Jamil Chade

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Brasil não vai a ato de EUA contra Maduro; Venezuela discursa em sala vazia

O governo brasileiro não aderiu a um evento em Nova York, nesta quinta-feira, para denunciar as violações do regime de Nicolás Maduro, na Venezuela. Organizado por EUA e Argentina, o objetivo do encontro foi o de reunir o maior número de países possível para colocar pressão sobre os venezuelanos.

O secretário de Estado norte-americano, Anthony Blinken, pediu que os governos "passem de declarações para ações conjuntas" e quer a contínua pressão sobre Maduro.

Mas também insistiu que o venezuelano se engaje em um diálogo com a oposição. Segundo ele, os EUA estão dispostos a apoiar o processo.

"Estamos aqui unidos no compromisso de defender os direitos humanos do povo venezuelano e empenhados em promover um esforço inclusivo liderado pelos venezuelanos para restaurar o futuro democrático da nação", disse Blinken.

"Isso significa insistir que Maduro se engaje em um diálogo direto com a oposição democrática unida da Venezuela que leve a um retorno pacífico à democracia. Os Estados Unidos e seus parceiros estão totalmente prontos para apoiar esse processo", indicou.

"Devemos usar todas as ferramentas à nossa disposição para responsabilizar os indivíduos que têm a maior responsabilidade pelas graves violações de direitos humanos cometidas contra o povo venezuelano, como os Estados Unidos fizeram e continuarão a fazer", insistiu. "Não podemos nos contentar apenas com declarações conjuntas. Temos que tomar medidas conjuntas. Essa é a única maneira de mudar o cálculo e o comportamento de Maduro", completou.

O UOL presenciou, no local, as delegações de Uruguai, Paraguai, Guatemala, Portugal, Espanha, Japão, Comissão Europeia e pelo menos 50 países. Blinken conduziu o debate, ao lado da chanceler do governo de Javier Milei, Diana Mondino.

Fontes diplomáticas de países latino-americanos que estiveram no encontro afirmaram ao UOL que nenhum governo citou a iniciativa de Brasil, México e Colômbia de criar espaços de diálogo entre as delegações.

Tanto o chanceler Mauro Vieira como o assessor da presidência, Celso Amorim, estão em Nova York, para reuniões na ONU. Mas a opção do Brasil foi por não se unir ao grupo. O governo julgou que a iniciativa poderia minar suas possibilidades de manter canais abertos com o governo Maduro para buscar soluções para a crise.

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Reunião em NY sobre situação da Venezuela, com a presença de diversos países; Brasil ficou fora
Reunião em NY sobre situação da Venezuela, com a presença de diversos países; Brasil ficou fora Imagem: BRYAN R. SMITH/AFP

Em declarações à rede CNN, o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, afirmou que "se não houver apresentação dos resultados, não há reconhecimento" do governo Maduro.

"O processo anterior às eleições foi errôneo", disse Petro. "Tudo o que foi falado no México, na Colômbia e em Barbados para que houvesse eleições livres não aconteceu", lamentou.

A crise na Venezuela, porém, ficou de fora do discurso de Lula no púlpito da ONU. Fontes em Brasília confirmaram ao UOL que, em versões preliminares, o tema havia sido incluído. Mas houve uma decisão política de não fazer referência ao impasse em Caracas.

Momentos depois, o presidente americano Joe Biden criticou Nicolas Maduro ao subir ao palco após o brasileiro. Para uma ala dentro do Itamaraty, a Venezuela foi "a grande ausente do discurso". Em versões anteriores da fala de Lula, a crise no país era citada, mas sem uma condenação ao presidente Maduro. A orientação era para que não houvesse, no discurso, nada que justificasse uma ruptura da possibilidade de diálogo.

Venezuela discursa em sala vazia da ONU

Horas antes, o chanceler da Venezuela, Yvan Gil, discursou na Assembleia Geral da ONU em uma sala quase às moscas. Na fala, amplamente divulgada na Venezuela, ele garantiu que a eleição de julho foi "transparente".

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"O povo venezuelano se expressou de forma consciente, pacífica e massiva para eleger com plenas garantias, transparência e liberdade o Chefe de Estado e de Governo da Venezuela para o período 2025-2031", disse.

"O presidente Nicolás Maduro foi reeleito, com apoio claro e esmagador", disse Gil. Segundo ele, foi a oposição que gerou 'violência criminosa que resultou em 27 mortes, centenas de feridos e destruição de patrimônio público e privado'.

Na ONU, as investigações denunciam uma repressão "sem precedentes" por parte do governo Maduro.

Durante a semana, a questão venezuelana esteve presente nas reuniões do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, às margens da Assembleia Geral da ONU.

Conforme o UOL apurou, a situação de Nicolás Maduro esteve sobre a mesa da conversa entre os presidentes Emmanuel Macron e Lula, na última terça-feira em Nova York.

O francês pediu que Lula fizesse uma avaliação da situação em Caracas e sobre quais poderiam ser os próximos passos no país.

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O Brasil insiste sobre a necessidade de que os esforços sejam mantidos para encontrar um espaço para o diálogo com o governo Maduro e com a oposição, mesmo com o exílio do candidato da oposição, Edmundo González, e o aumento da repressão denunciada pela ONU.

Macron, de seu lado, admitiu a surpresa diante da decisão do opositor de deixar a Venezuela e sinalizou que a Europa está trabalhando para tentar entender como lidar com esse novo cenário.

Mas Lula também foi cobrado. Numa reunião organizada pelo Brasil para iniciar uma reação contra a extrema direita, Gabriel Boric, presidente do Chile, cobrou dos movimentos progressistas coerência ao lidar com as violações de direitos humanos quando ocorrem por regimes de esquerda.

"As forças progressistas se veem fragilizadas quando titubeiam", alertou, sinalizando que apoios ou condenações dependem das "cores políticas ou princípios".

"Veja o que fez a direita. Quando houve tentativa de golpe de estado no Brasil e EUA, a direita mundial foi ambígua. O argumento é de que os movimentos progressistas não era claros quando outras violações de direitos humanos ocorriam, às vezes por aliados ideológicos.

"As violações de direitos humanos não pode ser julgados pela cor do ditador ou presidente que viole. Seja Maduro ou Netanyahu. Chame Daniel Ortega ou Putin, seja de onde definam. Temos de defender princípios", disse Boric.

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O Chile passou a condenar de forma explícita o governo de Nicolás Maduro e, nos bastidores, tem criticado a postura do governo brasileiro de não ser mais duro contra o regime em Caracas.

"Temos que defender princípios", disse, num recado velado contra partidos políticos que optam por defender ideologias. "Por vezes falhamos. Não temos a mesma régua para julgar", criticou.

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