Leonardo Sakamoto

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Opinião

Corajoso no zap, Braga Netto repetirá à PF que xingou general de 'cagão'?

O general Walter Braga Netto não se tornou vice-presidente da República por míseros 1,8% dos votos válidos, a diferença entre a chapa dele, com Jair Bolsonaro, para a de Lula e Alckmin. Nesta quinta (22), terá que depor à Polícia Federal como um dos investigados por participar de uma orcrim que tentou um golpe de Estado. Há dois generais com mais risco de cana, ele e Augusto Heleno.

Considerando que Braga Netto já havia sido ministro da Defesa, ministro-chefe da Casa Civil e o todo-poderoso interventor na área de segurança pública do Rio de Janeiro em 2018, é uma derrocada do nível de um conhecido capitão insubordinado e violento que deixou o Exército pela porta dos fundos.

Dado o seu envolvimento nas movimentações golpistas e o fato de ele contar com recursos e contatos para atrapalhar as investigações, Braga Netto poderia ter tomado uma prisão preventiva, tal como dois coronéis e um major do Exército. As autoridades, contudo, quiseram evitar a fadiga de mandar um general para o xilindró sem uma condenação.

Em uma conversa com um aliado após a derrota no segundo turno de 2022, Braga Netto dá a entender que ele e Bolsonaro poderiam permanecer no poder. O general já havia dito a apoiadores de extrema direita, em 18 de novembro daquele ano, em um cercadinho no Palácio do Alvorada, que "não perdessem a fé". Fé no quê? No golpe.

Sem contar que agrediu outros colegas, como o general Freire Gomes, bombando fake news contra o então comandante do Exército para ele entrar de cabeça na conspiração. Braga Netto o chamou de "cagão" em uma conversa por mensagem com um outro golpista, Ailton Gomes, por não aderir ao golpe. Também disse que o comandante da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior, era um "traidor da pátria".

Corajoso no zap, ele vai repetir o que disse à PF?

Há quem tente colar na imprensa a ideia de que foi Bolsonaro converteu Braga Netto. Jair tem muitos pecados, mas esse não. Os dois se aliaram por compartilharem visões semelhantes de país e de poder, tal como aconteceu com muitos oficiais das Forças Armadas nos últimos anos. Não era cilada, era amor.

Sob a intervenção militar de Braga Netto na segurança pública do Rio, postos de controle para fotografar e registrar moradores de favelas foram montados, um absurdo sem tamanho. O Exército exigiu RG e tirou fotos de moradores para permitir que saíssem de suas comunidades. Ou seja, precisavam passar por "postos de fronteira" e verificar se estava tudo ok com seu histórico. Vila Kennedy, Coreia, Vila Aliança, entre outros locais, foram palco da inovação, que, claro, passou longe do Leblon e de Ipanema.

Em 2021, Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados, recebeu um recado do então ministro da Defesa, general Braga Netto, no dia 8 de julho, de que se não houvesse voto impresso e auditável, não haveria eleição em 2022. Ele estaria acompanhado dos comandantes das Forças Armadas. A mensagem foi a mesma repetida abertamente e à exaustão por Jair Bolsonaro. O golpismo foi revelado por reportagem de Andreza Matais e Vera Rosa, no jornal O Estado de São Paulo.

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A urna eletrônica já é auditável e o general sabia disso. A pressão criminosa sobre o parlamento pela aprovação da impressão do voto teria o objetivo de pavimentar a estratégia do presidente da República para tumultuar as eleições do ano que vem em caso de derrota, o que abriria caminho para um golpe de Estado.

Esse tipo de comportamento é exatamente aquilo que Bolsonaro esperava de Braga Netto ao coloca-lo no lugar do general Fernando Azevedo e Silva à frente do ministério da Defesa. Desejava alguém que saísse em seu auxílio e em oposição a quem o fiscaliza e o investiga, mesmo que isso signifique um atentado à Constituição. Mostraria, portanto, que o presidente acertou ao indicar alguém à sua imagem e semelhança no cargo.

Tanto que o Tribunal Superior Eleitoral condenou Braga Netto junto com Bolsonaro, em 31 de outubro do ano passado, pelo uso eleitoral das comemorações do Bicentenário da Independência, em 7 de Setembro do ano passado. Com isso, o general ficará oito anos inelegível e terá que pagar R$ 212 mil em multa.

Apesar de não ter um cargo público no momento do cometimento do delito, o TSE considerou que Braga Netto não era um cara que estava em casa de pijama tomando uísque e falando groselha. Pelo contrário: como ele tinha ascendência sobre os demais, participou diretamente do processo, envolveu-se no evento e foi uma das estrelas do palanque, tendo sido sim corresponsável.

Braga Netto estava sendo cotado para disputar a Prefeitura do Rio de Janeiro, em 2024, ou o Senado Federal, em 2026. Com isso, os BOs sobre o general, o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), também apontado como possível candidato bolsonarista ao mesmo cargo, poderia se beneficiar. Isso se não tivesse sido abatido antes de alçar voo em meio ao escândalo de espionagem ilegal contra políticos, advogados e jornalistas, executado pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência), que ele chefiava na gestão Bolsonaro.

Na época do julgamento no TSE, representantes das Forças Armadas usaram a imprensa para demonstrar sua insatisfação com a possível condenação de Braga Netto. Consideram que a relação com o tribunal já estava resolvida após o período em que os militares serviram de aríete de Bolsonaro contra a urna eletrônica. Não há registro, contudo, que insatisfação do mesmo tamanho tenha sido expressada contra o próprio Braga Netto pela cúpula militar quando ele e Bolsonaro transformaram o 7 de Setembro, em Brasília e no Rio de Janeiro, em micaretas eleitorais.

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Foi a cumplicidade com uma forma "parasitária" de política, que confunde o público e o privado, em rachadinhas, joias e golpes, que fez com que militares gostosamente estabelecessem parceria para governar o país. Em troca disso, receberam cargos, vantagens em aposentadorias e até abraçaram sobrepreço na compra de Viagra e de próteses penianas para as suas fileiras.

Essa cumplicidade, que empareda a Constituição, está em jogo com as investigações sobre o golpismo bolsonarista. Caso os militares de alta patente saiam ilesos, a mensagem que as instituições passarão é de que, tudo bem, as Forças Armadas podem brincar de golpe porque são imunes. Para a sorte do Estado Democrático de Direito, o corporativismo militar ficou possesso com as evidências de que Braga Neto estava atuando como hater dos próprios colegas nas redes. Desse ponto de vista, não admira se ele for jogado ao mar.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL