Golpe estava em andamento, e anistia seria um crime contra a democracia
Não era apenas o gabinete que era de ódio. O planejamento era repleto de morticínio. Morte de uma República profanada. Morte de Poderes vulgarizados. Uma imagem destruída, ridicularizada. Um futuro sequestrado numa sucessão de sonhos afogados.
O que o inquérito da Polícia Federal revela no caso dos suspeitos de envolvimento numa trama para matar o chefe de Estado eleito é que o Brasil, sob Jair Bolsonaro e seus cúmplices, se transformou numa paródia de uma democracia.
Os documentos revelados nesta terça-feira (19) não são os únicos a apontar neste sentido. Hoje, a Justiça tem cópias do que seria um decreto de estado de sítio, da composição da junta que assumiria, dos planos e até dos locais onde esses debates ocorreram. Os inquéritos reunidos nos últimos meses contam com gravações, confissões e dados de celulares.
Não existe qualquer dúvida de que a intenção era um atentado contra a democracia.
E, de fato, o que vivemos nos últimos anos foi uma operação lúcida e detalhada de desmonte do Estado de Direito. Enquanto a estrutura pouco visível era corroída, o governo Bolsonaro fechou o espaço cívico, desmontou conselhos para a participação da sociedade civil, atacou ativistas, tentou deslegitimar a imprensa profissional e incentivou a violência contra qualquer ator que representasse um controle externo ao seu governo.
Pelo mundo, a estratégia tem sido exatamente a mesma: chegar ao poder usando as armas da democracia e, uma vez no comando, corromper e usar o Estado, desmontar as garantias constitucionais. E matar, se necessário.
Para vencer as eleições, portanto, esses movimentos estão dispostos a moderar o discurso, usar gravata, evitar palavrões e insistir que jogam dentro das quatro linhas. Mas basta olhar seus programas de governo e seu DNA para entender que isso não passa de mais uma estratégia de chegar ao poder.
Achar que a moderação pode vir de uma mudança de discursos ou da publicação de um artigo sobre "democracia" num jornal de grande circulação é ignorar o que de fato esse movimento político pretende realizar, uma vez no comando.
Ou o que estão dispostos a fazer para continuar no poder.
O inquérito da PF é mais uma demonstração clara dos riscos de se normalizar um regime incapaz de atuar pela defesa da democracia e por seus princípios.
Se a ruptura institucional foi evitada, a realidade é que um golpe de Estado em câmera lenta vinha ocorrendo ao longo dos anos de Bolsonaro no poder. E não existe nada que possa indicar que, uma vez que ele volte ao comando, essa operação não seja retomada. Talvez, de forma irreversível.
O golpe era uma realidade e estava em andamento.
Hoje, uma anistia seria um crime contra a democracia.
Deixe seu comentário