Topo

Jamil Chade

Tedros: as advertências da OMS para a covid-19 não foram ouvidas

18.mai.2020 - Diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, durante coletiva virtual - China News Service via Getty Images
18.mai.2020 - Diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, durante coletiva virtual Imagem: China News Service via Getty Images

Colunista do UOL

02/02/2021 08h40Atualizada em 02/02/2021 19h11

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Por Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, Diretor-Geral da OMS

Há um ano, no dia 30 de Janeiro, a Organização Mundial da Saúde declarou o surto do novo coronavírus uma emergência de saúde pública de dimensão internacional — o nível mais elevado de alerta à nossa disposição nos termos da lei internacional.

Nessa altura, registraram-se 98 casos confirmados e nenhum óbito fora da China.

A OMS (Organização Mundial da Saúde) instou repetidamente todos os países a capitalizarem a "janela de oportunidade", para evitar a transmissão generalizada deste novo vírus.

Alguns países prestaram atenção a este e outros avisos e procederam bem. Outros não.

Isso é confirmado pelas trágicas etapas pelas quais o mundo tem passado desde então, incluindo a morte de mais de 2 milhões de pessoas e mais de 100 milhões de casos confirmados.

Essas ocorrências estão a deixar marcas nas nossas comunidades e consciência coletiva. O sofrimento das pessoas atingidas pela covid-19, muitas das quais eu conheci bem, é confrangedor.

Nas duas primeiras semanas do surto, a OMS emitiu orientações muito abrangentes para deter a transmissão do vírus, cuidar dos pacientes e equipar os profissionais de saúde.

A OMS ajudou os cientistas a publicar os primeiros protocolos de testes PCR dias depois de os cientistas chineses partilharem a sequência genética do vírus. Isso permitiu o rápido desenvolvimento e aplicação de testes e a promessa hoje oferecida pelo potencial das vacinas para salvar vidas.

Esta nova janela de oportunidade deve ser agarrada com as duas mãos.

Temos de dar prioridade à equidade. São as pessoas de risco de todos os países, especialmente os profissionais de saúde, as pessoas mais idosas e as que têm doenças subjacentes, que devem ter acesso às vacinas e não todas as pessoas em alguns países.

Até agora, foram administradas vacinas em mais de 50 países. Sem surpresa, foram os países mais pobres que ainda não conseguiram começar a administrar as vacinas.

Os países ricos estabeleceram acordos bilaterais com os fabricantes para vacinar populações inteiras, por vezes várias vezes. Isso não deixou aos países com grande pressão interna para começarem a vacinar as suas populações outra escolha se não fazerem as suas próprias negociações.

O resultado foi que os fabricantes começaram a dar prioridade aos negócios mais rentáveis com os países ricos, em vez de apoiarem o lançamento equitativo das vacinas a todos os países.

Os apelos à equidade devem ser traduzidos em ações. Isso significa maior investimento no Acelerador do Acesso às Ferramentas para a Covid-19 (ACT) , uma iniciativa mundial lançada em Abril para incentivar o desenvolvimento e a distribuição das vacinas, tratamentos e testes de diagnóstico, com um final à vista para esta pandemia.

Tem sido enorme o apoio mundial ao Acelerador ACT e ao seu pilar das vacinas, o COVAX, que mereceu a aprovação de 190 países e economias.

Mas o Acelerador ACT tem uma lacuna financeira de 27 mil milhões de dólares americanos para 2021. Esta é apenas uma fração do custo econômico mundial projetado de até 9,2 biliões de dólares, se os governos não assegurarem que as economias em desenvolvimento terão acesso equitativo às vacinas contra a covid-19.

Para ganhar a corrida ao vírus, é preciso priorizar a ciência, especialmente num momento em que assistimos à emergência de novas variantes.

Para resolver o problema, não podemos abrandar a testagem, num momento em que o vírus se está a disseminar por todo o lado.

Os governos devem aumentar as suas capacidades para o sequenciamento genômico, que não estão suficientemente disponíveis, deixando muitos países desconhecedores das mutações do vírus.
Mas sinto-me encorajado com muitos sinais de progressos.

O COVAX, até agora, tem acordos estabelecidos para aceder a, pelo menos, 2 mil milhões de doses de várias vacinas candidatas promissoras. A Pfizer prometeu até 40 milhões de doses de vacinas ao COVAX. Estamos confiantes em que outras vacinas serão aprovadas e distribuídas nas próximas semanas.

Reconheço igualmente o apoio que os governos têm dado à proteção dos seus profissionais de saúde.

Assim, a OMS apela ao mundo para que garanta a vacinação dos profissionais de saúde e das pessoas mais idosas, o que irá acontecer em todos os países nos primeiros 100 dias de 2021.

Se tivermos sucesso, estaremos no bom caminho para controlar a pandemia e, por esta altura, no próximo mês de Janeiro, encontraremos todos os países e comunidades do mundo numa via mais saudável, mais segura e mais sustentável para o futuro.

Este artigo foi publicado, originalmente, em inglês no jornal The Guardian.