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Lula confronta potências e abre canais com pobres, ditaduras e opositores
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Num discurso feito em Paris hoje durante encontro com cerca de 40 líderes internacionais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou claro: sua diplomacia será marcada por uma ofensiva do Brasil por mudar o sistema internacional, considerado como arcaico, ultrapassado e ineficiente para os interesses dos países em desenvolvimento.
Lula, sentando ao lado do presidente da França e anfitrião, Emmanuel Macron, deixou claro que o FMI e o Banco Mundial já não mais funcionam e que a OMC (Organização Mundial do Comércio) acabou, desde que o governo americano passou a minar sua operação. Para ele, acordos como o do clima, fechado em Paris, não conseguem ser implementados por falta de uma governança internacional.
O brasileiro ainda criticou a atitude dos europeus na proposta de acordo com o Mercosul —impondo condições e ameaças— e deixou claro que seu objetivo é de contribuir para reduzir a dependência em relação à moeda americana.
Lula também atacou a configuração do Conselho de Segurança da ONU e insistiu que blocos como o G20 ou G7 precisam atrair os "diferentes". Se não bastasse, alertou: os ricos estão mais ricos e os pobres mais pobres.
Em resumo: o brasileiro questionou a estrutura de poder do mundo.
Desde que assumiu, Lula vem tratando de alguns desses temas, em diferentes reuniões. No G7, em Hiroshima em maio, ele também questionou as potências. Em outros fóruns, insistiu sobre a necessidade de uma mudança real.
Na quinta-feira, alertou que não são apenas os russos que invadem países estrangeiros. "Parece que virou moda", soltou. Horas depois, acusou os países ricos de não estar cumprindo sua parte no Acordo de Paris, retendo os prometidos US$ 100 bilhões anuais às economias em desenvolvimento para ajudar na transição climática.
Agora, porém, Lula concluiu sua fala com um aviso aos demais presidentes: "Se preparem. Estou com mais vontade de brigar nesses três anos que eu vou presidir o Brasil".
Em outras palavras, a busca por uma reforma do sistema internacional será o foco de sua política externa.
Para isso, e para se posicionar com protagonista desse diálogo, Lula vem proliferando reuniões e encontros, numa estratégia ainda de desfazer a ideologização da política externa. A ordem é a de falar "com quem tiver de falar".
Num encontro na tarde desta sexta-feira, em Paris, Lula e Macron voltaram a falar sobre o impasse no acordo do Mercosul-UE, trataram de avançar no setor de cooperação em Defesa e definiram a volta do intercâmbio cultural entre os dois países. Será a retomada do projeto do "Ano da França no Brasil" e do "Ano do Brasil na França".
Pobres, ditadores e opositores
Mas as conversas não se resumem aos centros de poder ocidental ou a aliados.
O brasileiro, assim, causou constrangimentos ao festejar a volta de Nicolas Maduro, presidente da Venezuela, na cena sul-americana.
Mas também gerou desconforto nesta semana na esquerda italiana —e mesmo brasileira— ao tecer amplos elogios a Giorgia Meloni, a primeira-ministra do país e descendente de grupos de extrema direita no país. Nos últimos anos, Meloni atacou a esquerda latino-americana e Lula, além de ter em seu governo aliados de Jair Bolsonaro.
Lula, porém, avisou: estava se reunindo com a chefe de governo da Itália e sua ideologia não seria um obstáculo.
Se o brasileiro passou sua campanha eleitoral falando que a eleição era uma questão de sobrevivência da democracia brasileira, ele não hesitou em marcar um jantar nesta sexta-feira em Paris com o príncipe saudita, Mohamed Bin Salman — seu governo é acusado de graves violações de direitos humanos e, no Brasil, de ter mantido relações estreitas com o bolsonarismo.
Com a repercussão negativa, o governo Lula anunciou que o encontro com o príncipe saudita foi cancelado, sem informações sobre o motivo e nem se uma nova data será marcada.
Parte da agenda é ainda dedicada a reconectar o Brasil com os países mais pobres do mundo. Isso incluiu nesta semana o Haiti e vários países africanos. Mas também com os organismos internacionais dedicados a lidar com o desenvolvimento.
Num gesto aos africanos, Lula passou a defender que o continente tenha uma maior representação no G20.
Críticas e alertas
Para observadores, porém, a estratégia pode ser seus limites, principalmente diante de sua base e até mesmo de movimentos sociais. Não são poucas as ONGs e entidades que demonstram nos bastidores preocupação diante da ausência de um discurso sobre direitos humanos nas reuniões de Lula, assim como sua opção por não questionar violações ou defender abertamente a democracia.
Grupos de oposição da Venezuela e Nicarágua estão entre os movimentos que temem o fortalecimento de seus respectivos regimes autoritários, diante do apoio do brasileiro.
Movimentos que defendem um posicionamento mais contundente do Brasil em questões de direitos das mulheres ainda torceram o nariz diante de algumas das posturas do governo.
Mas, no Palácio do Planalto, a percepção é a de que não existe uma retomada do protagonismo brasileiro no cenário internacional sem passar por um esforço para restabelecer relações com governos e atores de diferentes vertentes políticas.
Também entre os assessores de Lula, a ideia é a de que isolar um líder ou condenar um governo a sanções internacionais gera poucos resultados concretos e aprofunda a crise de confiança internacional.
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