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Josias de Souza

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Além de sair ileso do Jornal Nacional, Bolsonaro esmurra Globo sem tocá-la

Colunista do UOL

23/08/2022 00h38

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Bolsonaro obteve na entrevista ao Jornal Nacional dois feitos. Saiu ileso do embate com William Bonner e Renata Vasconcelos. E executou um golpe inédito no pugilismo. Esmurrou o Grupo Globo sem tocá-lo. Em gestos ensaiados, o capitão sacudiu as mãos abertas diante das câmeras. Exibia na mão esquerda uma cola. Nela, liam-se os nomes de três países —Nicarágua, Argentina e Colômbia— e de uma pessoa: Dario Messer, o "doleiro dos doleiros".

Bolsonaro não precisava de cola para lembrar dos três países que ele inclui na "onda vermelha" que varre o continente. Foram anotados apenas para tornar a cola mais chamativa. Era Messer que o entrevistado desejava realçar, como se convidasse o espectador a passar o nome no Google. Coisa combinada com o filho Carlos Bolsonaro, gestor da engrenagem que industrializa o ódio bolsonarista.

Pilhado na Lava Jato, Dario Messer fez delação premiada em 2020. Disse ter repassado dólares em espécie à família Marinho na década de 1990. Em nota, os proprietários do Grupo Globo negaram ter realizado operações de câmbio no mercado clandestino. Citando-o, Bolsonaro amargaria o contragolpe de um desmentido formal. Exibida sorrateiramente, a maledicência ganhou as redes sociais sem resposta.

Afora o golpe abaixo da linha da cintura, Bolsonaro atravessou os 40 minutos de entrevista desviando dos jabs de Bonner e Renata com as esquivas de praxe: mentiras, meias verdades e manipulações. Convidado a assumir o compromisso de aceitar o resultado das urnas, disse que respeitará, se as eleições forem "limpas". Quer dizer: não tolerará senão a própria vitória. Negou as ofensas a ministros do Supremo, mesmo tendo chamado um de "canalha" e outro de "filho da puta". Fabulou sobre meio ambiente, terceirizou culpas na economia, classificou o golpismo dos seus devotos como "liberdade de expressão", torturou as vacinas e defendeu a cloroquina.

Instado a rever as declarações estapafúrdias sobre a pandemia, Bolsonaro preferiu continuar ignorando as mais de 680 mil autopsias a fazer uma autocrítica. Fustigado por Renata com a imitação de um paciente de covid sem fôlego, o capitão esteva na bica de perder a calma. Conteve o ímpeto.

No geral, Bolsonaro mentiu e desconversou com respeito e sobriedade. Ou seja: soou na bancada do Jornal Nacional como se estivesse completamente fora de si. E ainda alardeia que foi à entrevista sem treinamento! Não disse nada capaz de seduzir multidões de eleitores pobres ou de ex-bolsonaristas indecisos. Tampouco roubou votos de Lula, poupado durante toda a entrevista. Mas é certo que, a despeito dos panelaços, não perdeu votos com a entrevista. Algo que, para um presidente precário, é um grande feito.

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