Leonardo Sakamoto

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Reportagem

Imagens de corpos decapitados e sexo com animais circulam sem filtro pelo X

Vídeos de corpos decapitados, pessoas saltando para a morte, tripas saindo para fora e muito, muito sangue. O mundo cão que fez a alegria da audiência de programas do estilo "espreme que sai sangue" na TV brasileira na década de 1980 e 1990 está de volta, agora através de redes sociais, com foco no X.

Usuários da plataforma, principalmente os responsáveis por crianças e adolescentes, vêm reclamando de um aumento na circulação de imagens violentas, escatológicas e de sexo explícito, como se os filtros que eram aplicados regularmente sobre vídeos que desrespeitavam regras no antigo Twitter tivessem lido levantados ou flexibilizados.

Por exemplo, na manhã desta sexta (24), um perfil publicou uma "ocorrência policial" na Linha Vermelha, no Rio de Janeiro. No vídeo, um corpo sangra decapitado no asfalto, enquanto fotos trazem a cabeça separada, com os olhos esbugalhados. Junto, a legenda: "Só colar agora".

Em outro vídeo, um homem escalava um prédio, desequilibrou-se e caiu, batendo com a cabeça no chão e agonizando até parar de se mover enquanto agentes de segurança observavam a cena. Em mais um, um homem faz sexo com um cachorro. Em mais outro, uma barriga é cortada a faca e as tripas desabam sobre o chão. Em mais um ainda, uma pessoa se joga do alto do prédio e a câmera acompanha o corpo até ser destruído pelo impacto com o solo.

Essa situação remete aos primórdios da internet, antes da evolução do debate sobre a necessidade de cuidado por parte das plataformas digitais, quando imagens de acidentes aéreos, como o que vitimou os Mamonas Assassinas, em 1996, circulavam com os corpos destroçados. A diferença é que, naquele momento, o acesso ao conteúdo era mais difícil, sendo trocado em fóruns e não exposto na rede mundial de computador à distância de um link.

Para o coordenador do Monitor do Debate Político no Meio Digital da Universidade de São Paulo, Pablo Ortellado, não chega a surpreender a suspensão ou o relaxamento dos filtros de conteúdo no X/Twitter.

"Elon Musk adotou uma política supostamente 'libertária' em relação à moderação de conteúdos, chegando inclusive, segundo reportagem do New York Times, a exigir pessoalmente que a equipe no Brasil não aplicasse a política da plataforma de moderar conteúdos que atentassem contra a integridade eleitoral. Isso permitiu que, nas eleições de 2022, publicações que alegaram falsamente que as urnas foram fraudadas não fossem moderadas", diz.

"É importante ressaltar, porém, que não se trata efetivamente de uma convicção libertária de Musk. Na Índia, o uso político do Twitter por ele o levou a proibir um documentário da BBC criticando o primeiro-ministro Narendra Modi."

Fotos às quais só a polícia teria acesso

As redes sociais vêm sendo usadas para distribuir fotos que só a polícia teria acesso, o que demandaria, por si, uma investigação detalhada por parte das corregedorias. Um exemplo são as imagens da família morta pelo adolescente de 16 anos, na Vila Jaguara, em São Paulo, no dia 17. Neste caso, fotos dos cadáveres amontoados e do rosto do rapaz (que não pode, por lei, ser identificado), ainda estão visíveis no X/Twitter e no Facebook.

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A coluna não conseguiu uma posição oficial do X, mas funcionários afirmaram reservadamente que não houve mudança na política e que a plataforma remove conteúdos impróprios. E, também sob reserva, empregados da Meta, plataforma proprietária do Facebook, do Instagram e do WhatsApp, afirmaram que a empresa mantém ativados filtros para esse tipo de imagem e as derrubam em caso de denúncia.

Vídeos violentos também são distribuídos pelo TikTok, que tem sido criticado por demorar a removê-los. Um exemplo foi o ataque em uma escola em Sapopemba, zona leste da capital paulista, perpetrado por um estudante de 15 anos que matou uma menina e feriu outras duas, em outubro de 2023. As imagens viralizaram para proveito de "influenciadores".

O secretário nacional de Políticas Digitais, João Brant, afirmou à coluna que a aprovação de um projeto de regulação pelo Congresso Nacional obrigaria as plataformas a terem um comportamento mais diligente quanto a esse tipo de conteúdo violento.

"O papel da regulação é justamente garantir que as regras das plataformas não estejam acima da legislação brasileira. Os mesmos princípios que valem para a proteção de crianças e adolescentes no mundo offline devem valer no ambiente online", afirmou.

Em abril deste ano, o processo de regulação das plataformas sofreu um revés quando o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que iria criar um grupo de trabalho para debater o tema e que projeto de lei 2630/2020, conhecido como "PL das Fake News", já aprovado pelo Senado Federal, não seria mais votado.

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