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Jamil Chade

REPORTAGEM

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COP27: ONU pedirá liderança política de Lula em agenda climática no mundo

 Noruega anuncia retomada de fundo para a Amazônia  -  O Antagonista
Noruega anuncia retomada de fundo para a Amazônia Imagem: O Antagonista

Colunista do UOL

04/11/2022 07h09

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Luiz Inácio Lula da Silva, presidente eleito, será chamado a mostrar "liderança política" para permitir que a agenda climática possa avançar de forma mais rápida no mundo, antes que seja tarde demais para evitar um aquecimento do planeta que transforme e gere verdadeiras crises humanitárias pelo.

O apelo é do secretário-executivo da Convenção da ONU sobre Mudanças Climáticas, Simon Stiell. Numa coletiva de imprensa nesta sexta-feira sobre o que esperar da Cúpula do Clima (COP27), a autoridade máxima da ONU sobre o tema foi questionada pelo UOL sobre o que espera do presidente eleito, que já confirmou sua presença no evento no Egito.

"Precisamos de vontade política e de liderança política", disse o negociador, insistindo que esse é o pedido a todos os presidentes. "É muito importante, neste momento onde estamos na crise, a necessidade urgente de uma ação significativa e verdadeira no terreno", afirmou.

"Isso começa com política, isso começa com legislação. Começa com visão e direção dada pelo mais alto comando. Saudamos todos os políticos, nesse processo, seja os novos ou os vigentes. Mas a política precisa estar direcionada em agir para que possamos permitir chegar mais perto das metas", completou.

Lula decidiu ir à Conferência da ONU sobre o Clima que ocorre na próxima semana no Egito, inclusive como um sinal claro de que sua gestão irá colocar a questão climática no centro de sua agenda e na busca de recuperar a credibilidade internacional do país. Em suas declarações, ele já deixou claro que está ciente da pressão internacional e que está disposto a voltar a cooperar.

Sua ida ocorre depois que o governo do Egito, que organiza o evento, enviou uma carta ao presidente eleito para oficialmente convidá-lo. Entre diplomatas estrangeiros, a presença de Lula irá ofuscar a delegação oficial do Brasil, liderada ainda por representantes de Jair Bolsonaro.

A reportagem do UOL apurou que, nas diversas reuniões já marcadas para Lula no Egito, negociadores farão dois pedidos: para que o novo presidente tome ações concretas no Brasil para "dar exemplo" e para que ele se apresente como mobilizador dos países emergentes na busca por acordos e novos compromissos. A ideia é de que, se ele conseguir isso, a pressão sobre os países ricos ficará insustentável e terão de agir, inclusive liberando recursos para os países em desenvolvimento.

Novos compromissos

Pessoas do mais alto escalão da ONU e com amplo acesso ao secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, admitiram ao UOL que existe uma esperança de que o governo Lula irá refazer e reapresentar à comunidade internacional novos compromissos nacionais, no que se refere à redução de emissões. A proposta apresentada por Bolsonaro foi duramente criticada e vista como uma tentativa do governo de trapacear a comunidade internacional.

Segundo esses negociadores, há uma disposição real do mundo em ajudar o Brasil a lidar com o desmatamento, inclusive com o retorno do financiamento externo. Mas não haverá "cheque em branco" e, antes de um novo acordo, o que o mundo quer ver é se o novo governo brasileiro tem novas metas e planos. No Egito, isso estará no centro das atenções.

Na semana passada, num verdadeiro obituário da política de meio ambiente do Brasil, o Programa da ONU para Meio Ambiente publicou seu informe anual sobre emissões revelando que o governo de Jair Bolsonaro vai na direção contrária entre as principais potências do mundo no que se refere ao combate às mudanças climáticas.

A estratégia do Itamaraty e de outras autoridades nacionais de mentir à comunidade internacional simplesmente fracassou.

O documento aponta que as metas estabelecidas pelos maiores responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa não estão sendo suficientes para limitar o aquecimento global dentro dos limites definidos pelo Acordo de Paris, abaixo dos 2 graus Celsius e com esforços para que o limite seja de 1,5 grau Celsius até 2100.

O que ainda deixou a ONU preocupada é que, apesar das metas anunciadas pelos governos durante a Cúpula em Glasgow, no ano passado, as políticas, medidas e ações sequer correspondem ao que foi assumido pelas diplomacias de todo o mundo.

Para a entidade, não há opção: ou governos aumentam sua ambição ou simplesmente o desastre climático será uma realidade.

Mas o informe revela um outro aspecto: todo o esforço do governo de Jair Bolsonaro de mostrar ao mundo, em Glasgow, que estava assumindo uma postura de defesa do clima não passava de uma farsa.

No ano passado, o governo tentou desmontar a pressão internacional anunciando compromissos de redução de desmatamento e adotando um novo tom nos discursos. Mas as taxas de destruição da floresta continuaram a subir, enquanto os órgãos para lidar com a situação da Amazônia continuaram sem recursos.

Para Carlos Rittl, especialista em política internacional da Rainforest Foundation da Noruega, o Brasil "se destaca negativamente" no novo informe da ONU.

O país aparece como o país dentro do G20, que, ao invés de aumentar a ambição climática em seus novos compromissos, apresentou metas que vão levar a um aumento das emissões em 2030 em relação às propostas anteriores. Apenas o México também tem um desempenho que vai na contramão do mundo, mas em taxas bem mais modestas que a brasileira.

"Ou seja, o mundo está caminhando rápido para o caos climático, há pouco avanço nas metas dos maiores emissores, mas só um país que torna o desafio de combater o aquecimento global ainda mais difícil: o Brasil de Bolsonaro", disse Rittl.

"Além disso, o relatório também mostra que enquanto as emissões de uso da terra de alguns países, como China, Índia, Estados Unidos e União Europeia foram negativas em 2020, no Brasil as emissões aumentaram, por conta do aumento do desmatamento", destacou. "A guerra do Bolsonaro contra a Amazônia tem impacto para o mundo inteiro", disse.

O informe ainda revela que o Brasil, em sua proposta, nem sequer cumpre com todos os critérios esperados das maiores economias do mundo, como transparência, a publicação de um plano e um acompanhamento anual.