Topo

Jamil Chade

exclusivo
REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

OCDE diz que processo de adesão não é chancela às políticas de Bolsonaro

22.jun2022 - O presidente Jair Bolsonaro (PL) com a bandeira do Brasil ao fundo em audiência com o Secretário-Geral da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). - Isac Nóbrega/PR
22.jun2022 - O presidente Jair Bolsonaro (PL) com a bandeira do Brasil ao fundo em audiência com o Secretário-Geral da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Imagem: Isac Nóbrega/PR

Colunista do UOL

24/10/2022 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Resumo da notícia

  • Brasil terá de reverter desmatamento para aderir à OCDE, revela carta da entidade
  • Documentos exclusivos publicados pelo UOL mostraram que governo afirmava estar "completamente alinhado" com critérios da OCDE.

O Brasil terá de demonstrar na prática uma redução do desmatamento se quiser fazer parte da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), uma das principais metas da politica externa de Jair Bolsonaro. Numa carta enviada para entidades brasileiras e obtida com exclusividade pelo UOL, a cúpula da instituição, uma espécie de clube dos países mais ricos do mundo, deixou claro que não vai avaliar apenas a existência de leis ambientais no Brasil, mas principalmente como elas são implementadas.

Ela ainda alerta que, enquanto tais critérios não forem atingidos, um sinal verde para fazer parte da instituição não ocorrerá.

E ainda garante: o fato de ter iniciado o processo de adesão do Brasil não significa que a instituição esteja dando uma chancela às atuais políticas do país candidato.

Na semana passada, com exclusividade, o UOL revelou as mais de 1.100 mil páginas de documentos que o governo de Jair Bolsonaro submeteu à OCDE, como parte de seu processo de adesão. O Brasil, porém, havia mantido a documentação em sigilo, impedindo que a sociedade civil pudesse acompanhar o processo.

Para que a OCDE aceite o ingresso do Brasil, a entidade avaliará mais de 230 critérios. Segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes, o país só não cumpre 45 deles. Mas, ao avaliar o texto submetido pelo Brasil, a reportagem descobriu que o Executivo considera que cumpre 35 das 37 metas ambientais, fato contestado por ambientalistas e mesmo por governos europeus.

Agora, numa carta enviada para a sociedade civil, a OCDE sugere que a adesão do Brasil não será tão simples como Guedes tenta apresentar.

O documento é uma resposta às preocupações de mais de 30 entidades brasileiras e estrangeiras que, sem acesso aos papéis de adesão por parte do governo, temiam que a OCDE iria acelerar o processo, sem levar em consideração a realidade ambiental do país.

Mas, segundo o secretário-geral da OCDE, Mathias Cormann, na carta enviada às entidades, a questão ambiental será tratada como "prioridade". De acordo com ele, um dos itens será "como garantir a proteção efetiva do meio ambiente e da divindade e ação sobre mudanças climáticas" para garantir que as metas do Acordo de Paris sejam atingidas.

Cormann ainda diz que isso "inclui a adoção e implementação completa de políticas públicas em conformidade com as metas climáticas do país, incluindo a inversão e a suspensão da perda de biodiversidade e do desmatamento como acordado durante a COP26 em Glasgow, e tomando efetivo ações para traduzir isto na prática".

Sem selo de aprovação, por enquanto

A OCDE ainda é clara em alertar que, ao iniciar o processo de adesão do Brasil, não sinalizou que está de acordo com as políticas atuais do país.

"A decisão de abrir as discussões de adesão à OCDE não é um selo de aprovação das políticas existentes do país candidato, mas sim o início de um processo rigoroso de processo plurianual de revisões aprofundadas por técnicos da OCDE para assegurar o alinhamento do país com as normas da OCDE, bem como melhores políticas e práticas", explicou.

"Nenhuma decisão será tomada sobre a adesão até estas revisões técnicas são concluídos", alerto.

De acordo com ele, o Brasil será revisado por 26 comitês técnicos da OCDE cobrindo quase todas as áreas de atividade governamental. "Desta forma, a adesão à OCDE processo proporcionará uma revisão profunda de 360 graus do Brasil legislação, políticas e práticas", explicou.

No que se refere ao meio ambiente, a entidade indicou que irá avaliar se o Brasil está adotando políticas "efetivas e ambiciosas", e "demonstrando" que tal sistema é adotado de forma transparente.

A meta, segundo a OCDE, é "parar e reverter" o desmatamento até 2030, assim como adotar medidas para fortalecer os direitos de povos indígenas.

Em outro momento da carta, Cormann ainda diz que a OCDE vai avaliar se o Brasil de fato luta contra a impunidade contra criminosos ambientais e se ações são tomadas contra quem ataca ou ameaça ambientalistas.

Nos últimos quatro anos, o número de multas ambientais caiu de forma importante e o Brasil passou a ser um dos países mais perigosos para ambientalistas.

A OCDE ainda explica que o tema ambiental não ficara restritivo aos comitês que lidam com o tema climático ou de biodiversidade. O assunto ainda fará parte das discussões sobre agricultura, sobre a responsabilidade de empresas ou de políticas regulatórias.

Cormann ainda explicou para as entidades que o documento de 1,1 mil páginas submetidas pelo Brasil é "apenas o primeiro passo" e que cabe agora aos comitês da OCDE examinar o que é de fato a situação do Brasil.

A revisão será seguida por recomendações e, em seguida, a entidade irá examinar se elas estão sendo cumpridas. Conforme o UOL revelou, o documento original do Brasil contava com mentiras, omissões e distorções sobre a situação ambiental do país.

Para completar, Cormann ainda deixou claro: a OCDE não irá considerar uma decisão de aceitar um país até que cada comitê conclua sua revisão.