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José Luiz Portella

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Alckmin perdeu o "timing", será difícil recuperar o tempo perdido

15.out.2021 - O ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin  - Lucas Borges Teixeira/UOL
15.out.2021 - O ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin Imagem: Lucas Borges Teixeira/UOL

Colunista do UOL

15/01/2022 18h04

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Acertar o tempo correto de agir e tomar decisões é um atributo fundamental de um político.

Normalmente os políticos erram, por afobação. O açodamento é uma característica não só dos políticos, mas dos brasileiros, em geral, somos imediatistas. Queremos tudo rápido, e sempre inventamos um atalho para cortar caminho. Ora funciona bem, ora mal.

Alckmin sempre foi tido como alguém sereno e tempestivo. Em agosto, falou para correligionário que em um mês resolveria seu futuro, saída do partido, novo partido, candidatura. Para poder agregar as pessoas à sua campanha. Desde então, nutria um impulso maior pelas questões nacionais. Já havia governado São Paulo por muito tempo, e desafios novos sempre provocam mais as pessoas.

Foi deixando o tempo passar, e se tornando uma figura-chave no mosaico político nacional. A glória tem seu ônus.

Lula descobriu, provavelmente por sugestão de Haddad, que Alckmin poderia cumprir um grande papel.

Um papel tanto menor, ajudaria dar a chapa um caráter menos extremado, menos de esquerda, não era uma questão matemática de votos. Era se tornar digesto. E, o mais importante para o PT, tirar o maior obstáculo para Haddad se eleger. Este ponto era o expoente.

Alckmin, desejoso dos temas nacionais e enxergando a possibilidade de dar um tempero de união nacional para derrotar Bolsonaro, e chegar à vice-presidência, com o favoritismo de Lula, se comoveu. Este foi o problema. Quando se junta a emoção ao discernimento, se perde a clareza. Mesmo os ponderados são tomados pela emoção.

Estava no cardápio que o PT não abriria mão da candidatura de Haddad para Márcio França e isso obnubilaria o desenho da tese de união nacional contra Bolsonaro, que Alckmin queria defender.

O que se seguiu, também estava escrito nas estrelas: com o empacar do PT, o PSB estancou, e o PT ofertou o Solidariedade de Paulinho como opção. Piorou. Isso foi a comprovação de que o PT não busca união nacional nenhuma, a não ser aquela que ele tenha vantagem em tudo. Um prato feito de sempre.

Nesse ponto, eu já havia falado com vários tucanos "alckmistas" do Interior de SP, e eles repudiavam veementemente a aliança com o maior adversário que tiveram. Na Grande SP, a reação era bem menor, já que alianças desse tipo são mais comuns. Era o momento de Alckmin definir. Postergou.

Atualmente, o desgaste de Alckmin já se deu, e não foi pequeno. Dificilmente ele recupera a imagem que tinha com os tucanos amigos do Interior, e com o eleitorado não-petista de São Paulo todo. Na classe média, azul, da capital, Alckmin perdeu muitos pontos. Ele sabe disso.

Lula soube urdir bem a tecelagem, de modo que agora, só resta a Alckmin aceitar ser vice, porque a volta para a candidatura ao governo do Estado de SP, demonstraria ser uma espécie de segunda opção, e os eleitores já se sentiram feridos.

O pior, se Alckmin supõe que o PT irá permitir que ele seja candidato a presidente, com apoio do partido, na sucessão de Lula, está redondamente enganado. O PT não dá vaza a ninguém, e terá outro candidato se Lula achar que chegou a hora de parar. O que já é muito complicado.

O PSD, que estendeu os braços para Alckmin procura outro candidato e sabe que se concordar com o retorno a candidatura, terá uma perda de força. Sobretudo, porque à direita, o eleitorado que votava em Alckmin e lhe garantia as vitórias contra o PT, vai se dividir decididamente entre Tarcísio de Bolsonaro, e Rodrigo Garcia, que tem muitos prefeitos e um grande arco de alianças formado. Garcia vai se beneficiar muito, ao contrário do que Alckmin gostaria. Não há ação sem trade-off.

Alckmin estava no topo da montanha, podendo escolher quais as tábuas de mandamentos que iria seguir. Trancou-se em copas, e deixou divulgar uma notícia que se incomodava com a contrarreforma trabalhista que o PT anunciara. Ora, isso sempre foi pauta do PT, não há surpresa.

Pareceu um sinal de arrependimento e um motivo para desfazer o noivado. Mas, Alckmin deixou-se levar ao interior da Igreja, e agora é complicado cair fora com os convidados já sentados para a cerimônia.

Lula, esperto, amarrou bem o conúbio e colocou corrente na aliança.

Tudo na política é passível de mudança sensacional, porque o ser humano é uma miríade de comportamentos, e como disse Viktor Frankl em A vontade dos sentidos: "O homem é empurrado por impulsos, mas puxado por valores". Mudar agora e justificar tudo o que fez, será áspero e corrosivo para Alckmin, em termos de valores.

Talvez, no momento, ele deva ouvir a si mesmo, a frase que sempre repete de Santo Agostinho:

Prefiro os que me criticam, porque me corrigem, aos que me elogiam, porque me corrompem.