tornando ainda mais difícil alcançar, para ele, uma solução razoável.

Essa abordagem requer não apenas muita habilidade diplomática, como depende também de comunicação azeitada e de um equilíbrio delicado para evitar uma escalada descontrolada, refém, inclusive, de interpretações falhas ou imprecisas.

Ademais, esse tipo de leitura sobre a guerra pode mascarar, com excessivo otimismo, a efetiva falta de disposição das partes em uma saída negociada. Acreditar que a guerra acabará em breve é um sentimento que impulsiona os combatentes a persistir e resistir diante das adversidades, ao mesmo tempo em que, para os analistas mais cartesianos, reforça a crença de que há alguma lógica no caos.

Apesar disso, é importante reconhecer que excessiva confiança nos rumos de um conflito pode ser algo frágil e sujeito a decepções, já que "sob a névoa da guerra" paira, antes de tudo, a imprevisibilidade. Se praticar ou crer no " escalar para desescalar" garante certo conforto em corações e mentes, ao mesmo tempo pode nublar o horizonte.

No conflito entre Rússia e Ucrânia, até o momento, infelizmente, propostas de paz parecem ter mais a ver com busca de protagonismos individuais de certos líderes ou com o senso de oportunidade de determinados países do que necessariamente com o timing do campo de batalha ou as decisões estratégicas de seus protagonistas.