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Fernanda Magnotta

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Opinião

Acreditar que 'agora seria diferente' na Venezuela era pura ingenuidade

Sabemos que pesquisas, muitas vezes, não refletem a realidade - seja por método, seja por servirem a interessem políticos. Sabemos também que nenhuma sociedade é homogênea, e que até os governos mais controversos possuem a legitimidade de vorazes apoiadores - seja por convicção ou apenas por conveniência.

Ainda assim, não dá para normalizarmos comportamentos como os que testemunhamos no pleito de 2024 na Venezuela: inviabilização de candidaturas competitivas contra o regime, tentativas de supressão eleitoral, e falta de transparência nas apurações dos resultados.

Não é possível assistir, sem incômodo, o discurso de um líder que fala em "banho de sangue", caso seja derrotado.

Não é admissível que o procurador-geral do país, responsável por fiscalizar a eleição, demonize pesquisas de boca de urna, declare antecipadamente a "inevitável vitória" de seu candidato preferido, e ameace prender quem "usurpar as funções exclusivas do órgão eleitoral" (seja lá o que isso signifique).

Não é razoável que toda crítica externa seja vista como "operação de intervenção". Isso costuma caracterizar diversionismo e tentativa de manipulação das massas por meio da criação de inimigos comuns a serem combatidos. Enquanto isso, dentro do governo, "passam-se as boiadas".

A eleição deste fim de semana na Venezuela demanda um olhar muito cuidadoso e permeado de nuances - até por isso, também exige uma postura que não pode permitir certas relativizações.

Colocar a máquina do Estado à disposição do governo para inflar popularidade e sabotar candidaturas contrárias são problemas graves que contribuem para déficits democráticos. Autocracia eleitoral é uma coisa, democracia, outra.

Democracia requer mais do que apenas votos. Demanda pluralismo político, respeito ao Estado de Direito, separação e autonomia entre os poderes, liberdade de oposição, respeito às minorias, liberdade de imprensa, entre outras coisas. Democracia requer compromisso consistente com certos valores e estrutura institucional que preserve um sistema competitivo e perene de freios e contrapesos. Isso não existe na Venezuela que conhecemos.

Se Maduro nunca deu sinais de respeitar vários desses requisitos, por que agora se prestaria a esse papel? Sem supressa, portanto, é compreensível que boa parte da comunidade internacional desconfie dos resultados da eleição. Trata-se de algo perfeitamente lógico e racional, considerando os parâmetros anteriores que temos desse regime.

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Que incentivos Maduro teria para agir diferente desta vez? Quais interesses explicariam uma mudança de padrão nesse momento? Nada disso esteve claro. Talvez o sentimento de "agora vai" propagado mundo afora tenha sido, o tempo todo, mais "wishful thinking" do que necessariamente uma expressão da realidade.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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