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Josias de Souza

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Morte é clube democrático e tragicamente injusto

Colunista do UOL

16/05/2021 14h11

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A morte é o clube mais democrático do mundo. Cedo ou tarde, todos serão admitidos como sócios. Mas há uma injustiça hedionda no processo de seleção. Numa época em que a pandemia transforma o cadáver em protagonista, as mortes prematuras parecem ainda mais injustificadas quando confrontadas com as mortes procrastinadas.

Uma morte é uma tragédia. Milhares, uma estatística. Mas o câncer convida à reflexão quando, numa hora dessas, emite sentenças capitais contra gente como o prefeito Bruno Covas e a atriz Eva Wilma. Só a reflexão permite notar que a existência de gente como o humorista Paulo Gustavo não precisaria ter sido encurtada para lembrar que muitos dos mais de 430 mil cadáveres da pandemia não morreram de Covid, mas de falta de vacinas.

Todo mundo nasce sem saber e morre sem querer. O que torna uma pessoa diferente da outra é a forma com ela usufrui do intervalo entre o nascimento e a morte. Bruno Covas foi um político sem espetáculo. Reelegeu-se em São Paulo por conta do apreço que revelou pela ciência e pela moderação. Eva Wilma e Paulo Gustavo foram espetaculares. Uma fazia chorar. O outro, gargalhar.

Morrer também significa, em última análise, um pouco de vocação. Na fila do clube da morte, há vivos tão pouco militantes que temos dificuldades para compreender os critérios da finitude. É como se o destino ignorasse os que têm vocação para a morte, enviando coroas de flores para as pessoas erradas.