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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Preconceito contra lideranças femininas cresce pela primeira vez

Colunista do UOL

23/12/2022 16h50

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O preconceito contra lideranças femininas está crescendo. É uma tendência apontada pela primeira vez desde que o índice começou a ser apurado, em 2018. Naquele ano, a empresa de pesquisas Kantar Public desenvolveu uma metodologia em conjunto com a organização Women Political Leaders para medir percepções.

A pergunta principal feita aos entrevistados é se eles se sentem confortáveis com lideranças femininas. A pesquisa é feita separando 20 ramos diferentes de atuação política e empresarial e tem foco no G7, o conjunto de países formado por Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e Estados Unidos.

Foram ouvidas mais de 10 mil pessoas em 14 países. A cada edição são adicionados alguns outros países. Nas duas últimas, o Brasil também foi avaliado.

A informação mais importante para o Brasil é que a nossa geração de 18 a 34 anos é mais resistente às lideranças femininas do que a geração de 35 a 54 anos mas menos resistente que a geração de 55 a 65 anos. A nossa é uma situação única.

Existem países em que a sensação de conforto com lideranças femininas tem decaído a cada geração. São os casos da Espanha, Reino Unido, Canadá, Argentina, Austrália, Estados Unidos, França, Japão, Alemanha e Polônia.

Em outros, a sensação de conforto com lideranças femininas cresce nas gerações mais jovens. É o caso de Islândia, México, África do Sul e Coreia do Sul.

Na Índia e Itália, as gerações mais velhas e mais novas têm mais conforto com lideranças femininas do que a geração de 35 a 54 anos de idade.

Quando passamos a outra conta, a do total da população, pela primeira vez houve um recuo no número dos que se sentem confortáveis com lideranças femininas. Em 2021, 52% dos entrevistados no G7 respondiam sim à pergunta. Este ano, o percentual caiu para menos da metade, 45%.

No caso de ter uma mulher CEO de uma grande empresa do país, também houve um recuo no G7. Ano passado, 54% das pessoas se diziam confortáveis e agora o número caiu para menos da metade, 47%.

É um erro colocar essa conta somente no colo dos homens. Tendemos a imaginar que eles seriam a resistência às lideranças femininas e mulheres lutam contra isso. Infelizmente, não é o que mostram as pesquisas. Mulheres também sabotam mulheres.

No âmbito do G20 - grupo das maiores economias mundiais, do qual o Brasil faz parte - quando se pergunta sobre o conforto com uma chefe de Estado mulher, apenas 43% dos homens dão o sim. Mas, entre as mulheres, o índice é de 52%, algo bastante difícil de digerir.

No G7, das 7 maiores economias do mundo, 47% dos homens ficam bastante confortáveis com uma chefe de Estado mulher. Entre as mulheres, o número é de inacreditáveis 57%. Isso significa que 43% das mulheres dos países mais ricos do mundo não se sentem completamente confortáveis com uma chefe de Estado mulher.

Uma das explicações levantadas para o inédito recuo do conforto com mulheres na liderança é a crise econômica que se seguiu à pandemia. Farinha pouca, meu pirão primeiro.

Mulheres ocupam o espaço público há poucas décadas em séculos de história da humanidade. Isso causa um desequilíbrio que resulta em desconforto para muitos grupos.

Há homens frustrados porque não terão o que esperavam em resultados profissionais, já que a concorrência mudou profundamente. Não é mais possível obter, com os mesmos talentos, os resultados obtidos por seus pais e avós. Isso gera ressentimento.

Como mostra a pesquisa, também existe entre as mulheres um estado de confusão sobre a liderança feminina. Pouco mais da metade se dizem seguras e o número caiu do ano passado para cá.

O retrocesso não pode ser ignorado. Moralmente, a maioria das pessoas tende a dizer que acredita na igualdade entre homens e mulheres. Algo nos movimentos femininos precisa ser ajustado para que essas percepções sejam traduzidas em realidade.