Falta a Bolsonaro uma noção qualquer de decoro
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Se dependesse dos discursos de campanha, a política do Brasil seria um oásis da ética. O que transforma a vida pública brasileira num deserto da virtude é a insistência com que a realidade estraga as boas intenções. Da boca pra fora, o candidato Bolsonaro era bela viola. Fazia pose de político antissistema. Do governo pra dentro, o presidente Bolsonaro é pão bolorento. Personifica a perversão sistemática.
Ao longo do primeiro ano de governo, Bolsonaro viveu uma experiência delicada: a difícil passagem do discurso para a prática. Nomeou ministros investigados, denunciados e até um condenado. Hoje, convive gostosamente com meia dúzia de auxiliares enrolados. E luta para fazer um governo que melhore a sua biografia, ao mesmo tempo que tem que administrar o drama penal de Flávio Bolsonaro, que quer ocultar as culpas, não conquistar um bom nome.
Bolsonaro quer ser amado por sua simplicidade tosca. É o que se depreende do linguajar de boteco que utiliza para acender suas redes sociais e arrancar palmas da claque que dá expediente defronte do Alvorada. O capitão também quer que a equipe econômica providencie para ele uma posteridade de estadista. Mas não se livra dos constrangimentos diários produzidos por sua própria língua.
No fundo, a instabilidade psicológica de Bolsonaro sinaliza o incômodo do personagem com a constatação de que faz o papel de um obscuro presidente do baixo clero, num governo confuso em que o cardeal é o Paulo Guedes, e cujo epílogo é o PM faz-tudo Fabrício Queiroz.
Num cenário assim, tão paradoxal, faltam a Bolsonaro discernimento e compostura para convencer a sociedade de que há uma noção qualquer de decoro por trás da pose e da faixa presidencial.
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