Leonardo Sakamoto

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Opinião

Está com calor? Calma que vai piorar com a Amazônia seca e mais inflamável

Você está passando mal com a onde recorde de calor que atinge boa parte do país? Pois isso não é nem de perto o que o futuro nos aguarda com a mudança do clima na Amazônia somada a anos de destruição. Dados recentes comprovam que a floresta está ficando mais inflamável e pode causar uma catástrofe não apenas aos 28 milhões de habitantes da região, mas ao resto do país. E do mundo.

Esqueçam o terraplanismo de Bolsonaro, que repetia à exaustão que "a Amazônia, por ser uma floresta úmida, não pega fogo". Criminosos com latas de óleo diesel transformam regularmente a mata em pó no tempo seco. Como no Dia do Fogo, em 10 de agosto de 2019, quando produtores rurais articularam um incêndio simultâneo em vários pontos da Amazônia com a anuência de Jair.

Por mais que a gestão de Marina Silva tenha conseguido reduzir em 22,3% o desmatamento na Amazônia em um ano, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o fogo, protagonista da gestão anterior, continua. E, com isso, cidades como Manaus estão sob neblina espessa.

Contribui para isso uma estrutura de combate ao fogo também não tem se mostrado suficiente e a oposição dos ruralistas no Congresso Nacional a medidas mais duras que poderiam aumentar o controle sobre a ocupação agropecuária da Amazônia.

Sim, é o puro suco do cinismo: o bolsonarismo usa a fumaça de hoje na capital do Amazonas, tentando vender a ideia estapafúrdia de que isso prova que Bolsonaro nada podia fazer. O que é patético, uma vez que Jair ajudou a plantar o descontrole que vivemos hoje e que não se freia de uma hora para outra.

Mas, para piorar tudo isso, dados consolidados do Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite), do Inpe, mostram que dobrou a responsabilidade de incêndios florestais no total de queimadas na Amazônia.

O secretário de Controle do Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial do Ministério do Meio Ambiente, André Lima, apontou que a seca tornou a floresta mais vulnerável a incêndios de grandes proporções. E lembrou que queimadas degradam florestas tornando-as mais vulneráveis a incêndios nos anos seguintes.

As mudanças no clima, seja a conjuntural ou a estrutural, somadas às queimadas de anos anteriores fazem com que as árvores fiquem mais inflamáveis.

A Amazônia está vivendo uma das piores secas de sua história, com rios intrafegáveis e falta de água potável. O El Niño, o fenômeno de aumento anormal da temperatura do Pacífico, veio forte, provocando falta de chuvas no Norte e inundações no Sul do Brasil. Isso também é efeito de uma nova realidade climática.

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Antes, a floresta contava com defesas naturais diante do fogo, então mesmos os escapes de queimadas não prosperariam com tanta frequência. Contudo, ela está tão seca que o fogo se alastra com mais força.

Quando se fala de adaptação e mitigação diante de eventos extremos, o Brasil discute contenção de encostas para evitar deslizamentos de terra ou criação de reservatórios para garantir água para as cidades. Mas o país não está preparado para massivos incêndios florestais na Amazônia, como ocorre nas florestas temperadas da Califórnia, do Canadá e de Portugal.

As extensas colunas de fogo de origem criminosa que hoje são registradas na Amazônia, e geram fotos que chocam o mundo, são apenas aperitivo do que pode vir a acontecer com a região ficando mais inflamável com a mudança do clima dado o gigantismo da floresta.

Estamos chegando ao momento em que os cenários catastróficos, que apareciam apenas em relatórios de cientistas e bons livros de ficção científica, estão se tornando realidade. E a desgraça climática vai se tornar parte do cotidiano.

Parte da umidade que garante a agropecuária e a vida em locais como São Paulo vem da Amazônia pela atmosfera. Sem as árvores por lá para bombear a água do solo e transpirar para o ar, a vida aqui vai se tornar um deserto insustentável.

Está quente hoje? Como bem analisou o Observatório do Clima, calma que vai piorar.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL