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PCC começou no atacado da cocaína após viagem de membro à Bolívia em 2007
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A viagem de Vagner Roberto Raposo Olzon, 49, o Fusca, ao Paraguai e Bolívia em meados de 2007, a mando do PCC (Primeiro Comando da Capital), marcou o início do processo de internacionalização da maior facção criminosa do Brasil no mercado das drogas.
A ida do emissário aos países vizinhos da América do Sul teve como objetivo a negociação do fornecimento mensal de uma tonelada de cocaína, além de armas e de explosivos para a "família PCC".
Os detalhes da viagem de Fusca à Bolívia e ao Paraguai foram narrados por ele mesmo em uma carta de oito páginas escrita para a liderança do PCC presa à época na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau (SP). A correspondência, no entanto, não chegou aos destinatários.
Esta é uma das histórias reveladas na segunda temporada da série documental "Primeiro Cartel da Capital", que estreou ontem em todas as plataformas do UOL. Trata-se de uma produção do Núcleo Investigativo do UOL e de MOV.doc, a produtora de documentários do UOL, e tem novamente direção do documentarista João Wainer.
Carta interceptada pela Rota
A carta foi apreendida em 29 de fevereiro de 2008, quando Fusca e o comparsa Christian Francisco de Souza foram presos por policiais militares da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) na zona norte de São Paulo. Com a dupla, os PMs disseram ter apreendido R$ 674.633,00 e 2 kg de cocaína.
Na carta, Fusca diz que chegou a Corumbá, em Mato Grosso do Sul, num sábado à noite, e que seu primeiro contato foi com o "irmão" Velhote. Ele menciona que foi orientado a se encontrar com outro faccionado, conhecido como "irmão Baía".
No dia seguinte, ele e Baía atravessam a fronteira para a Bolívia. Fusca é apresentado a Miguel, um traficante de drogas muito conhecido na cidade de Porto Quijaro. O brasileiro escreve na correspondência que Miguel é filho de Dom Eduardo, um homem com muita influência na política daquele país.
Segundo Fusca, Dom Eduardo fez uma ligação telefônica para a base policial da fronteira e conseguiu permissão para o emissário do PCC ficar por 90 dias na Bolívia. Na segunda feira, eles viajaram de avião para Santa Cruz de La Sierra.
Encontro com Capilo
Dessa vez, Fusca foi recepcionado pelo narcotraficante paraguaio Carlos Alberto Caballero, o Capilo. Todos foram para a casa do "irmão" Velhote. Enquanto eles conversavam, chegou de repente o "irmão" William. Este último levou o grupo para a mansão dele.
Fusca deu detalhes ao anfitrião sobre as ações do PCC.
Contou como a facção investia o dinheiro - ilícito ¬- na compra de veículos (pé de borracha), ajuda a parentes de presos (cestas básicas) e até na contratação de advogados (sintonia dos gravatas) para defender os interesses jurídicos da organização.
Ambos também conversaram sobre drogas e acertaram o fornecimento de uma tonelada de cocaína por mês e a venda de fuzis para o PCC. William disse a Fusca que também poderia arrumar explosivos plásticos e indicar inclusive um conhecido dele especialista em fabricar bombas.
O acordo do PCC com os criminosos da Bolívia e do Paraguai foi selado naquela reunião. Era o primeiro passo para a internacionalização da organização criminosa. A cúpula da facção presa na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau ficou satisfeita com o resultado da viagem de Fusca.
Dois anos depois, em 27 de dezembro de 2009, Capilo foi preso junto com o narcotraficante Jarvis Chimenes Pavão, chamado de "rei da fronteira", também acusado de integrar o PCC. Ambos foram presos na cidade paraguaia de Concepción e acabaram extraditados para o Brasil anos depois.
Presença na fronteira
O PCC já contava naquela época com vários faccionados no Paraguai e na Bolívia. Alguns estavam presos e outros em liberdade. Anos depois da prisão de Pavão, Jorge Rafaat assumiu o comando do tráfico de drogas na região de fronteira.
Rafaat foi assassinado com 16 tiros de fuzil e metralhadora calibre 50 em Pedro Juan Caballero, na fronteira com Ponta Porã, em junho de 2016. Segundo investigações da polícia paraguaia, ele foi morto a mando do PCC porque também negociava drogas com o CV (Comando Vermelho) do Rio.
Depois do assassinato de Rafaat, as facções criminosas PCC e CV romperam uma aliança de 23 anos e passaram a ser inimigas. O conflito entre as duas organizações teve reflexos nas prisões brasileiras e deixou saldo de dezenas de detentos mortos nas regiões Norte e Nordeste do Brasil.
O PCC assumiu de vez o controle do tráfico de drogas nas áreas de fronteira com Bolívia e Paraguai. A internacionalização da facção paulista já estava consolidada. Os negócios da organização se expandiram e a exportação de cocaína para a Europa e África passou a ser a principal atividade do grupo.
Narcotraficantes ligados ao PCC, como André de Oliveira Macedo, o André do Rap, e Anderson Lacerda Pereira, o Gordão, entre outros, foram apontados pela Polícia Federal como alguns dos principais exportadores de cocaína da facção paulista para grupos mafiosos europeus.
Ambos estão foragidos. A PF suspeita que eles e outros integrantes do primeiro escalão do PCC estão refugiados na Bolívia e de lá continuam comandando toda a logística, desde a produção, distribuição e exportação de cocaína para a Europa via portos brasileiros.
Rede Narcosul
Especialistas em segurança pública chamam o PCC hoje de "Narcosul", a rede criminosa criada no Brasil e países vizinhos da América do Sul. Outras autoridades classificam a facção como o maior cartel de drogas da região, capaz de lavar de bilhões de reais por ano com a exportação de cocaína.
Fusca teve participação fundamental nesse processo de internacionalização do PCC. Porém, logo depois de ser preso, ele foi excluído da organização por razões até hoje não explicadas. A Justiça Federal de São Paulo o condenou a 19 anos e oito meses de prisão.
O emissário da facção paulista ao Paraguai e Bolívia cumpriu pena em presídios do estado sem a presença de integrantes do PCC. Segundo a Secretaria Estadual da Administração Penitenciária, Fusca estava recolhido em um presídio de Sorocaba e saiu em liberdade em 21 de agosto de 2019.
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