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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Lula perdeu a mão da comunicação política?

Lula fala sobre a taxa de juros na Inglaterra - Reprodução
Lula fala sobre a taxa de juros na Inglaterra Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

16/05/2023 19h28

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"Lula é o cara", disse Barack Obama na reunião do G20 em Londres em 3 de abril de 2009. Um dos mais carismáticos presidentes dos Estados Unidos elogiou a capacidade do nosso presidente de se conectar com a população e também o feito de ampliar a classe média.

Nos primeiros meses de seu terceiro mandato, está muito longe de ser "o cara". Anteontem, a colunista Monica Bergamo noticiou que "Lula está ansioso e triste com dificuldades para governar", detalhando um cenário muito diferente de 20 anos atrás. Seja no plano nacional ou internacional, as dificuldades se acumulam.

A primeira dificuldade de Lula é a comparação dele com ele próprio, um virtuose da política que conseguiu hackear a estrutura social brasileira para chegar ao cargo de mandatário. As expectativas para qualquer coisa que ele faça são absolutamente grandiosas.

O sentimento de imediatismo gerado pela era das redes sociais e da hipercomunicação jogam contra. No primeiro mandato, o PT cansou de falar da "herança maldita" de FHC. Agora, Lula realmente está diante de uma herança maldita que demanda paciência para a reconstrução da máquina pública e do prestígio internacional. Só que as pessoas se acostumaram a querer tudo para ontem, soluções imediatas que não são possíveis.

A popularidade também é muito diferente. O primeiro mandato de Lula coroou sua ascendência como líder sindical, traçou uma história única na política brasileira. Agora, as coisas são muito diferentes. A vitória foi apertada e os poderes não são os mesmos. Congresso, Banco Central e Judiciário ganharam muito terreno nesses últimos 20 anos.

Durante a campanha eleitoral, havia um sentimento de que Lula seria o arquiteto da união nacional. No poder, ele optou por continuar com um discurso de campanha, investimento pesado na manutenção da polarização. É útil para energizar a militância virtual, mas afasta aliados necessários no momento em que o governo não é unanimidade nacional.

No plano internacional, a tentativa de se colocar como protagonista nas negociações envolvendo a invasão da Ucrânia pela Rússia não frutificaram. É um movimento arriscado que não trouxe soluções, já que elas não são fáceis nem rápidas, e ainda por cima trouxe problemas e críticas.

No plano nacional, o governo errou na estratégia e perdeu negociações que pareciam fáceis, como a do PL que regula redes sociais e o marco do saneamento. Não é bom sinal para quem se prepara para desafios maiores, como a âncora fiscal e as diversas CPIs e CPMIs que devem vir por aí.

Lula tem insistido num embate pessoal com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pela queda dos juros. Novamente, funciona bem para a gritaria de redes sociais, monopolizada por gente que fugiu da aula de matemática. Na prática, o Comitê de Política Monetária tem nove assentos. Baixar os juros com um Banco Central independente, algo que não existia nos dois primeiros mandatos, exige muito mais do que embate político.

O Congresso, já arredio, se sente novamente acuado com a ação da AGU no STF contra a privatização da Eletrobras. Algo que foi decidido pelo Legislativo não é apenas questionado ou condenado, é colocado em outra instância para ser revertido. No meio disso tudo, o presidente pretende indicar seu próprio advogado em casos criminais para a vaga no STF. É mais uma pedra no caminho.

No primeiro mandato, Lula conseguia dominar a narrativa. A tradição de entrevistas presidenciais do tipo "quebra-queixo" foi substituída por discursos. O que o presidente falava no palanque, onde domina o público com maestria, dominava o noticiário. Agora estamos diante de uma comunicação fluida de redes sociais, que fragmenta e reinterpreta discursos. Os influencers governistas têm agido mais como kriptonita do que como vitamina para o presidente.

Lula perdeu a mão da comunicação política diante de toda essa confusão? Só o tempo dirá.