Jamil Chade

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Mercosul e UE fracassam em fechar acordo, e retomada vive incerteza

Depois de 23 anos de negociações, não será ainda desta vez que Mercosul e a União Europeia fecharão um acordo comercial.

Após um dia inteiro de reuniões virtuais entre as duas delegações, ficou estabelecido que um comunicado conjunto será emitido nesta quarta-feira declarando que progressos foram feitos na aproximação entre os dois blocos e que o processo continuará em 2024.

Para negociadores de ambos os lados, porém, existem sérias dúvidas de que haverá espaço ainda para um entendimento.

Do lado do Mercosul, a presidência será assumida pelo Paraguai, que já deixou claro que o acordo não seria uma prioridade. Um dos argumentos é que a questão ambiental imposta pelos europeus não agradaria ao país.

Segundo negociadores, se o presidente Lula de fato quiser um acordo, terá de conversar com as autoridades paraguaias para convencer o vizinho a tocar o diálogo com os europeus.

Do lado de Bruxelas, as eleições para o Parlamento Europeu devem também frear o processo, já que poucos serão os comissários e mesmo equipes negociadoras que estarão dispostas a fazer concessões em um período de campanha.

Lula tinha a ambição de fechar o acordo ainda na presidência brasileira no Mercosul, que se encerra na quinta (7). A gestão de Jair Bolsonaro havia fechado um entendimento ainda em 2019, mas o processo ficou paralisado diante da recusa da Europa em aceitar a política ambiental do governo de extrema direita no Brasil.

Com a troca de governo no país, foi retomada a esperança de que o processo poderia caminhar — mas, uma vez mais, as o ritmo de negociações foi abalado por diferenças de entendimento em áreas como clima, compras governamentais, SUS e política industrial.

Houve um certo otimismo em outubro, quando as negociações pareciam avançar. A vitória de Javier Milei na Argentina, no entanto, abriu um período de dúvidas. Os diplomatas de Buenos Aires ampliaram suas reticências sobre o acordo e passaram a alertar que o processo era desequilibrado.

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Já na semana passada foi definido que a reunião decisiva que começaria nesta terça-feira ocorreria apenas de forma virtual, um sinal de que não haveria energia para um acordo.

Mesmo dentro do Brasil, forças sindicais e movimentos sociais passaram a enviar mensagens a Lula de que o acordo seria prejudicial para seus objetivos de política industrial.

O processo ainda sofreu um abalo quando, no fim de semana, o presidente da França, Emmanuel Macron, deixou claro que era contra um acordo. Lula ainda tentou convencer alemães, e a própria Comissão Europeia, de que era importante manter o processo.

A escolha dos negociadores, portanto, foi por desenhar um texto no qual avanços serão descritos e jogar para 2024 a continuação do processo iniciado em 1999 — já são muitos os diplomatas de ambos os lados do Atlântico, entretanto, que alertam que seu modelo já não condiz com a realidade das preocupações de 2024.

Construído num momento em que o livre comércio era a ideologia predominante, o processo acabou excluindo outras áreas — não trata de investimentos nem de meio ambiente na dimensão que muitos acreditam que deva ser a cooperação.

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O projeto Mercosul-UE, porém, não é o único a envelhecer mal. Tratados parecidos entre a Europa, Austrália e Canadá — que por anos foram negociados — tampouco conseguem ser plenamente implementados diante das resistências de todos os lados.

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