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Kennedy Alencar

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Oposição deveria reeditar "Diretas Já"; Bolsonaro sai mais fraco dos atos

Colunista do UOL

07/09/2021 17h02

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No Brasil de hoje, os democratas precisam separar a tática eleitoral da tática política. Os candidatos a presidente têm todo o direito de continuar com suas aspirações pessoais para as eleições de outubro de 2022. No entanto, todos os candidatos que se opõem ao presidente Jair Bolsonaro deveriam se unir numa campanha nacional para evitar uma ruptura democrática.

Lula (PT), Ciro Gomes (PDT), os tucanos João Doria e Eduardo Leite e outros postulantes ao Palácio do Planalto deveriam firmar um pacto contra as ameaças de golpe do presidente. Esses políticos e seus partidos poderiam dar início a uma campanha de mobilização para realizar uma grande manifestação em defesa da democracia. Poderia acontecer noutro feriado nacional, como 15 de Novembro (Proclamação da República).

Os democratas deveriam reeditar um movimento semelhante ao das "Diretas Já". No fim da ditadura, políticos de diferentes partidos fizeram uma campanha conjunta com comícios pelo país a fim de defender a volta de eleições diretas para presidente da República.

A emenda constitucional que permitiria a realização de eleições diretas foi derrotada no Congresso, mas o movimento selou de vez o fim da ditadura militar e foi determinante para o restabelecimento da democracia a partir de 1985. Tancredo Neves acabou sendo eleito no Colégio Eleitoral com uma ampla aliança que derrotaria a ditadura, incluindo antigos apoiadores do golpe de 1964.

Em seus dois discursos neste 7 de Setembro, Bolsonaro voltou a cometer crimes de responsabilidade e mostrou que morre de medo de ser preso. Nos atos, também houve crimes comuns, como o desrespeito às regras sanitárias na pandemia. A maioria dos apoiadores do presidente não usou máscara nas manifestações. Nos atos da oposição, era raro ver alguém sem a proteção facial.

Ao falar em Brasília, o presidente ameaçou novamente o Supremo Tribunal Federal quando disse que o presidente da instituição, Luiz Fux, deveria enquadrar ministros sob pena de sofrer retaliação. Ele não citou Alexandre de Moraes, mas o alvo era o ministro que conduz inquéritos que têm prendido aliados de Bolsonaro. Moraes toma medidas concretas contra o golpismo do presidente e seus apoiadores.

"Ou o chefe desse Poder enquadra os seus ou esse Poder pode sofrer aquilo que não queremos. Nós valorizamos e reconhecemos o Poder de cada República. Nós todos aqui na Praça dos Três Poderes juramos respeitar a nossa Constituição. Quem age fora dela se enquadra ou pede para sair", discursou Bolsonaro, de manhã em Brasília.

De tarde, em São Paulo, o presidente foi mais agressivo e claro. Mencionou o nome de Alexandre de Moraes e o chamou de "canalha". Repetiu seu roteiro tradicional de teorias conspiratórias e fake news. Pediu voto impresso, apesar de o Congresso ter enterrado o assunto. Disse que não aceitará uma "farsa" em 2022.

As palavras de Bolsonaro foram criminosas. O presidente do STF, Luiz Fux, e os presidentes da Câmara e do Senado, respectivamente Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), têm o dever de responder às ameaças do presidente.

Bolsonaro sabe que vai perder na urna no ano que vem e que um golpe de Estado seria a única forma de acobertar os seus crimes. "Digo aos canalhas que nunca serei preso", falou em São Paulo. O presidente tem motivos para estar preocupado. Diante de tantos crimes comuns e de responsabilidade, a cadeia é um provável destino.

Em São Paulo, Bolsonaro afirmou que o público na avenida Paulista seria a prova de que ele teria apoio popular para emparedar as instituições. Não tem. O presidente passou o último mês fazendo convocações diárias para os atos golpistas deste 7 de Setembro. Levou milhares às ruas, mas em menor número do que se esperava diante do esforço para arregimentar caravanas de apoiadores. Empresários, pastores evangélicos e deputados que fizeram carreira policial investiram pesadamente para tentar encher as ruas.

Em Brasília, o ato ficou distante de lotar a Esplanada dos Ministérios. Na cidade de São Paulo, a avenida Paulista teve milhares de pessoas, mas não foi um protesto comparável às maiores manifestações da história recente. No Rio de Janeiro, o miliciano e operador de rachadinhas Fabrício Queiroz enfeitou a farsa golpista ao ser tratado como celebridade em Copacabana.

Diante do investimento político e financeiro de Bolsonaro e seus aliados, as manifestações não tiveram o peso que o presidente esperava alcançar. A estratégia de demonstração de força deu errado e o isolará ainda mais politicamente.

Ao longo da tarde, houve reações de partidos com críticas ao comportamento do presidente e o impeachment voltou a ser tema das conversas, apesar da dificuldade real de ocorrer. No jornalismo, os democratas de pandemia subiram ainda mais o tom das críticas àquele que ajudaram a chegar ao poder.

Em resumo, Bolsonaro sai mais fraco deste 7 de Setembro.

O presidente tem o apoio de uma minoria barulhenta que não usa máscara e prega o fim da democracia. Mas a maioria do país reprova o presidente e suas propostas regressivas. Pesquisas mostram queda de popularidade do governo e provável derrota eleitoral em outubro do ano que vem.

Em resposta à ameaça golpista que será o samba de uma nota só de Bolsonaro até 2022, os democratas deveriam ir às ruas mostrar que são maioria e que o Brasil não aceitará o retrocesso desejado pelo presidente e seus fascistas. Políticos como Lula, FHC, Ciro Gomes, Marcelo Freixo, Rodrigo Maia, Doria e outros deveriam subir juntos num palanque e gritar bem alto: "Ditadura nunca mais!".