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Jamil Chade

REPORTAGEM

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ONU alerta para violência política no Brasil e fala em ameaça à democracia

Bolsonaro é alvo de projeção no prédio da ONU, em Nova York. Presidente é chamado de "vergonha brasileira", "mentiroso" e "desgraça" - Bolsonaro é alvo de projeção no prédio da ONU, em Nova York. Presidente é chamado de "vergonha brasileira", "mentiroso" e "desgraça"
Bolsonaro é alvo de projeção no prédio da ONU, em Nova York. Presidente é chamado de "vergonha brasileira", "mentiroso" e "desgraça" Imagem: Bolsonaro é alvo de projeção no prédio da ONU, em Nova York. Presidente é chamado de "vergonha brasileira", "mentiroso" e "desgraça"

Colunista do UOL

27/09/2022 06h24

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Numa declaração feita nesta terça-feira, em Genebra, o Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos fez um alerta sobre os ataques contra o processo eleitoral brasileiro e aponta estar "muito preocupada" com a violência política às vésperas da eleição neste domingo,

"Estamos cientes dos informes sobre a violência política e estamos fortemente preocupados com o relato de violência contínua que envolve partidos políticos, apoiadores e candidatos", disse a porta-voz do escritório da ONU para Direitos Humanos, Ravina Shamdasani.

Ela destacou que os estados "têm a obrigação de garantir a total implementação de direitos políticos de seus cidadãos, em toda sua diversidade". "E isso inclui criar um ambiente no qual eles podem fazer uma troca livre de informação e ideias, e onde a imprensa possa de maneira segura fornecer controle sobre o processo eleitoral", afirmou.

Sem citar o nome do presidente Jair Bolsonaro, a porta-voz criticou os ataques realizados contra as urnas eletrônicas e as ameaças de não reconhecimento dos resultados da eleição.

"Notamos também que existem tentativas repetidas de colocar dúvidas sobre a credibilidade do sistema eleitoral e ameaças de não reconhecer os resultados da eleição. Isso representa um sério risco para o processo democrático", alertou.

Num apelo, a ONU recomendou a "todos os líderes políticos e candidatos", às vésperas da eleição de 2 de outubro, que tomem ações para não incentivar "o uso da violência contra oponentes políticos".

Já na semana passada, num comunicado inédito na história da recente democracia brasileira, oito relatores da ONU (Organização das Nações Unidas) se uniram para pedir às autoridades, candidatos e partidos políticos no Brasil a garantia de que as próximas eleições sejam "pacíficas e que a violência relacionada com as eleições seja prevenida". A declaração ocorre poucos dias depois de o presidente Jair Bolsonaro usar a tribuna da ONU para fazer campanha política, num gesto que deixou governos estrangeiros indignados com a postura do brasileiro.

O comunicado, mesmo sem citar o nome do presidente brasileiro, criticou os ataques feitos contra o Judiciário, contra as urnas e alerta sobre o impacto desse comportamento para a sobrevivência da democracia. Nos bastidores, fontes da ONU confirmaram que a medida foi a maneira encontrada para colocar uma pressão sobre o governo para que não viole as regras eleitorais.

Sanções não podem ser aplicadas sobre o Brasil, muito menos por conta de um comunicado partindo de relatores. Mas a declaração serve como um alerta de que a comunidade internacional não está disposta a aceitar uma ruptura democrática no país. O impacto, caso Bolsonaro opte por esse caminho, seria uma condenação internacional praticamente imediata.

"Exortamos as autoridades a proteger e respeitar devidamente o trabalho das instituições eleitorais. Expressamos ainda nossas preocupações sobre o impacto que tais ataques poderiam ter sobre as próximas eleições presidenciais, e enfatizamos a importância de proteger e garantir a independência judicial", disseram os especialistas.

A declaração foi assinada por Clément Nyaletossi Voule, relator especial sobre os direitos à liberdade de reunião pacífica e de associação, Reem Alsalem, relatora especial sobre violência contra mulheres e meninas, Francisco Cali Tzay, Relator Especial sobre os direitos dos povos indígenas, Mary Lawlor, Relatora Especial sobre a situação das pessoas defensoras dos direitos humanos; Morris Tidball-Binz, Relator Especial sobre execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias; E. Tendayi Achiume, Relatora Especial sobre as formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância relacionada; Irene Khan, Relatora Especial sobre a promoção e proteção do direito à liberdade de opinião e expressão; Diego García-Sayán, Relator

No mês passado, a então alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, criticou os ataques de Bolsonaro contra as instituições democráticas e contra as urnas, além de de sua incitação à violência. Sua atitude levou o Itamaraty a apresentar um protesto formal contra a chilena.

No início do ano, ela já havia alertado para o risco de violência, o que levou o governo a elevar o tom contra Bachelet, exigindo que não houvesse "interferência" na eleição brasileira.

Ataques contra Poderes e contra a democracia

Sem citar o nome do presidente Jair Bolsonaro, os especialistas expressaram ainda suas preocupações com a "campanha difamatória em curso e com os contínuos ataques contra as instituições democráticas, o Poder Judiciário e o sistema eleitoral no Brasil, incluindo o sistema eleitoral eletrônico".

"Estamos preocupados que este ambiente hostil represente uma ameaça à participação política e à democracia e instamos o Estado a proteger os candidatos de quaisquer ameaças, atos de intimidação ou ataques on-line e off-line", disseram os relatores.

Os especialistas ainda fizeram um apelo para que "todos aqueles envolvidos no processo eleitoral devem se comprometer com uma conduta pacífica antes, durante e após as eleições".

"Os candidatos e partidos políticos devem abster-se de utilizar linguagem ofensiva que possa levar à violência e a abusos dos direitos humanos", afirmaram. Os especialistas disseram que discursos de ódio, desinformação de gênero e incitação dos candidatos e seus apoiadores durante o período de campanha eleitoral podem desencadear violência.

Para eles, cabe ao estado "assegurar que todos os processos eleitorais sejam não discriminatórios, livres de desinformação, discurso de ódio e incitação à violência. Todas as liberdades fundamentais, incluindo o direito à liberdade de reunião e associação e a liberdade de expressão devem ser defendidas", afirmaram os oito relatores.