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Há interesse público em novas conversas da Lava Jato divulgadas pelo STF

Deltan Dallagnol e Sergio Moro - Fabio Rodrigues Pozzebom/Antonio Cruz/Agência Brasil
Deltan Dallagnol e Sergio Moro Imagem: Fabio Rodrigues Pozzebom/Antonio Cruz/Agência Brasil

Colunista do UOL

01/02/2021 22h07

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Há interesse público na divulgação de novas conversas dos integrantes da Lava Jato que foram apreendidas na Operação Spoofing, deflagrada em junho de 2019 pela Polícia Federal quando Sergio Moro era ministro da Justiça do governo Bolsonaro. Nesse contexto, agiu corretamente o ministro do STF Ricardo Lewandowski ao liberar novos diálogos e mais detalhes das trocas de mensagens via Telegram.

O ex-juiz e ex-ministro da Justiça Sergio Moro repetiu a mesma argumentação sem sentido da época da Vaza Jato. Disse não reconhecer a autenticidade das conversas. Mas declarou que, se forem verdadeiras, não configurariam crime. Afirmou ainda que não deveriam ser divulgadas porque foram obtidas ilegalmente por um hacker. Moro não se lembrou de mencionar que a PF apreendeu o material e fez perícia.

Moro foi o juiz que divulgou, em março de 2016, um grampo ilegal de uma conversa entre o ex-presidente Lula e a então presidente Dilma Rousseff. A atitude ilegal enfraqueceu o governo Dilma e abriu caminho para o impeachment, impedindo a posse de Lula na Casa Civil. Como justificativa, Moro afirmou na época que o povo tinha o direito de saber o que poderosos fazem à sombra. Ora, o mesmo raciocínio vale para as mensagens dos integrantes da Lava Jato.

Se formos usar os critérios adotados por Moro na Lava Jato, ele poderia ser enquadrado como chefe de uma organização criminosa que combinou um crime com um operador. O então coordenador da força-tarefa da Lava Jato, o procurador da República Deltan Dallagnol, seria uma espécie de encarregado de cuidar do Departamento de Operações Estruturadas da Lava Jato, obedecendo ordens e orientações do comandante da Orcrim.

É normal um juiz orientar acusadores a obter provas e adotar estratégias contra a defesa? Em ditaduras, sim. Não nas democracias.

A Vaza Jato, série de reportagens com base no arquivo obtido pelo "The Intercept Brasil", já havia exposto a corrupção do processo judicial que ocorreu na Lava Jato. Liberado pelo ministro Lewandowski, esse novo lote de conversas entre integrantes da operação deixa essa corrupção mais evidente.

Além de Moro, integrantes da Lava Jato pedem que a privacidade deles seja preservada. Têm razão neste ponto. Conversas de foro íntimo e da esfera de relações privadas devem continuar em segredo, mas a sociedade brasileira tem o direito de conhecer as mensagens sobre o método de investigação e julgamento da Lava Jato, operação que mudou os rumos da História do país.

A jornalista Monica Bergamo publicou nesta segunda uma reportagem com a decisão de Lewandowski de liberar 50 páginas de conversas entre Moro e procuradores da Lava Jato. Leia e não vomite, se for capaz.

Corrupção do processo judicial é o nome do que fizeram Moro, Dallagnol e demais procuradores da Lava Jato. De propósito, interferiram no processo político, tramaram o resultado de um julgamento, facilitaram um golpe parlamentar, guindaram Bolsonaro ao poder e afundaram a economia ainda mais.

A corrupção do Judiciário é a pior que pode existir numa democracia, porque é a este poder que os cidadãos recorrem para preservar os seus direitos e punir crimes. O Judiciário é o último guardião de uma cidadania plena.

A Lava Jato quis ter orçamento próprio, apropriando-se de verba bilionária vinda dos EUA. Fez contrapontos ao Executivo e ao Legislativo como se estivesse acima da Constituição. Deu lições de moral e ética à sociedade enquanto quebrava a lei processual penal.

Antes da Vaza Jato, estava claro que havia manipulação de boa parte da imprensa. Com a Vaza Jato, ficou evidente que rolava um jogo combinado. Os novos detalhes liberados por Lewandowski deixam certo jornalismo muito mal na foto. Houve cumplicidade mesmo. Não tem autocrítica que repare isto.