Leonardo Sakamoto

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Opinião

Milei abraça Musk e tática bolsonarista para encobrir seu governo ruim

Copiando a tática bolsonarista de produzir cortinas de fumaça usando polêmicas vazias para redes sociais a fim de encobrir a incompetência gerencial, o presidente da Argentina, Javier Milei, ofereceu ao bilionário Elon Musk "colaboração no conflito que a rede social X enfrenta no Brasil".

Milei bajula Musk primeiro porque é fã, segundo porque tenta atrair investimentos do empresário em setores como o automobilístico para uma Argentina cambaleante, terceiro porque tenta se colocar como referência ultraliberal em uma América Latina com maioria à esquerda. Mas, acima de tudo, ele está aqui fazendo barulho para desviar a atenção.

Apesar da promessa, ele não vai se engajar ao lado do bilionário contra o Brasil — Milei, que conversa com seu falecido cachorro Conan, pode ser doido, mas não é burro. Sabe que teria muito a perder comprando briga desnecessária com um de seus principais parceiros comerciais. Vai ficar na falácia, no gogó. No máximo, vai tentar se vender como um (inútil) interlocutor.

Tanto que, enquanto o argentino está nos Estados Unidos, sua ministra das Relações Exteriores, Diana Mondino, visita o Brasil, tentando estreitar laços. Ela deixa claro que a Argentina quer que o Mercosul continue fechando acordos em bloco, e não individualmente como foi sugerido.

As declarações de Milei, reproduzidas pela imprensa e pelas redes sociais, causaram excitação automática entre os seus seguidores mais radicais na Argentina, bem como entre bolsonaristas no Brasil e trumpistas nos Estados Unidos. Memes com um aliança americana entre as três lideranças de extrema direita bombaram nas redes.

Tal qual a golden shower no carnaval e os passeios de jet ski na pandemia, que serviram para Bolsonaro encobrir denúncias, desviar de polêmicas e apagar fracassos gerenciais, Milei também tem usado ações barulhentas para tentar entreter os argentinos e esticar a sua paciência.

Desde que assumiu o governo, a inflação acumula alta de cerca de 90% enquanto a qualidade de vida despencou. Claro que não é possível jogar tudo nas costas dele, uma vez que a crise é antiga. Mas as medidas que tomou em nome de um ajuste fiscal, como o corte de subsídios, ajudaram a piorar a vida da classe trabalhadora.

Sem maioria no Congresso, nem comportamento republicano, Milei vem comprando brigas com parlamentares e governadores ao tentar impor seus projetos ao invés de negociá-los. E perdendo.

Um grande exemplo de suas cortinas de fumaça é a ressurreição da disputa com o Reino Unido pelas ilhas Malvinas (Falklands, para os súditos de Charles 3º) ao participar de uma cerimônia que marcou os 42 anos da guerra com os britânicos pelo controle do inóspito arquipélago.

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"Não há soberania sem prosperidade econômica e não há prosperidade econômica sem liberdade", disse, prometendo "uma reivindicação real e sincera [sobre as Malvinas], não meras palavras em fóruns internacionais sem impacto na realidade". A derrota, há quatro décadas, diga-se de passagem, ajudou a acelerar o fim da ditadura argentina.

Milei afirmou que vai "iniciar uma rota clara para que as Malvinas voltem a ser argentinas". Outros governantes já fizeram isso, mas ele usa essa reivindicação em meio a uma situação economia periclitante.

Uma parte significativa da população continua lhe conferindo apoio, à espera de um milagre. Milei precisa ganhar tempo para sobreviver às eleições legislativas do ano que vem. Até lá, o crush entre ele e Musk pode lhe render outras cortinas de fumaça. O que, para alguns, é mais elegante que brigar com frango com farofa.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL