Jamil Chade

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Veto dos EUA eleva tensão, e Assembleia Geral da ONU é convocada por russos

Num gesto que promete ampliar os atritos diplomáticos entre as grandes potências, a Assembleia Geral da ONU se reúne na próxima quinta-feira para tratar da crise na Faixa da Gaza. A inciativa é da Rússia e dos países árabes que, com a manobra, tentam evitar o veto dos EUA e aprovar uma resolução que coloque pressão sobre Israel por seus ataques contra os palestinos.

Na semana passada, duas resoluções no Conselho de Segurança da ONU foram vetadas. A primeira, proposta por Moscou, não obteve os votos necessários para ser aprovada. O texto nem sequer fazia menção ao Hamas.

Uma segunda resolução foi apresentada, desta vez pelo Brasil. Mas o governo de Joe Biden vetou, alegando que ela não tratava da questão da autodefesa de Israel.

A saída, para os russos, foi a de driblar o Conselho de Segurança e propor uma reunião de emergência da Assembleia Geral. Mais de 50 países do Oriente Médio e da África também apoiam a iniciativa, o que obrigou o presidente da Assembleia Geral, Dennis Francis, a convocar a reunião.

Se no Conselho de Segurança um veto de uma das cinco potências é suficiente para impedir que uma resolução seja aprovada, o que árabes e russos apostam é que essa regra não é válida para a Assembleia Geral. Ali, basta a maioria dos votos para que o projeto seja aprovado. A diferença, porém, é que o peso da resolução não é o mesmo.

Numa carta obtida pelo UOL e enviada por esses governos para a presidência da Assembleia Geral, o Grupo Árabe e do Grupo da Organização para a Cooperação Islâmica (OCI) nas Nações Unidas em Nova York, "solicitam a retomada da décima sessão especial de emergência da Assembleia Geral após o veto lançado em 18 de outubro de 2023 por um Membro Permanente do Conselho de Segurança sobre um projeto de resolução que aborda a grave situação do Território Palestino Ocupado, incluindo Jerusalém Oriental".

Diz a carta:

À luz da gravidade da situação, devido, em particular, à agressão militar por parte de Israel, a potência ocupante, contra a população civil palestina na Faixa de Gaza, que, até a presente data, matou milhares de civis, incluindo crianças, mulheres e idosos, feriu dezenas de milhares, causou a destruição desenfreada de casas e outras propriedades e infraestrutura civis, e infligiu condições humanitárias catastróficas, arriscando uma desestabilização ainda mais perigosa da situação, colocando em risco mais vidas civis e ameaçando a paz e a segurança internacionais, é urgente que a Assembleia Geral se reúna para tratar dessa crise.

Ao longo do processo negociador da resolução do Brasil, o Itamaraty cedeu e acomodou vários dos pedidos americanos, na esperança de que o texto pudesse ser aprovado.

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Mas a atitude da Casa Branca foi vista como uma tática de protelar qualquer decisão, argumentando até mesmo que o órgão deveria esperar o fim da visita de Joe Biden à região. Para a diplomacia brasileira, esses eram argumentos apenas para adiar qualquer gesto do Conselho e, mesmo aguardando a visita, não haveria qualquer garantia de que os EUA apoiariam o projeto.

Agora, a manobra dos árabes e russos vai no mesmo sentido da estratégia já usada pelo governo americano contra os russos, quando o governo de Vladimir Putin também usou seu poder de veto no Conselho e impediu a aprovação de uma resolução que os condenava pela invasão da Ucrânia.

A Casa Branca, então, levou o caso para a Assembleia Geral e, ali, conseguiu votos suficientes para aprovar uma resolução condenando Putin.

Transferir o ônus político

Do lado americano, porém, há um esforço para que não sejam vistos como os responsáveis pelo imobilismo no Conselho de Segurança. Depois de vetar uma resolução apresentada pelo Brasil, o governo dos EUA apresentou nesta segunda-feira um novo projeto focado em condenar o Hamas, impedir que o grupo tenha apoio internacional e reforçar a ideia de que Israel tem o direito a autodefesa.

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O texto foi submetido aos membros do Conselho de Segurança da ONU que, nesta terça-feira, voltam a se reunir sob a presidência do chanceler Mauro Vieira.

O novo projeto fala apenas de forma marginal sobre a possibilidade de "explorar passos adicionais, como uma pausa humanitária ou de um corredor humanitário". Mas sem qualquer compromisso. Tampouco há qualquer referência sobre a retirada de estrangeiros em Gaza.

O novo texto que está sob consulta foca seu conteúdo numa denúncia contra o Hamas e contra o terrorismo. O projeto de resolução ainda ataca aliados do grupo palestino. Mas não condena textualmente Israel e apenas fala na necessidade de civis sejam protegidos.

A manobra americana está sendo vista por diplomatas russos, brasileiros e chineses como uma forma de forçar o veto de outros membros do Conselho de Segurança e, assim, não ficar com o ônus político de terem impedido que o órgão da ONU se manifeste diante da crise.

Na resolução, a Casa Branca solicita que governos "intensifiquem seus esforços para suprimir o financiamento do terrorismo, inclusive restringindo o financiamento do Hamas", além de denunciar o Hezbollah.

Uma versão inicial do texto ainda afirmava que "o Irã deve cessar a exportação de todas as armas e materiais relacionados para milícias armadas e grupos terroristas que ameaçam a paz e a segurança em toda a região, incluindo o Hamas". Numa versão atualizada, nesta segunda-feira, a referência ao Irã desapareceu. Mas o texto pede que todos os países cessem exportação de armas ao Hamas.

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