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Kennedy Alencar

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Volta de Queiroga mostra que reconvocar pode ser perda de tempo e foco

8/junho/2021 - Marcelo Queiroga, ministro da Saúde, presta novo depoimento à CPI da Covid no Senado - DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO
8/junho/2021 - Marcelo Queiroga, ministro da Saúde, presta novo depoimento à CPI da Covid no Senado Imagem: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO

Colunista do UOL

08/06/2021 12h23

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O segundo depoimento do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, mostrou que a CPI da Pandemia deve ter cuidado com reconvocações. Elas podem ser perda de tempo e foco porque os depoentes tendem a repetir as mesmas mentiras e falas evasivas.

É exatamente isso o aconteceu no retorno de Queiroga à CPI. Ele contribuiu pouco para responsabilizar o presidente Jair Bolsonaro, autoridade que deve estar no foco da comissão por dar uma resposta negligentemente homicida que resultou em mortes e infecções que poderiam ter sido evitadas. Mais gente morreu e adoeceu por culpa do presidente da República.

Na volta à CPI, Queiroga lançou dúvida sobre a eficácia da CoronaVac, uma irresponsabilidade. É criminoso falar isso no atual quatro pandêmico, porque desestimula as pessoas a se imunizar e a tomar a segunda dose.

Por agir assim, Queiroga é cúmplice do genocídio em curso porque endossa o negacionismo do presidente ao se comportar como um fantoche. Ele chegou ao cúmulo de dizer que foi o responsável pelo veto à entrada da médica Luana Araújo na Secretaria Especial de Enfrentamento da Covid-19.

Em depoimento à CPI, Luana foi clara. Disse que Queiroga lhe contou que seu nome não fora aprovado pela Casa Civil. Nesta terça, o ministro deu outra versão. Afirmou que foi decisão dele não efetivar Luana Araújo. Mentiu. Ele foi desautorizado por Bolsonaro, mostram fatos notórios.

Para não perder o cargo, Queiroga repetiu a estratégia de Eduardo Pazuello, seu antecessor no Ministério da Saúde. Ambos procuraram isentar Bolsonaro ao dizer que não receberam orientações do presidente para não comprar vacinas, no caso de Pazuello, ou vetar uma auxiliar já anunciada, situação de Queiroga.

Ele disse que "não houve óbices formais" no caso de Luana Araújo. Ora, essa resposta equivale ao "não houve ordem direta" do Pazuello.

O papel de ministro de Estado é orientar o presidente. É preciso ter a capacidade de contrariar o chefe para ser leal às instituições e à Constituição. Um ministro fantoche presta desserviço ao país. Pazuello e Queiroga agem como fantoches e também são responsáveis por agravar a tragédia da pandemia no Brasil.

Ao falar de tratamento precoce, cloroquina e ivermectina, Queiroga voltou a jogar na confusão. Repetiu a ladainha da divisão na comunidade médica. E afirmou: "Essas medicações não têm eficácia comprovada".

É mais do que isso. Não há divisão na ciência. Estudos já provaram que esses medicamentos não funcionam contra a covid-19 e podem fazer mal se tomados. Com quase 500 mil mortos por covid, não dá mais para um ministro da Saúde ficar com conversas negacionistas sobre cloroquina e ivermectina.

Queiroga também manipulou dados sobre vacinas, usando números absolutos e não relativos. Disse que o Brasil estava entre os 5 países que mais distribuíram imunizantes. Isso se deve ao tamanho da população.

Levando em conta números relativos, o Brasil está bastante atrasado na campanha de vacinação. Imuniza a conta-gotas porque Bolsonaro e auxiliares desprezaram a compra antecipada de vacina e lançaram dúvidas sobre a eficácia dos imunizantes.

Há mais de dois meses no ministério da Saúde, Queiroga jogou a conta da segunda onda de covid a uma nova cepa. Mentira. É culpa da resposta de Bolsonaro. O ritmo de vacinação diminuiu em maio na comparação com abril, período do ministro na pasta. O grande feito de Queiroga foi desconvidar Luana Araújo por ordem de Bolsonaro.

Renan Calheiros adotou abordagem mais dura com Queiroga do que no primeiro depoimento. Mas o ministro repetiu o discurso mentiroso do presidente e dos senadores negacionistas. Ele abusou das meias-verdades, confirmando que não está à altura do cargo que ocupa e que sua preocupação é apenas se manter no cargo.

O cúmulo da sabujice foi dizer que não era "censor do presidente da República" ao comentar o fato de Bolsonaro continuar a sabotar medidas de proteção no período em que Queiroga está no ministério. "O presidente da República não é julgado pelo ministro da Saúde", disse, negando-se a avaliar o comportamento público de Bolsonaro na pandemia.

Queiroga adotou tom mais duro no segundo depoimento do que no primeiro. Vamos ver ao longo do dia como ele se sairá diante de outros senadores que conseguem arguir de modo mais eficiente do que Renan, que foi bem ao tirar o ministro da zona de conforto.

Brasil não tem ministro da Saúde

Por volta das 14h, Queiroga aproveitava o show de fake news e desinformação que é sempre proporcionado pelo senador Luiz Carlos Heinze (PP-RS) na CPI da Pandemia. "A questão do chamado tratamento precoce precisa ser pacifica", disse Queiroga, dando seriedade ao que não merece crédito.

Um dos melhores momentos do depoimento ocorreu quando o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) disse que Queiroga não era ministro da Saúde por não se opor ao maior difusor do vírus no país, o presidente da República. Tasso acertou. Queiroga é um oportunista.

"A maior oportunidade da minha vida quem me deu foi o presidente Bolsonaro", confessaria à senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA). Foi um momento de transparência para justificar por que é subserviente a Bolsonaro. Ele é carreirista e despreparado, características que o qualificam para ser ministro de Bolsonaro. Queiroga está à altura do presidente.

"Eu faço a minha parte, senadora", disse Queiroga a Eliziane Gama. Outra mentira. Não faz. A omissão e covardia do ministro no cargo agravam a pandemia.

Eduardo Girão (Podemos-CE) repetiu o tradicional figurino negacionista. Ao lado de Heinze, ele é um dos maiores difusores de desinformação na CPI. A imprensa não pode levar esses senadores a sério no debate público. Não há dois lados com argumentos respeitáveis. Existe o lado da ciência. E tem o lado do obscurantismo, no qual estão juntos Bolsonaro, Queiroga, Pazuello, Heinze, Girão e outros senadores negacionistas. Eles agravam a pandemia e são todos cúmplices do presidente.

Conselho de Ética

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) anunciou que entrará com representação no Conselho de Ética contra o colega Heinze por repetir mentiras na CPI. Vieira está certo. A CPI não pode ser palco de desinformação. Além de Heinze, Girão também merece responder ao Conselho de Ética por desinformação à opinião pública. É preciso enfrentar os senadores negacionistas.