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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Um Congresso conservador, pero no mucho

21.jun.2023 - Cristiano Zanin foi aprovado para ser o novo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) após uma sabatina na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) do Senado - 21.jun.2023 - Geraldo Magela/Agência Senado
21.jun.2023 - Cristiano Zanin foi aprovado para ser o novo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) após uma sabatina na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) do Senado Imagem: 21.jun.2023 - Geraldo Magela/Agência Senado

Colunista do UOL

22/06/2023 15h54

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"Elegemos o Congresso mais conservador de todos os tempos" é uma frase que vemos correr por aí. O passeio que foi a aprovação de Christiano Zanin para o STF mostra que a afirmação não faz sentido, a menos que tenham decidido mudar o significado da palavra "conservador".

É muito comum a confusão entre conservadorismo político e uma postura conservadora na política ou com o apego a valores sociais tradicionais. São três coisas completamente diferentes.

Infelizmente, devido à chinelagem em que enfiamos o debate político nacional, há quem fale de conservadorismo como se tivesse relação com gostar ou não de minissaia ou de ir à missa, ser ou não um retrógrado. Pior, teria a ver com amar ou não Bolsonaro sobre todas as coisas. Nessa lógica delirante, teríamos eleito um Congresso conservador.

O conservadorismo político brasileiro bebe de diversos teórios, mas principalmente do inglês Edmund Burke e do norte-americano Russel Kirk. Para ambos, o conservadorismo é o progresso com prudência, sem destruir instituições e valores vigentes antes de ter algo melhor para colocar no lugar.

"É impossível estimar a perda que resulta da supressão dos antigos costumes e regras de vida. A partir desse momento não há bússola que nos guie, nem temos meios de saber a qual porto nos dirigimos", defendia Edmund Burke. "Os homens não podem melhorar uma sociedade colocando fogo nela: eles devem buscar suas antigas virtudes e trazê-las de volta à luz.", dizia Russell Kirk.

Por isso não podemos confundir conservadorismo com postura conservadora. Suponha que um governo revolucionário, que chega ao poder implodindo as estruturas sociais, queira continuar no poder e defenda a manutenção do sistema que criou. É uma postura conservadora, mas o avesso do conservadorismo.

Já os costumes retrógrados entram num outro departamento e acabam sendo confundidos com conservadorismo pelo uso da palavra "conservador" como eufemismo para retrógrado, intransigente ou chato mesmo.

A primeira instituição que precisa ser conservada em uma democracia é o sistema de freios e contrapesos dos Três Poderes, fundamental para que sejam independentes, fortes e imunes a mudanças de ventos políticos ou pendores autoritários dos homens. O Senado votou assim no caso Zanin? Fosse um Senado conservador, como dizem, a prioridade seria essa.

A legitimidade do Executivo e Legislativo é dada pelo voto. A do Judiciário é dada pela guarda da Constituição, defesa intransigente do Estado Democrático de Direito, aplicação técnica das regras e impessoalidade.

O presidente da República resolveu indicar seu próprio advogado criminal para o Supremo Tribunal Federal. A turma do "veja bem" correu para fingir que está tudo normal e tentar equiparar com situações completamente diferentes. Recorro ao próprio Lula, que comentou na campanha: "Eu estou convencido que tentar mexer na Suprema Corte para colocar amigo, para colocar companheiro, para colocar partidário, é um atraso, é um retrocesso que a república brasileira já conhece, já conhece muito bem, e eu sou contra."

Indicar Zanin quebra um tabu e abre a porteira para cada político querer seu próprio advogado num tribunal superior. Maldosos diriam que Frederick Wassef já poderia se preparar para um futuro próximo. Por ora, Dilma Rousseff já tenta emplacar seu advogado no STJ e Arthur Lira quer o seu no TST.

Isso afeta a estrutura tradicional do Judiciário e não sabemos se é um progresso para o nosso benefício. Conservadores votariam contra. O Senado aprovou a indicação de Zanin por 58 x 18.

É um Congresso conservador, pero no mucho. Quando é para fazer bravata naquele clima de personagem do Nelson Rodrigues, nossos congressistas batem no peito se dizendo conservadores. Isso acontece principalmente com a bancada hashtag, que vive em embates de baixo nível com a turma barulhenta da esquerda.

Na hora de aplicar princípios conservadores a decisões reais, não é bem isso que vemos. Aparentemente, a moralidade de centrão é o que cala fundo nos corações e mentes dos nossos congressistas.