Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Lula marca golaço ao colocar a turma do 'todes' no devido lugar
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No evento em que fez troça com a forma física do ministro da Justiça, Flávio Dino, o presidente Lula (PT) também prestou um serviço importantíssimo à saúde pública no Brasil. Colocou o pessoal do "todes", os Che Guevaras de apartamento, no devido lugar, o de defensores de crendices.
Temos visto nos últimos tempos a proliferação da pauta sobre gordofobia e sua consequente utilização na arena política. Na apoteose da superficialidade, se colocam no mesmo balaio duas coisas absolutamente diferentes.
A primeira coisa é a defesa de que pessoas gordas sejam tratadas com respeito. Isso inclui conscientizar sobre os principais tipos de preconceito, que vão para muito além do cozidão abilolado de superficialidades propagadas por influencers que surfam no tema.
Vemos protestos como "agora vai ter gorda na praia", como se nunca tivesse tido. Temos eventos de celebridades que se autocelebram por "incluir corpos fora do padrão". Fora a impressão de que falamos de uma festa no IML, tratar uma pessoa como um corpo mostra que não estamos diante de algo minimamente sério.
Existem diversas pesquisas mostrando que pessoas gordas têm mais dificuldades profissionais e de relacionamento pessoal. O perverso é que nem tudo está relacionado à estética, mas ao ato de fantasiar sobre ela.
Muita gente fantasia que gordos são descontrolados ou desleixados, como se a obesidade fosse fruto disso. Projetando essa ideia sobre a pessoa, ela tem suas possibilidades podadas. É preciso conscientizar todos sobre esses vieses para que eles sejam enfrentados.
Outra coisa é o negacionismo científico que tem feito sucesso no mercado dos influencers antigordofobia: a luta contra a "patologização da obesidade". Existem até - pasmem - trabalhos acadêmicos sobre isso.
Tratar a obesidade como a patologia que é, segundo essa teoria, seria uma forma de violência contra as pessoas que sofrem da doença. Isso porque aumentaria o preconceito e o sofrimento psicológico, por isso uma abordagem "despatologizante" é buscada por grupos muito ativos nas redes.
E como fazem? Atacando de maneira feroz qualquer um que questione essa abordagem. "Nós falávamos antigamente que quem tinha este comportamento era o adolescente. Um confirma a fala do outro, falam a mesma coisa, como se estivessem falando assuntos novos. Excluem quem pensa diferente, pronto, o importante é ter aceitação do grupo, da bolha. O adolescente pode se sentir acolhido só por não ser contrariado. Hoje, grupos adultos se comportam assim", me disse a historiadora Cíntia Atanazio.
Não há nenhuma evidência de que a mudança de vocabulário médico ao falar de obesidade tenha qualquer interferência na saúde mental de pessoas obesas. Aliás, a evidência que temos, científica, é de que o controle de vocabulário em si piora a saúde mental das pessoas. Então gostamos de ser xingados? Não, só não suportamos viver pisando em ovos e com risco de virar alvo dos nossos próprios amigos se usarmos uma palavra que alguém decidiu tornar maldita.
De onde tiraram a ideia de "despatologizar"? De teorias críticas, principalmente de Michel Foucault. Ocorre que teorias críticas não são levantamentos científicos que servem como explicações de fenômenos. Há uma teoria de que a linguagem molda o comportamento, mas não se sabe em que medida. Dizer que "despatologizar" a linguagem sobre obesidade tem algum efeito é verídico, só não se sabe qual é o efeito.
Médicos e associações médicas têm tido seu trabalho muito dificultado por influencers que dizem estar preocupados com a "patologização da obesidade". Fosse verdade, esses mesmos influencers estariam fazendo um carnaval após a fala do presidente Lula. Não estão. O discurso é mera desculpa para engajar e maltratar as pessoas de quem o grupo tem ranço.
A obesidade no Brasil chega a 6,7 milhões de pessoas e cresceu 29,4% nos últimos quatro anos, segundo o Ministério da Saúde. Ela provoca, entre outros, hipertensão, diabetes, alta do colesterol, coronariopatias, apnéia do sono e diversas formas de câncer.
Marcou um golaço o presidente Lula ao dizer com todas as letras que obesidade é doença. Diferentemente dos lacradores, eu jamais defenderia a interdição do discurso deles sobre "despatologizar" a obesidade. Da mesma forma que jamais aceitaria que sejam calados os tarólogos e astrólogos. Só precisam ser colocados no lugar devido, o das crendices.
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