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Olga Curado

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Covardia de Pacheco põe Congresso de joelhos diante de intimidação militar

Jair Bolsonaro e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado - Mateus Bonomi/Agif - Agência de Fotografia/Estadão Conteúdo
Jair Bolsonaro e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado Imagem: Mateus Bonomi/Agif - Agência de Fotografia/Estadão Conteúdo

Colunista do UOL

08/07/2021 08h50Atualizada em 08/07/2021 08h50

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Pusilânime. Fraqueza moral, covarde, medroso, fraco. No dicionário Houaiss. É a descrição da resposta do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, diante da carta abusiva assinada pelo ministro da Defesa, general da reserva Braga Netto, em que classifica como "vil" a crítica do presidente da CPI da Pandemia, senador Omar Aziz, sobre militares que desonram as Forças Armadas. Pacheco preferiu tecer loas às Forças Armadas, numa vassalagem sabuja e escandalosa, discursando da sua cadeira de presidente do Senado, sem abrir a boca para proferir uma única frase em defesa do senador.

Num desabafo, o senador Aziz, poucas horas antes, se referiu na CPI à desonra para as Forças Armadas pela presença de militares cujos nomes se sucedem, em histórias mal contadas, em negociações para a compra de vacinas contra a Covid-19, pelo Ministério da Saúde.

Sob a liderança de Braga Netto, os comandantes militares se arvoram no papel de tutores do Congresso, ao ameaçar um senador que, com justeza, lamenta que coronéis, tenentes-coronéis e generais se metam em assunto cuja competência não detêm, como é o caso de tomar conta do Ministério da Saúde, para lidar com a maior pandemia da história do Brasil. São esses tantos exemplos da incompetência que levaram à tragédia: a morte de mais de meio milhão de pessoas, e de milhares de sequelados pela vida, vítimas indefesas do coronavírus, quando já havia vacina para mitigar a ameaça do vírus.

Uma especulação pode ser feita quanto à gênese da raivinha da carta dos militares, em ameaça ao presidente da CPI da Pandemia. O capitão reformado, chefe dos remetentes da carta, não parece ter desistido de ter o Exército dele. E, pela resposta inopinada, parece o texto bem ao estilo do capitão reformado, com uso de palavras ameaçadoras, na ausência de argumentos e de informações. Novamente a técnica: se não gosta da mensagem, mate-se o mensageiro. Ou intimide, grite alto, assuste.

A CPI está mostrando que tem muita coisa para ser esclarecida - de cabo a rabo. Aliás, o cabo mineiro contou que tinha gente pedindo um pixulé para aprovação de compra de vacina. O tal "um dólar" por dose. Ninguém provou nada ainda. Mas, na narrativa da história, tem muitas patentes militares como personagens ativos nas conversas mal explicadas nos depoimentos à CPI.

Mas o Pacheco, presidente de um dos poderes da República, prefere se curvar diante da carta brava, sacudida na cara dos brasileiros pelos remetentes, que se arvoram no papel de garantidores da democracia.

O Pacheco renuncia ao papel de ser também fiador da democracia, quando se deixa intimidar. O doutor, formado em leis, esquece que um dos pilares de sustentação da democracia é justamente o poder que ele preside, o Congresso Nacional. Ele se esconde na ignorância dos fatos para lamber botas dos militares. Porém, o fato é um só: um senador foi insultado publicamente por declarações que lhe foram imputadas, dentro de um contexto que não corresponde ao que foi realmente dito.

Coragem não é uma virtude que define apenas os heróis. E heróis não são aqueles que destroem adversários. Heróis são homens e mulheres que compreendem o seu papel, em especial na função institucional, e não se deixam corromper ou amedrontar quando os seus valores são ameaçados. Heróis são aqueles que não se deixam escorraçar por atos daqueles agem sem legitimidade e verdade.

O senador Omar Aziz, na condução da CPI da Pandemia, deu voz de prisão a um ex-funcionário do Ministério da Saúde, Roberto Dias, diretor de Logística, citado fartamente como personagem escuso em indício de trapaça - seria ele o pedinte de uma propina para aprovação de compra de vacina Covaxin - junto com uma penca de militares que, sim, constrangem o Exército brasileiro.

Mas não se consegue entender o porquê da "tropa de choque" do capitão, ativíssima na CPI, correr para defender o tal Roberto Dias, detido por ordem do senador Omar Aziz.

O que se sabe é que o cauteloso ex-funcionário montou um dossiê - o seu "seguro de vida" - contendo documentos, áudios que revelariam práticas condenáveis de militares no Ministério da Saúde durante o governo do capitão reformado. Seria o tal "dossiê" motivo para o furor dos governistas em defesa de Roberto Dias?

A CPI revela um país surreal, em que a inépcia e a incompetência são a marca de personagens de segunda classe. Agora também aparecem sinais de que há corrupção e safadeza. Pacheco está menos preocupado com isso. Fica mais à vontade para se curvar a uma reação desproporcional de chefes militares, que esbravejam contra um senador que investiga malfeitos - de civis e de militares.