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Leonardo Sakamoto

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Dez razões por que o Brasil de Bolsonaro lidera o mundo em mortes diárias

Colunista do UOL

18/03/2021 20h13

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"A gente pergunta aí, qual país do mundo que está tratando bem a questão do covid? Aponte um. Todo local está morrendo gente", afirmou Jair Bolsonaro a um rebanho de seus seguidores, nesta quinta (18). Fácil: Nova Zelândia, Austrália, China, Coreia do Sul. Em muitos lugares está morrendo gente, mas não tanto quanto aqui.

Foram 2.659 mortes registradas em 24 horas, com uma média móvel de 2.096 por dia na última semana, um novo recorde, segundo dados do consórcio de veículos de imprensa. No total, 287.795 perderam a vida.

O presidente finalmente lidera o mundo - mas em número de óbitos por dia por covid-19. Numa contagem da Organização Mundial de Saúde (OMS), que mostrava o Brasil com 2841 mortes em 24 horas, os demais "competidores" estavam bem longe de nós: Estados Unidos (993), Rússia (460), Itália (431), Polônia (356), Ucrânia (267), França (236), Alemanha (227), República Tcheca (215), Hungria (207), Argentina (200) e México (175).

Bolsonaro quer fazer crer que a avalanche de críticas contra ele é injusta, uma vez que ninguém poderia ser culpado de tanta coisa ruim. É modesto. Graças às decisões que tomou e às que deixou de tomar, somos a principal ameaça sanitária global neste momento. Vejamos o porquê:

1) Hospitais estão em colapso. Vai morrer muito mais gente porque não há vagas suficiente nas UTIs, nem remédios para intubação e sedação, fornecimento de oxigênio ou profissionais de saúde. Nem adianta ter dinheiro para pagar: não há vagas.

2) Especialistas apontam que é hora de fechar tudo. Governadores e prefeitos retardam o lockdown, pois temem pedrada de empresários, mas também mandar o povo para casa sem auxílio emergencial. O que pode flopar o bloqueio ou provocar convulsão social por fome.

3) Bolsonaro não renovou o auxílio na virada do ano. Depois, Paulo Guedes gastou tempo tentando trocar a aprovação do benefício pela possibilidade de reduzir a grana de saúde e educação, o que atinge os pobres. O auxílio será uma merreca entre R$ 150 e R$ 375, que não dá para a cesta básica.

4) O governo demorou também para renovar o programa que permite empresas cortarem jornada ou suspenderem contratos, garantindo aos trabalhadores com carteira assinada um benefício emergencial. Sem isso, muitos continuam indo ao trabalho com medo de perder o emprego.

5) O Ministério da Saúde não renovou os repasses para garantir leitos de UTI extras. Com isso, Estados não conseguiram reativar hospitais de campanha ou se preparar para a avalanche de doentes. Repasses só começaram a ser autorizados quando mortes batiam recordes.

6) Trens e ônibus lotados continuam funcionando como um caldeirão de sopa de variantes de covid. É urgente aumentar a frota para reduzir a ocupação e obrigar o poder público e empresários a darem máscaras N95/PFF2 para reduzir o contágio.

7) Abundam em unidades de saúde quem confiou na balela do "tratamento precoce". Muitos ignoraram o isolamento social, acreditando em charlatães que dizem que tomar vermífugo resolve. Agora, ocupam leitos de quem não fez a mesma bobagem.

8) O SUS consegue vacinar 2 milhões por dia, mas não faz isso porque o governo não comprou vacina o suficiente em 2020. Em maio, os EUA estarão vacinados. A gente, em 2022. Até lá mais mortes e mais perdas econômicas.

9) O presidente estimula pessoas a voltarem à normalidade, defendendo que a melhor vacina é pegar o vírus e diz que quarentenas não funcionam. Mas elas foram imperfeitas porque o governo depôs contra. Mesmo assim, são preferíveis quarentenas e lockdowns ruins do que isolamento nenhum, pois salvam vidas.

10) Parte da população, obrigada a trabalhar, cansada da longa pandemia ou acreditando que são invencíveis, afrouxou as medidas de isolamento nesta segunda onda. O problema é que, circulando por mais tempo, o vírus evolui para variantes mais infecciosas. E a tendência é que evolua ainda mais.