Fernanda Magnotta

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Opinião

'América em Primeiro Lugar' novamente? Divisões se aprofundam nos EUA

Ontem, a Câmara dos Representantes dos Estados Unidos aprovou um significativo pacote de ajuda à Ucrânia no valor de 61 bilhões de dólares, refletindo não apenas a complexidade da política externa atual, mas também uma divisão crescente dentro do Partido Republicano.

Além dos recursos para o país do leste europeu, outras medidas aprovadas incluíram 26 bilhões de dólares para Israel, ajuda militar para Taiwan e uma censura ao TikTok, exigindo que a empresa desfaça suas relações com a China.

Com 311 votos a favor e 112 contra, o resultado da votação evidencia uma tensão entre o isolacionismo e a responsabilidade global que caracteriza o debate político nos Estados Unidos em geral, e nesse momento específico, particularmente. Os defensores mais radicais do trumpismo continuam a advogar por uma política externa de maior afastamento das questões do mundo, assumindo, como seu líder, duras críticas à ordem liberal estabelecida e ao papel a ser desempenhado pelo país.

Trump, já no seu primeiro governo, mostrou-se mais favorável a usar mecanismos econômicos como ferramentas de barganha política em detrimento do uso da força per se. Com base no apelo nacionalista, buscou uma abordagem que maximizasse, sob sua ótica, os retornos sobre investimentos norte-americanos, muitas vezes à custa das posições de entidades como as Nações Unidas ou junto aos aliados da União Europeia, por exemplo.

Além disso, conduziu negociações duras, não se prendendo a acordos ou doutrinas previsíveis. O mundo, no entanto, era bem diferente naquele momento, sem a guerra da Ucrânia ou as renovadas tensões no Oriente Médio que temos agora, triangulando Hamas, Israel e o Irã.

Mesmo tendo avançado, a aprovação do pacote de ontem foi repleta de desafios. Não é desprezível que a aparente flexibilização da postura dos "MAGA" tenha vindo à tona apenas algumas semanas depois de uma reunião, na Flórida, entre o ex-presidente Trump e o Chefe da diplomacia britânica David Cameron, que foi ao encontro do republicano antes de uma visita oficial a Washington, durante a qual se esperava que ele solicitasse formalmente a liberação de ajuda à Ucrânia.

Foi um aceno pragmático, ainda que incômodo para muitos europeus, para viabilizar os recursos necessários, já que Trump tem, hoje, ampla incidência sobre a maioria do partido. Para o ex-presidente, por sua vez, no contexto eleitoral norte-americano, o gesto de deferência trouxe-lhe prestígio e ajudará a alimentar a narrativa de que, no fim do dia, é preciso que outros países se curvem a ele.

Do ponto de vista doméstico, o Speaker da Câmara dos Representantes, Mike Johnson, enfrentou intensas negociações e pressões de membros mais radicais de seu partido antes de conseguir avançar com a ajuda à Ucrânia. No processo de votação, houve uma divisão clara: 101 republicanos apoiaram a medida, enquanto 112 votaram contra a ajuda.

Dentre os opositores houve até mesmo quem evocasse Ronald Reagan para justificar seu voto contra a ajuda. Além disso, 21 desses republicanos também se posicionaram contra o pacote militar a Israel, demonstrando uma inclinação a levar o princípio de "América em primeiro lugar" mais longe que o próprio Trump.

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Diante de um cenário de crescente fragmentação e radicalismo nos Estados Unidos, é essencial questionar: a política externa de Trump, hoje, enfrentaria mais pressões por um desengajamento global do que em 2020? As ações recentes no Congresso parecem indicar que sim.

Com mais sensibilidades e conflitos, se o trumpismo, em 2025, voltasse ao poder e dobrasse a aposta em nome de uma política externa mais isolacionista, o que podemos esperar como efeitos imediatos? Estaríamos diante de um sistema mais seguro ou de um mundo mais perigoso? Essa é uma pergunta que não quer calar.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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