Leonardo Sakamoto

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Opinião

Boate Kiss avisa Porto Alegre que incêndio com falta de alvará dá em nada 

Tanto o incêndio na pensão no centro de Porto Alegre que matou 10 pessoas, nesta sexta (26), quanto o que deixou 242 mortos na boate Kiss, em Santa Maria (RS), em 2013, ocorreram em locais sem alvarás. Ou seja, sem que o poder público tenha avalizado o seu funcionamento seguro. Para além da punição criminal dos envolvidos, ambos os casos lembram que o poder público vem fazendo pouco para evitar esse tipo de tragédia.

Um integrante da banda Gurizada Fandangueira teve a ideia de jerico de acender um sinalizador dentro da casa noturna da cidade universitária no interior do Rio Grande do Sul há mais de 11 anos, incendiando o revestimento acústico, o que liberou gases tóxicos em um local sem ventilação ou plano de evacuação — criando uma armadilha mortal para centenas de pessoas. O alvará de prevenção contra incêndios, claro, estava vencido.

Os donos da Kiss, Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann, além do músico Marcelo dos Santos e do produtor Luciano Leão, foram condenados no final de 2021, mas depois o júri foi anulado. Aguardam em liberdade um novo julgamento. Parte da defesa, aliás, tentou jogar a responsabilidade nos entes públicos que permitiam o funcionamento da casa — o que equivale a um gatuno dizer que a culpa por ter surrupiado é apenas da falta de policiamento.

Ainda não se sabe as causas do incêndio de grandes proporções em Porto Alegre - que pode ter sido, inclusive, criminoso. A pensão da avenida Farrapos pertence à Pousada Garoa e funcionava de forma irregular, sem alvará e plano de prevenção a incêndios. Mas tinha um convênio com a Prefeitura da capital gaucha. Ou seja, era tipo uma "Negócio de Schrodinger", legal e ilegal ao mesmo tempo.

Os réus na boate precisam ir a julgamento urgentemente, bem como a polícia precisa descobrir quem ou o que causou o incêndio na pensão. E, considerados culpados, precisam ser punidos no rigor da lei. Independentemente disso, precisamos avançar em prevenção por uma questão de sobrevivência nas cidades.

A lei federal 13.425/2017, batizada de Lei Kiss por conta da tragédia, prevê diretrizes para prevenção a incêndios em estabelecimentos comerciais e áreas de reunião de público. Mas cada estado tem leis e condições diferentes para isso e vem adaptando as regras federais à sua realidade local, reduzindo a eficácia das medidas. Sem contar que falta o mais básico: efetivo do Corpo de Bombeiros para fiscalizar os estabelecimentos.

Enquanto isso, seguimos reduzindo biografias às cinzas, sem que os agentes públicos sejam realmente incomodados por isso, devido a um limbo de responsabilidades. E, tendo em vista o longo processo judicial envolvendo a boate Kiss, tampouco os diretamente envolvidos no incêndio precisam se preocupar.

Errata:

o conteúdo foi alterado

  • O incêndio na boate Kiss ocorreu em 2013 e não em 2012, como informado anteriormente.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL