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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Governo Lula se reúne com oposição venezuelana e aposta em eleição de 2024

O assessor especial da presidência, Celso Amorim, se encontrou com o presidente venezuelano, Nicolás Maduro - Miraflores Palare/Reuters
O assessor especial da presidência, Celso Amorim, se encontrou com o presidente venezuelano, Nicolás Maduro Imagem: Miraflores Palare/Reuters

Colunista do UOL

11/03/2023 04h00Atualizada em 12/03/2023 10h13

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Uma delegação do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se reuniu nesta semana com membros da oposição venezuelana, em Caracas. A viagem foi liderada pelo assessor especial da presidência para Assuntos Internacionais, Celso Amorim. Se publicamente as imagens mostradas pelo governo venezuelano eram de reuniões entre o brasileiro e o presidente Nicolas Maduro, o UOL apurou que Amorim e seus diplomatas também fizeram visitas aos grupos de oposição.

A viagem de Amorim fez parte da retomada das relações entre Brasil e Venezuela, que tinham sido suspensas por Jair Bolsonaro (PL). A embaixada do Brasil em Caracas foi fechada, assim como quatro consulados e vice-consulados.

Bolsonaro também passou a reconhecer Juan Guaidó como presidente venezuelano, credenciando até mesmo diplomatas da oposição como os novos embaixadores de Caracas no Brasil.

Mas o novo governo brasileiro decidiu reabrir os postos, romper com Guaidó e iniciar um processo de diálogo tanto com o governo Maduro como com a oposição.

Fontes do Palácio do Planalto confirmaram os encontros de Amorim e indicaram que o tom de todos foi de que não estariam dispostos a uma operação para abreviar o governo Maduro. A aposta, segundo ouviu o governo Lula, é por uma eleição em 2024 que dê condições legítimas para que diferentes partidos possam concorrer.

Os encontros foram realizados com:

  • O principal negociador do setor da oposição, que participa da Mesa de Diálogo na Cidade do México, Gerardo Blyde;
  • Os deputados do grupo de oposição intitulado Aliança Democrática, Timoteo Zambrano e Luis Augusto Romero;
  • Os integrantes do também oposicionista Aliança do Lápis, liderados por Antonio Ecarri.


Antes da viagem, o chanceler venezuelano, Yván Gil Pinto, concedeu uma entrevista exclusiva ao UOL e aplaudiu a retomada das relações com o Brasil.

"Tudo o que acontece no Brasil tem impacto na região. A diplomacia do Brasil é muito importante e, infelizmente, vimos retrocesso do que é a diplomacia e com consequências terríveis para a região e para o mundo", disse o chanceler.

"Estamos iniciando uma nova fase, depois de muitos anos de irracionalidade diplomática. Compartilhamos mais de dois mil quilômetros de fronteira, temos projetos importantes, há uma comunidade de brasileiros na Venezuela e muitos venezuelanos no Brasil. Portanto, temos laços irrenunciáveis", insistiu.

"Agora, com Lula no poder, pudemos corrigir uma situação vergonhosa", disse o chefe da diplomacia de Maduro.

Segundo Caracas, o novo embaixador venezuelano em Brasília já entregou sua carta de representação ao Itamaraty. "Formalmente, começa um trabalho com o Brasil e estamos muito felizes com isso", disse.

Mas questionado sobre a participação direta do Brasil num processo negociador com a oposição, o ministro insinuou que, neste momento, não haveria um convite para que o país atue como mediador entre a oposição e o governo.

"O diálogo com a oposição tem tempo já tramitando. Com todas as oposições", disse. Segundo ele, o processo que ocorre no México segue um roteiro. "Vamos esperar os resultados. Por enquanto, (o processo) vai bem", disse.

Ao UOL, o chanceler Mauro Vieira declarou, no mês passado, que o Brasil "sempre falará" de democracia com parceiros e indicou que, se convidado, fará parte de um grupo de países que possa atuar para garantir um processo legítimo.

"No governo de Dilma Rousseff, havia uma 'troika' da Unasul que viajava. Eu, como ministro do governo Dilma, fui mais de uma vez por mês para a Venezuela com o chanceler do Equador e a chanceler da Colômbia. Mantivemos negociações constantes e contatos com o governo, em todas as áreas. Do presidente à Suprema Corte. Falamos também com a oposição", explicou.

"Negociávamos e conversávamos e, finalmente, o governo venezuelano aceitou a realização das eleições nas quais o governo saiu derrotado. Esse é o papel. Negociar é conversar. Não virar as costas por ter uma posição diferente", insistiu.

O UOL ainda questionou:

Então a democracia vai ser uma pauta com a Venezuela ou Cuba?

"Com todos os países, lógico", respondeu o chanceler.

Para ele, "fechar a embaixada em Caracas e quatro consulados prejudicou 25 mil brasileiros que vivem na Venezuela".

"A decisão foi tomada com base apenas política e ideológica. E essas pessoas ficaram abandonadas na Venezuela. Quando precisavam de qualquer tipo de documento, tinham de viajar até a Colômbia", explicou.

"A proteção dos brasileiros é um dever constitucional e temos de ter isso num país vizinho, com uma fronteira tão grande, numa região tão frágil. Já reabrimos a embaixada e estamos tomando as últimas medidas para reabrir os consulados", disse.