Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Orçamento secreto e improviso social distanciam Brasília do Brasil da fome
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À medida que a fome ganha as manchetes, a Brasília da Praça dos Três Poderes vai adquirindo a aparência de um território improdutivo situado num Brasil paralelo. Notícia da Folha menciona os efeitos da conjunção de três flagelos —seca, pandemia e crise econômica— nos hábitos do nordestino.
Morador de Senador Elói, município potiguar com nome de político, o brasileiro Adailton, 52 anos, se emociona ao contar sobre a última vez que levou carne à boca. Deu-se há mais de um mês. Obteve a pata dianteira de uma vaca. Junto com Sebastiana, sua mulher, extraiu alimento desse pedaço da anatomia bovina por 20 dias.
Nesse período, Executivo, Legislativo e Judiciário rodopiavam como parafusos espanados em torno de três temas: o Auxílio Brasil, a PEC dos precatórios e o orçamento secreto.
Versão piorada do Bolsa Família, o Auxílio Brasil serve descaso e improviso a quem precisa de comida. A emenda dos precatórios utiliza o estômago do pobre como álibi para furar o teto de gastos em R$ 106 bilhões.
Câmara e Senado travam agora em Brasília uma briga na qual o brasileiro que passa fome entra com a cara. Arthur Lira, líder do centrão e presidente da Câmara, pega em lanças para destinar parte da verba do calote para o balcão das emendas. Agora pode. Rosa Weber, do Supremo, fechou os olhos.
Afora a aridez da paisagem, o que diferencia o Brasil real do país surreal da Praça dos Três Poderes é o tipo de fome. A fome das autoridades de Brasília é um problema que pode ser resolvido abrindo a geladeira do apartamento funcional. Ou tocando o interfone para a cozinha do palácio.
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