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Chefe do PCC sequestrado por policiais ficou em cativeiro no Deic, diz MP
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O prédio do Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais) foi usado durante uma hora como cativeiro de Bruno Fernando de Lima Flor, 37, o Armani, chefe do braço jurídico nacional do PCC (Primeiro Comando da Capital), sequestrado em 24 de julho de 2020 por dois policiais. As informações fazem parte de uma investigação do MPE (Ministério Público Estadual).
Os investigadores Carlos Henrique dos Santos, 52, e José Luís Alves, 55, foram presos no último dia 18. A dupla do departamento de elite da Polícia Civil também é suspeita de ter usado por ao menos dois anos um carro Volkswagen Gol furtado para fazer diligências e sequestrar integrantes do crime organizado.
Rubens dos Santos Júnior, advogado dos policiais presos, foi procurado pelo UOL e disse que oportunamente vai apresentar à reportagem os esclarecimentos necessários que vão provar a inocência dos investigadores Santos e Alves.
De acordo com as investigações, os 60 minutos em que Armani passou no prédio do Deic foi o tempo que o PCC levou para arrumar a primeira parcela de R$ 30 mil exigidos pelos policiais para libertar o preso. Segundo o MPE (Ministério Público Estadual) duas advogadas mandatárias da facção negociaram o pagamento da propina.
A princípio, os investigadores pediram R$ 300 mil. Depois concordaram em reduzir a oferta para R$ 75 mil. Uma advogada de 29 anos, de São Paulo, a mando de sua sócia, uma advogada de 38 anos, do Rio de Janeiro, levou o dinheiro. O MPE pediu a prisão preventiva das duas, mas a Justiça negou.
A extorsão mediante sequestro praticada pelos dois investigadores foi descoberta porque Armani acabou preso em 18 de novembro de 2020, durante a Operação Fast Track, deflagrada pelo MPE para desarticular o braço jurídico nacional do PCC.
Os aparelhos de telefone celular de Armani e da mulher dele foram apreendidos e nos equipamentos havia mensagens e áudios com comentários sobre o sequestro do preso. O MPE também teve acesso às imagens de câmeras de segurança da residência onde o casal morava, na zona leste da capital.
As gravações mostram Santos e Alves chegando à casa de Armani no Audi dele e em seguida descendo do veículo. Um Volkswagen Gol, locado de maneira fraudulenta em outubro de 2018 no Rio de Janeiro, vem logo atrás, ocupado por mais dois policiais. A vítima do sequestro permaneceu algemada no próprio carro. Os investigadores aparecem nas imagens tentando abrir o portão do imóvel.
Antes do arrebatamento, os quatro ficaram de campana no Gol perto da casa de Armani. Assim que ele saiu com o Audi, os policiais o seguiram. O chefe do PCC parou para abastecer o carro em um posto de gasolina e foi rendido.
Falsa ocorrência
Sempre segundo as investigações, Armani foi colocado no Audi e levado até a casa dele. Os policiais sabiam que ele receberia R$ 1,5 milhão do PCC e por isso entraram no imóvel sem mandados de busca, apreensão e prisão. Os outros dois policiais seguiram para o mesmo endereço no Gol.
De acordo com o MPE, para justificar a prisão ilegal de Armani, os investigadores providenciaram o registro falso de um boletim de ocorrência de averiguação de veículo. Uma escrivã da 2ª Delegacia de Crimes contra o Patrimônio do Deic se encarregou de fazer isso. A Justiça também negou a prisão dela.
Depois que Armani foi conduzido para o prédio do Deic, a mulher dele ligou para várias pessoas. Ela também telefonou para um advogado particular e pediu para ele ir até a 2ª Delegacia de Crimes Contra o Patrimônio do Deic, onde os investigadores trabalhavam.
Na ligação para o advogado, a mulher de Armani diz para o defensor, às 16h01 do dia 24 de julho de 2020, que o marido e os policiais haviam saído da residência do casal 10 minutos antes. Às 17h03 do mesmo dia, a advogada de São Paulo ligava de volta para ela e confirmava o acerto com os policiais.
As ligações indicam que Armani ficou ao menos uma hora em cativeiro no prédio do Deic. O MPE investiga os outros dois policiais que ocuparam o Gol no trajeto até a casa de Armani e também apura se dois delegados —aos quais os investigadores eram subordinados— tinham conhecimento do sequestro e do uso carro furtado.
O Gol usado no sequestro do chefe do PCC tinha sido alugado na Localiza, no Rio de Janeiro, em 26 de outubro de 2018, e jamais foi devolvido. Havia uma queixa de furto do carro registrada em 12 de março de 2019 na cidade de Extrema, em Minas Gerais.
Foi 30 vezes com o carro para casa
Investigações conduzidas pelo MPE apuraram que o Gol furtado foi usado pelos policiais Santos e Alves em 6 de julho de 2020 durante a prisão de Bruno Dias da Silva, 36, em Santos, acusado de ter sido flagrado com 78 tijolos de cocaína.
Os investigadores também utilizaram o Gol em 30 de julho de 2020, em São José dos Campos, Vale do Paraíba. Na ocasião dois homens foram presos. Um deles, Marcus Santos Cardoso, 41, era apontado como integrante de facção criminosa e foragido da Justiça.
O MPE pesquisou o sistema paulista de monitoramento de câmeras de trânsito e descobriu que o investigador Alves usou o Gol furtado pelo menos 30 vezes no trajeto para a casa, nas imediações do bairro da Lapa, zona oeste da capital.
Câmeras da concessionária Ecovias também filmaram o carro em 2019 e 2020, na rodovia dos Imigrantes, sentido Baixada Santista. O veículo foi multado uma vez no Guarujá e outra em São José dos Campos.
Em São Paulo, não havia queixa de furto nem sinal de alerta sobre o Gol usado pelos investigadores. Porém, misteriosamente, o carro foi abandonado em uma via pública em 22 de abril deste ano. Um funcionário da Localiza foi ao 5º DP de São Bernardo do Campo comunicar o encontro do veículo.
A suspeita do MPE é a de que os policiais do Deic abandonaram o Gol furtado para eliminar provas. Alves e Santos foram indiciados por extorsão mediante sequestro, abuso de autoridade, associação criminosa e receptação. O envolvimento do funcionário da Localiza com os investigadores não está descartado.
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