Potências fazem do Conselho de Segurança da ONU grande circo
No curto intervalo de dez dias, o Conselho de Segurança da ONU rejeitou quatro projetos de resolução sobre o conflito entre Israel e Hamas. Nesta quarta-feira, foram repelidos os dois penúltimos textos. Um, apresentado pelos Estados Unidos, foi vetado por Rússia e China. Outro, esgrimido pelos russos e combatido pelos americanos, não obteve o número mínimo de votos.
Horas antes, o premiê de Israel Benjamin Netanyahu alardeara que nada deterá a invasão da Faixa de Gaza por terra. Aguardada com pavor tétrico desde a chacina em que os terroristas do Hamas executaram 1.400 pessoas em solo israelense, a incursão terrestre adicionará um sem-número de vítimas, sobretudo civis, a uma pilha que já soma mais de 6 mil cadáveres.
Num instante em que o socorro humanitário continua entrando em Gaza num ritmo de conta-gotas, a diplomacia mundial encenou na ONU um espetáculo circense. Nele, os protagonistas americanos se juntaram a coadjuvantes russos e chineses numa exibição de raro talento para o malabarismo verbal e o trapezismo ideológico. O resultado foi um ilusionismo diplomático que favorece o aprofundamento da guerra.
Linda Thomas-Greenfield, a representante dos Estados Unidos, disse ter aproveitado em sua resolução trechos do texto negociado pelo Brasil na semana passada. O mesmo texto que a Casa Branca vetou sob a alegação de que não fazia menção ao "direito de Israel de se defender". Algo que ninguém ignora e que já está previsto na Carta da ONU.
O embaixador da Rússia, Vasily Nebenzya, propôs algo que Vladimir Putin sonega na Ucrânia: o "estabelecimento imediato de um cessar-fogo humanitário duradouro e totalmente respeitado". Disse que o documento americano "não visa salvar civis [em Gaza], mas reforçar a situação política dos Estados Unidos na região". Zhang Jun, da China, declarou que Washington "ignora o fato de que o território palestino está ocupado há muito tempo" por Israel.
Presente no picadeiro da ONU, o ministro das Relações Exteriores de Israel, Eli Cohen, cutucou: "Como Moscou reagiria se grupos terroristas destruíssem toda sua vizinhança?", indagou. "Como Pequim responderia se genocidas decapitassem e assassinassem seus bebês? Acredito que qualquer pessoa no mundo sabe exatamente como vocês responderiam".
O problema desse tipo de espetáculo precário é que trapezistas da ONU dispõem do cinismo como rede de proteção. Não contam com redes protetoras os cerca de 200 reféns que o Hamas arrastou para dentro de Gaza e os mais de 2 milhões de habitantes do território sitiado. Para essa gente, que não se confunde com terroristas bárbaros nem com governantes ferozes, a inação da ONU assegura uma ração diária de bombas, tiros, irracionalidade e desumanidade.
Mauro Vieira, o chanceler brasileiro, disse que cogita articular uma quinta resolução humanitária. Terá que guerrear contra o relógio, pois o prazo de validade da presidência rotativa do Brasil no Conselho de Segurança expira no final do mês. Numa escala de zero a dez, a chance de aprovação é de menos onze.
Não é de hoje que o principal colegiado da ONU revela-se inútil. A diferença é que, dessa vez, as performances desenrolam-se debaixo de uma lona cada vez menos invisível. Há na comunidade internacional uma carência de decência e um déficit de vozes com autoridade moral para falar sobre paz.
24 comentários
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Ezequias de Lima
Toda perda humana é irreparável. No total, até agora, são 5.886 palestinos assassinados e 1.403 vítimas israelenses. Com a invasão por terra esse número vai subir muito mais. A pergunta é: qual é o número de vítimas palestinas que Israel acha suficiente para suspender a invasão?
Claudio Lourenco Rocha
Sabe o que os jornalões não fazem: E dar espaço para os usuarios do transporte coletivo se manifestarem sobre esse serviço mais que necessario, e que tanto maltrata o povo da capital. Enquanto o prefeito vai ao desespero para tentar se reeleger, o transporte publico píorou muito, mas muito mesmo, vide as linhas que serve região Ipiranga, parque bristol, Saverio, liviero etc. Um inferno que não esqueceremos na eleição do ano que vem
Joao Gilberto Candido
O Conselho de Segurança, assim como a própria ONU em sua maior parte, não serve para absolutamente nada e é constantemente desrespeitada pelas potências. E não consigo entender pq o Brasil quer tanto entrar nesse troço. E sim, Israel e o Hamas/Hezbollah farão o que quiserem na Faixa de Gaza, tá tudo liberado pelos poderes de veto!!!