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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Esquerda coloca o Judiciário nas cordas para manter o bolsonarismo vivo

Eduardo Bolsonaro e Jair Bolsonaro - 14.nov.2018 - Sergio Lima/AFP
Eduardo Bolsonaro e Jair Bolsonaro Imagem: 14.nov.2018 - Sergio Lima/AFP

Colunista do UOL

18/03/2023 07h40

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A reação da esquerda depois das falas imorais e incendiárias de Eduardo Bolsonaro e Nikolas Ferreira demonstra claramente a ação para manter o bolsonarismo vivo. Apenas fingir que age e apelar à indignação seletiva da base justiceira não resolve nada e ainda cria mártires.

Enquanto nossos moralistas de rede social se imaginam numa jihad do bem contra o mal, os políticos sabem que vivem na realidade. Até jogam para essa plateia abilolada, mas têm senso de sobrevivência.

O cidadão brasileiro, em sua maioria, deseja um arrefecimento das tensões políticas e lideranças mais construtivas. Existe o desejo de que o campo político da direita tenha uma liderança muito diferente de Jair Bolsonaro, com sua agressividade e o apetite insaciável por crises. Se não existir caos, ele cria.

Ocorre que o sumiço dele pode ser bom para o país mas não é bom para o petismo, pelo menos por enquanto. A esquerda não venceu, como imaginam os luloafetivos. Bolsonaro perdeu e por muito pouco. No Legislativo, ganharam a direita e o centrão, com direito a brindes da bancada do escárnio, que continua representada.

Os políticos de esquerda sabem disso. A chance deles de vitória é continuar o mesmo jogo de amealhar votos com base no horror que o adversário desperta nos eleitores. É nisso que claramente investem na reação patética e inócua ao escárnio de Nikolas Ferreira e Eduardo Bolsonaro.

Brincando com o imaginário popular, que vê no juiz a solução de todos os males da humanidade, dizem que vão processar e efetivamente processam.

Como a formação política do cidadão brasileiro é um antigo projeto de fracasso total, adultos ficam felizes com isso. Imaginam que foi tomada uma atitude. Ponto para nossas velhas raposas políticas.

No episódio Nikolas Ferreira, que comentei junto com o professor Walter Maierovitch em uma edição do UOL News, já havíamos percebido esse padrão de jogar para a torcida e não resolver o problema. No caso de Eduardo Bolsonaro, isso se repete. A depender de quanta gente conseguir enganar, o método se eterniza.

Por que o Judiciário não seria o foro adequado para resolver algo que está errado? Porque o Judiciário não julga questões morais, julga leis. Aqui estamos diante de um ponto que não é pacífico: a inviolabilidade das opiniões de um parlamentar.

Isso é uma questão do mundo político e que precisa ser resolvida pelo mundo político. Mas é difícil, melhor lavar as mãos e colocar o Judiciário nas cordas. Se as opiniões do parlamentar são invioláveis, conforme decidiu o próprio Legislativo, esses processos são inócuos.

Caso os políticos comecem a entender que falas parlamentares não são mais invioláveis, eles é que têm o dever de decidir isso e definir claramente quais são os limites.

Quando e se o Judiciário se meter nessa questão, será acusado de ativismo judicial, de avocar para si tarefas do Legislativo. É uma bomba sobre o esforço de recuperação de imagem do STF junto à população depois do furacão Bolsonaro. Um Judiciário fraco é bom para quem? Políticos.

"Ah, então a solução é a impunidade?", perguntariam os sabichões de rede social. Não, a solução é o mundo político parar de fingir e começar a agir.

A Câmara dos Deputados precisa decidir se o que foi feito ali por seus membros é ou não quebra de decoro. Pode ser feito um processo célere, aberto de ofício pela presidência, com designação imediata do relator. Soluciona o problema de punir pelo erro, mas cria uma hecatombe política.

Os processos de quebra de decoro, na prática, têm servido mais para deputado fazer marketing e passar conversa em jornalista do que para punir alguém. O processo de Nikolas Ferreira, por exemplo, tem o trâmite mais lento possível.

Você já viu esse filme. Lembra do caso Zambelli e a arma? Os parlamentares fizeram carnaval pela cassação mas não foram à primeira reunião do Conselho de Ética para julgar o caso. Ela não deu quorum.

Quando isso acontece, ninguém percebe nem cobra. Vale a pena fazer o discurso moralista e punitivista mas não agir. Enquanto houver otário, malandro não morre de fome.