Jamil Chade

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Brasil ampliará repasse à agência atacada por Israel e assumirá presidência

O governo brasileiro quer quadruplicar os recursos destinados à Agência da ONU para os Refugiados Palestinos, a UNRWA. O Brasil assume a vice-presidência do Conselho Consultivo da entidade e, em 2025, será o presidente do Conselho.

A entidade vem sendo atacada pelo governo de Israel. Ao assumir a defesa da agência e sua presidência, o Brasil estará na linha de frente do debate sobre o funcionamento da UNRWA. A relação entre Brasília e Tel Aviv já vive seu pior momento, depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ter sido declarado persona non grata por Benjamin Netanyahu por causa de seus comentários sobre os acontecimentos em Gaza. Como resposta, o Brasil retirou de forma definitiva seu embaixador de Israel.

Enquanto isso, nesta semana, os trâmites estão sendo concluídos para a contribuição anual do Brasil ao organismo. O governo admite que busca formas de ampliar o valor ainda em 2024.

A contribuição do Brasil para a agência é pequena, de apenas US$ 75 mil (R$ 413 mil, na cotação atual). Mas é considerada um gesto político importante, que permite que o país seja o único latino-americano no conselho da organização.

De acordo com o Itamaraty, o dinheiro já foi liberado e, nos próximos dias, deve entrar no caixa da UNRWA. Enquanto isso, o Itamaraty costura com outros setores do governo a mobilização de outros US$ 400 mil (R$ 2,2 milhões) que também seriam destinados à agência.

A iniciativa ocorre num momento em que o governo de Israel fala abertamente da necessidade de fechar a agência, acusando-a de ser uma fachada para interesses do Hamas. No início do ano, Netanyahu chegou a acusar funcionários da UNRWA de terem participado dos ataques terroristas de 7 de outubro, o que levou os maiores doadores da agência a suspender temporariamente o repasse de recursos.

A ONU abriu uma investigação e concluiu que Israel não forneceu provas de suas acusações. Outra conclusão foi de que a UNRWA tem regras suficientes para garantir sua neutralidade.

Mas o organismo internacional enfrenta problemas que ameaçam essa neutralidade e precisa de medidas para fortalecer seus mecanismos de controle. Apesar de implorar para que doadores não suspendessem o repasse de recursos, a agência perdeu mais de US$ 450 milhões (R$ 2,5 bilhões) no auge da crise humanitária em Gaza.

Brasil é escolhido como vice-presidente e, em 2025, presidirá órgão

Internamente, a participação do Brasil na agência é a estratégia que o país encontrou para fazer parte do debate sobre o futuro da questão palestina e se sentar à mesa do órgão que acompanha de perto o problema dos refugiados.

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Nesta semana, durante a reunião do conselho da agência, o Brasil foi escolhido por consenso para a posição de vice-presidente, ao lado de Jordânia e Espanha. Para 2025, será a vez de o Brasil assumir a presidência.

Em seu discurso, o governo brasileiro insistiu no fato de que o conflito em Gaza entrará para história como a guerra em que o sistema humanitário sofreu o maior número de perdas.

A intervenção do embaixador do Brasil em Ramallah, na Cisjordânia, Alessandro Candeas, indicou que a guerra deixou, até agora:

  • 193 funcionários da UNRWA mortos
  • 273 trabalhadores humanitários mortos
  • 498 médicos e profissionais de saúde mortos
  • 378 professores e trabalhadores da educação mortos
  • 151 jornalistas e trabalhadores da imprensa mortos
  • 19 hospitais fora de serviço

"O sistema humanitário e o direito humanitário internacional encontraram-se sob ataque", disse. "A UNRWA, na linha da frente do sistema humanitário no Oriente Médio, foi particularmente visada. Foi atacado por artilharia, guerra legal, vandalismo, intimidação e propaganda", afirmou.

"Para além da crise financeira estrutural, a agência será solicitada a ampliar o seu desempenho como interveniente-chave na reconstrução de Gaza", disse. "E terá de fazê-lo sem prejuízo dos outros quatro campos de atuação - Cisjordânia, Jordânia, Líbano e Síria", lembrou.

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Já indicando a forma como o Brasil vai agir nos cargos na agência, o embaixador sugeriu que o conselho "deve reforçar a capacidade operacional da UNRWA, a fim de evitar o colapso do sistema humanitário na região, com as suas repercussões na segurança".

Ele também defendeu que o conselho "não pode se permitir ficar paralisado por discussões políticas". "Deve enviar uma mensagem de unidade e concentrar-se no operacional", disse.

O Brasil apresentou duas recomendações ao Comissário Geral da UNRWA:

1) Estabelecer parcerias com organizações internacionais e regionais, ONGs, países individuais e o setor privado para fornecer serviços específicos, sem prejudicar a posição central da UNRWA. "Isso também poderia ser organizado em consórcios para atender as necessidades de oferta de uma forma mais sistemática", defendeu.

2) Envolver eficazmente os refugiados palestinos na concepção, tomada de decisões e implementação dos serviços. "Os refugiados são o verdadeiro propósito e devem ser envolvidos, não apenas como beneficiários, mas como atores ativos."

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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