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Violência política coloca o Brasil no radar da ONU
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A Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados entregou aos relatores da ONU uma denúncia contra o governo de Jair Bolsonaro diante da violência política no Brasil e o assassinato de Marcelo Arruda. Observadores nas Nações Unidas apontaram à coluna que a volta do debate da violência política no Brasil na dimensão que ganhou nos últimos meses é inédita durante a democracia e remonta ao cenário de debates que existiam sobre o país nas comissões das Nações Unidas durante o regime militar (1964-1985).
Fontes na entidade confirmam que estão acompanhando a situação brasileira, enquanto o Itamaraty vem tentando nas últimas semanas silenciar e criticar qualquer questionamento feito pela ONU sobre o comportamento de Jair Bolsonaro diante das eleições. No mês passado, depois de o Brasil ter sido criticado pela alta comissária da ONU pata Direitos Humanos, Michelle Bachelet, o governo insistiu que não aceitaria o envolvimento internacional no debate eleitoral doméstico.
Agora, as novas denúncias foram entregues a Clement Nyaletsossi Voule, relator especial sobre a liberdade de reunião pacífica e de associação, e para Irene Khan, relatora especial para a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão. A coluna apurou que a situação brasileira está sendo monitorada de perto pelos mecanismos da ONU, preocupados com a violência política no Brasil.
O documento, assinado por Orlando Silva (PC do B-SP) e presidente da Comissão, lembra que Voule esteve no Brasil em março e já manifestou preocupação com o ambiente polarizado que pode desencorajar os cidadãos a votar nas próximas eleições gerais. Ele, no momento, afirmou que o contexto de ameaças, intimidação e violência, incluindo ameaças de morte contra candidatos, chamou sua atenção.
"Demonstrou preocupação ainda ao saber que o Brasil adotou recentemente legislação para facilitar o acesso ao armamento. Afirmou, nesse sentido, que quase todos os interlocutores demonstraram fortes preocupações com a violência potencial durante os próximos processos eleitorais devido ao aumento do acesso a armas e munições. Infelizmente, as piores preocupações já se confirmam", diz o texto, numa referência à morte de Arruda.
O militante do PT foi baleado por um agente penal que invadiu a festa de aniversário que Arruda organizava. "Aos gritos de apoio a Bolsonaro, ele atirou em Marcelo, que morreu aos 50 anos, diante de amigos e familiares", diz o texto.
"O fato causou uma comoção nacional, de um lado. Mas a ele ficaram indiferentes o Presidente da República, que negou que estimule a violência e não prestou solidariedade à família, e o vice-presidente da República, General Hamilton Mourão, que disse se tratar de briga de fim de semana", diz a Comissão da Câmara.
Segundo a denúncia, há hoje no Brasil "um grave ambiente de hostilidade e violência". "O ambiente social e político é gravíssimo, não somente no sentido de ameaçar as próximas eleições e o regime democrático, mas também pelo risco concreto que correm militantes e candidatos que de alguma maneira se opõem ao atual governo", disse.
A presidência da Comissão pediu para que os relatores da ONU se manifestem e esclareçam "quais os parâmetros internacionais devem ser obedecidos e quais estão sendo desrespeitados no caso em questão". O órgão ainda pede que os relatores "auxiliem o Brasil a superar esse grave quadro de violações".
Incitação por parte de Bolsonaro
O documento, porém, não se limita ao caso de Arruda, que morreu no dia 10 de junho. De acordo com a denúncia, existem pelo menos 16 episódios recentes de agressão ou estímulo à violência, incluindo o assassinato de Marielle Franco.
O texto deixa claro a responsabilidade do presidente Jair Bolsonaro em estimular tais atos. "Em 3 de setembro de 2018, o então candidato à Presidência Jair Bolsonaro afirmou, com um rifle em punho, "Vamos fuzilar a petralhada".
Em 22 de abril de 2020, em reunião ministerial, Bolsonaro afirmou querer o povo armado para caso perdesse as eleições.
"Após a visita do relator da ONU, em 16 de abril de 2022, Bolsonaro falou em "tiro" e "granada" quando criticava Lula em discurso. Em transmissão ao vivo nas suas redes sociais, no dia 8 de julho, Bolsonaro atacou o sistema eleitoral e disse1: "Não preciso dizer o que estou pensando, mas você sabe o que está em jogo. Você sabe como você deve se preparar, não para o novo Capitólio, ninguém quer invadir nada, mas sabemos o que temos que fazer antes das eleições", destacou.
O documento da denúncia ainda aponta como, em 15 de junho de 2022, um drone lançou veneno, com cheiro de fezes e urina, sobre público que aguardava ato político com Luiz Inácio Lula da Silva em Uberlândia.
"Em 7 de julho de 2022, o juiz que havia mandado prender um ex-Ministro do Governo Bolsonaro foi alvo de ataque com fezes e ovos quando dirigia carro em Brasília", destaca. "No mesmo dia, uma bomba caseira com fezes foi lançada contra plateia em ato de Lula no Rio", disse.
A denúncia ainda lembra como Bolsonaro participou de atos em São Paulo e em Brasília pelo fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. "Chamou as eleições de "farsa", disse que só sairia da presidência "preso ou morto" e exaltou a desobediência à Justiça", apontou.
O documento apresenta exemplos de atos violentos cometidos por bolsonaristas naquele momento de eleição de 2018. "Pelo menos 50 casos de violência foram registrados nos dez dias anteriores em todo o país, provocados por apoiadores de Bolsonaro", diz.
"No dia seguinte, 8 de outubro, Paulo Sérgio Ferreira de Santana assassinou, com 12 facadas, o capoeirista Mestre Moa do Katendê em Salvador. Moa havia dito a Paulo Sérgio que era contra o candidato Jair Bolsonaro, e essa foi a razão do crime", destaca.
A denúncia ainda lembra que, em seu discurso de posse, em janeiro de 2019, Bolsonaro declarou que a bandeira do Brasil "só será vermelha [em alusão à esquerda] se for preciso nosso sangue".
"Em 28 de novembro de 2019, Fábio Leandro Schlindwein causou a morte de Antônio Carlos Rodrigues Furtado, após agredi-lo com socos e chutes, mesmo quando a vítima já estava caída no chão. Segundo o relatório da Polícia Militar, as agressões teriam sido precedidas de uma discussão política e que Schlindwein seria simpatizante da direita enquanto a vítima, simpatizante da esquerda", diz. "Na delegacia, surgiu outra versão para a motivação do crime: discussão por dívida", completou.
Os casos relatados pela Comissão da Câmara ainda incluem o de Rodrigo Pilha, militante do Partido dos Trabalhadores, que foi detido em março por estender uma faixa chamando Jair Bolsonaro de genocida. "Foi torturado na prisão. O agente que o agredia perguntava se ele, com 43 anos, não tinha vergonha de ser um vagabundo petista", disse .
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