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Olga Curado

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bolsonaro também tenta desonrar Lula e vai ter que pedir perdão

Os presidenciáveis Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), adversários no segundo turno das eleições - Ricardo Stuckert e Clauber Cleber Caetano/PR
Os presidenciáveis Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), adversários no segundo turno das eleições Imagem: Ricardo Stuckert e Clauber Cleber Caetano/PR

Colunista do UOL

19/10/2022 10h26Atualizada em 19/10/2022 16h47

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Bolsonaro irá pedir perdão a Lula. Pedido necessário como aquele, ao qual foi obrigado, às meninas venezuelanas, que tentou desonrar.

O séquito de raivosos que o segue irá pedir perdão a Lula.

Moro irá pedir perdão a Lula.

Será um perdão histórico.

Todos aqueles e aquelas que se deixaram levar pelo turbilhão de notícias em que Lula é o vilão e Moro é o herói pedirão desculpas a Lula.

É a inevitabilidade da História. Uma dívida só se extingue quando é quitada. E a quitação para com Lula será um histórico pedido de perdão. Ao elaborar uma narrativa pública baseada na desconstrução moral de um indivíduo, estabelece-se uma dívida de honra.

A 11 dias das eleições que definirão quem será o próximo presidente da República, o país se divide conduzido por discursos que se antagonizam e potencializam emoções de medo e de raiva.

O eixo do discurso do candidato à reeleição está centrado na desconstrução da honra de um indivíduo. Lula tenta reavivar a memória da nação para a sua própria história; a luta para fazer prevalecer a memória da coerência de uma trajetória, comparando-a à trajetória do outro, igualmente coerente.

De um lado, a agressiva e metódica destilação do ódio; de outro lado, a desesperada tentativa de conter o ódio. É impossível deter o arrastão que tem como lastro uma longa, intensa e sistemática exposição negativa de Lula. Não bastam os vereditos da Justiça, que atestam ele nada dever. Alinhavam-se, apesar disso, sorrateiras as falas de que havia corrupção na Petrobras, como se isso não fosse uma responsabilidade direta dos corruptos. A articulação das falas, sobrepostas ao power point do procurador-político, que justificam a Lava Jato, é a maneira envergonhada de dizer fazer a mea culpa daqueles todos enredados pelo marketing do heroísmo.

Argumenta-se que é culpada aquela pessoa que ocupa um lugar de autoridade sobre o criminoso, porque "deveria" saber da corrupção e impedi-la, no caso a Petrobras, no caso, Lula. Essa mesma lógica não é invocada quando inocenta o presidente da República que viaja numa comitiva em que um dos aviões oficiais transporta vinte quilos de cocaína. Quem acusa o presidente, quem acusa o brigadeiro de tráfico?

Ninguém, e não faria sentido. E olha que ele não sabia o que estava acontecendo na sua própria comitiva! Falharam sistemas de controle interno.

Dia 30 de outubro será a eleição que irá definir a sobrevivência, para a próxima geração, da democracia brasileira. Mas não é sobre esse valor que se dá a disputa. É na tentativa insistente de demonstrar a desonestidade de um homem. Porque, assim como o nazismo ensinou, e a lição foi muito bem aprendida, é preciso ter um foco, um símbolo para a explicação do mal, para criar um mito. Foram os judeus mortos e desumanizados pelo regime que canalizaram o discurso do ódio. Um genocídio que envergonha humanidade e exige de todos, por omissão, ingenuidade ou preguiça moral, pedidos de perdão.

Não se trata o debate hoje da fome, do desmatamento da Amazônia, do desmanche das instituições, e do orçamento secreto a serviço da hybris de Lira e de seus vassalos. Não se trata da fome de mais de 30 milhões de pessoas, não se trata de inflação recorde, não se trata do poder da milícia, não se trata de perguntas sem respostas para a compra de 51 imóveis em dinheiro, e da compra de mansões sem correspondência de receita. Não se trata de propostas para fortalecer o equilíbrio entre os Poderes, para aumentar o acesso à educação pública de qualidade, acesso à saúde, à produção de riqueza e de oportunidades, de inclusão do jovem no mercado de trabalho, de construir. Trata-se de uma criação propagandística que explora o que o ser humano tem de pior - mas que coexiste na sua subjetividade com valores humanitários.

A campanha do ódio alimenta nossos demônios internos, subjugados pela civilidade, pela sabedoria, pela ciência e pela disciplina nas relações humanas. Faz vir à tona, sob a forma de argumentos desconexos, mas entusiasmados, o preconceito, o nojo pelos diferentes, a repulsa pelos pobres, o sentimento de superioridade que alimentou o nazismo. É preciso, nessa lógica destrutiva, extirpar, eliminar o outro. Assim se constrói a ideologia baseada na força. Assim se justifica a violência, assim se nega a verdade. Assim se elege um símbolo, para que a sua tese fique visível.

Bolsonaro irá pedir perdão a Lula.

Antes dele, todos nós, na urna. Dia 30.